Tolerar as queimadas nos canaviais capixabas até o ano 2020 é um absurdo. O prazo para as empresas sucroalcooleiras adotar tecnologias que dispensem o fogo no corte da cana não podia passar de dois anos. O governo do Estado privilegiou os interesses das empresas, sem considerar os danos ambientais das queimadas, entre outros, o aquecimento global.
As considerações são do ambientalista Freddy Montenegro Guimarães, presidente da Associação Capixaba de Proteção ao Meio Ambiente (Acapema). O governo do Estado anunciou nesta segunda-feira (1) que encaminhará projeto de lei à Assembléia Legislativa para restringir as queimadas nos canaviais.
Da assinatura do projeto de lei participaram o governador em exercício, Ricardo Ferraço, e os secretários de Meio Ambiente, Maria da Glória Brito Abaurre e de Agricultura, César Colnago.
Eles destacaram a preocupação com os efeitos do aquecimento global e outras mudanças climáticas, como motivadora do projeto. O projeto define a eliminação gradativa da prática das queimadas na colheita da cana-de-açúcar e o prazo vai até 2020.
“É um prazo longo demais. Os problemas gerados pelas queimadas dos canaviais são conhecidos há muito tempo, e as tecnologias para corrigi-los também. É um absurdo dar tanto tempo para que os poluidores adotem correções no processo produtivo”, diz Freddy Guimarães.
O ambientalista considera uma barbaridade as queimadas dos canaviais em pleno Século XXI. Freddy Guimarães afirma que “a lógica seguida é a do lucro máximo, sem se importar com as conseqüências sociais e ambientais do processo produtivo. Dois anos seriam suficientes para que as empresas se adaptassem à determinação de não queimar os canaviais”.
O presidente da Acapema ainda alerta que mesmo que haja determinação legal proibindo o uso de fogo nos canaviais, ainda há risco de descumprimento da lei. Lembra que o governo Paulo Hartung não faz cumprir a lei da Reserva Legal. Esta lei exige que em cada propriedade seja mantida ou recuperada 20% da área com vegetação nativa. A medida, entre outros, minimizaria os impactos da seca.
Nas suas linhas gerais, o projeto do governo para proibir queimadas prevê que “proprietários rurais, arrendatários e as indústrias, que possuam, direta ou indiretamente, áreas destinadas ao plantio de cana-de-açúcar, para produção de etanol e açúcar industrial, e que utilizem, como método de pré-colheita, o uso do fogo direto na queima da palha, estão obrigados a tomar as providências necessárias para reduzir e eliminar a prática da queima”.
Mas há ressalvas, como diz o governo. São liberados da proibição os pequenos produtores, que utilizam a cana-de-açúcar para produzir cachaça e açúcar mascavo, por exemplo. De aproximadamente 90 mil hectares de área plantada de cana-de-açúcar, só cerca de 70 mil hectares deverão se adequar às novas regras.
Até a secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Maria da Glória Brito Abaurre, reconhece que os efeitos das queimadas são extremamente prejudiciais ao meio ambiente. Diz: “O uso do fogo como método espalhador e facilitador do corte da cana-de-açúcar, além de emitir poluentes nocivos à saúde humana, aumenta consideravelmente o balanço de emissões de gás carbônico do processo, ou seja, contribui para o aumento do aquecimento global que se quer evitar”.
Embora todas as espécies da flora e fauna sejam afetadas pelas queimadas da cana-de-açúcar, nos humanos as principais vítimas da poluição são as crianças e os idosos. As partículas em suspensão, especialmente as finas e ultrafinas, e os gases provocam reações alérgicas e inflamatórias ao penetrar no sistema respiratório.
Também é comum a absorção dos poluentes pela corrente sangüínea, causando doenças em diversos órgãos.
A queima das áreas cultivadas é prática antiga, que destrói o solo. Com o fogo são perdidos nutrientes e, em conseqüência, são usadas grandes quantidades de adubos, inclusive nitrogênio sintético. Tal procedimento é completamente descartado na agroecologia, quando a produção é feita sem destruição da natureza.
(Por Ubervalter Coimbra,
Século Diário, 02/09/2008)