O governo do Estado anunciou nesta segunda-feira (1) o envio de projeto de lei à Assembléia Legislativa para controle do fogo em canaviais. Adota a medida com décadas de atraso: as indústrias sucroalcooleiras do Espírito Santo são favorecidas com a permissão para o uso de fogo para preparar o corte da cana. O fogo nos canaviais causa o aquecimento global.
O anúncio do projeto de lei foi feito pelo governador em exercício, Ricardo Ferraço. Participaram os secretários de Meio Ambiente, Maria da Glória Brito Abaurre, e de Agricultura, César Colnago.
O próprio governo reconhece que a prática do uso de fogo na colheita de cana-de-açúcar emite poluentes nocivos à saúde humana. E que as queimadas contribuem para o aumento do aquecimento global.
As usinas de açúcar e álcool no Espírito Santo continuam liberadas para produzir poluição com a queima dos canaviais, com autorização dada pelo governo do Estado, através do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf).
Pela legislação, para os outros produtores, o uso do fogo na chamada "queima controlada" está proibido até 31 de outubro. A proibição para "queima controlada" começou no último dia 1 de maio.
Na ocasião, o Idaf informou que "a única exceção é para procedimentos especiais de emissão de autorização para o emprego do fogo como método despalhador e facilitador do corte de cana-de-açúcar e em áreas com infestações de pragas e doenças em culturas agrícolas".
Com a política do governo do Estado de permitir a queima dos canaviais, serão consumidos cerca de 60 mil hectares, área estimada no Estado com plantios de cana. As áreas são das usinas Lasa (em Linhares), Disa e Alcon (Conceição da Barra), Paineiras (Itapemirim), Albesa (Boa Esperança) e Cridasa (Pedro Canário).
Caso seja mantida a política de autorizar o uso do fogo na queima dos canaviais nos próximos anos, com a expansão dos plantios de cana serão destruídos cerca de 180 mil hectares de terras no Espírito Santo. Esta é a área prevista para o total de plantios, com a chegada ao Estado do grupo inglês Infinity Bio-Energy.
Com as queimadas, toda a biomassa produzida por longo tempo é enviada à atmosfera sob a forma de partículas e gases poluentes. As partículas suspensas, especialmente as finas e ultrafinas, provocam reações alérgicas e inflamatórias ao penetrar no sistema respiratório.
Também é comum a absorção dos poluentes pela corrente sangüínea, causando complicações em diversos órgãos do organismo. As principais vítimas de doenças respiratórias são as crianças e os idosos.
A queima das áreas cultivadas é prática antiga, que destrói o solo. Com o fogo são perdidos nutrientes e, em conseqüência, são usadas grandes quantidades de adubação. Tal procedimento é completamente descartado na agroecologia, quando a produção é feita sem destruição da natureza.
Mesmo conhecendo os danos ambientais e à saúde dos moradores das proximidades das usinas, o Idaf mantinha a permissão para a queima dos canaviais.
Para os outros produtores, a suspensão da autorização para "queimadas controladas" é justificada pelo objetivo de "diminuir a possibilidade de incêndios florestais no Estado devido aos baixos índices de chuva, o que facilita o alastramento do fogo".
O Idaf autoriza uso do fogo em outros períodos do ano. Quando a "queima controlada" está autorizada, o Idaf "orienta sobre algumas medidas de precaução que devem ser tomadas com relação ao uso do fogo durante a realização de uma queima controlada", como diz informe do órgão.
E cita: "Avisar aos vizinhos com três dias de antecedência sobre o local, dia e hora previstos para o início da queima controlada; construir um aceiro ao redor da área que será queimada com, no mínimo, 2 metros de largura; escolher dias e horários mais frios, úmidos e de pouco vento; realizar a queima nas primeiras horas do dia; suspender a execução da prática se ocorrer ventos fortes ou elevação da temperatura".
Mas ocorre com freqüência que as queimadas fujam do previsto de destruição ambiental. E afetem regiões inteiras, além dos limites do município. Em Ecoporanga, no noroeste do Estado, em 2003, o Grupo Simão, dono da fazenda São Mateus, recebeu autorização do Idaf para queimar 10 mil hectares de pasto. Mas o fogo se espalhou e foram queimados 76,5 mil hectares de pastagens, causando prejuízo de R$ 71 milhões aos fazendeiros do município.
(Por Ubervalter Coimbra,
Século Diário, 02/09/2008)