A euforia que tomou conta do governo brasileiro e das corporações do petróleo com a descoberta dos campos da pré-sal em nossos mares parece incontida. O presidente já fala em gastar o dinheiro em atividades sociais, o ministro da cultura já reivindica parte do dinheiro para atividades culturais, já se fala no Brasil como potência exportadora, enfim, uma mágica das profundezas da terra para o povo brasileiro.
Incrível como é o pensamento linear, sua inflexibilidade mental. A ironia brasileira é que, justamente quando a humanidade tem que encarar o aquecimento global - que tudo indica põe em risco milhões e milhões de vidas -, quando colhemos todos os frutos amargos da "civilização do petróleo", o Brasil acaba de ser premiado com mais petróleo. Mais uma vez os discursos ufanistas, fáceis, até mesmo irresponsáveis tomam contam do cenário brasileiro, sem nenhum exercício crítico. A única discussão em pauta é o modelo de exploração dos novos campos.
A Petrobrás é fruto da luta do povo brasileiro, a exploração do petróleo em nosso território foi uma longa luta política e tecnológica. Não tínhamos a visão dos impactos que a exploração intensa dessa fonte energética causaria sobre o planeta. Hoje, a opinião de alguns cientistas é radical: "temos que substituir todas as fontes de energia fóssil num prazo de vinte anos para evitarmos o colapso de todo sistema Gaia" (Lovelock).
Para fundamentar sua tese, propõe inclusive a energia nuclear como a única capaz de facilitar a transição da civilização do petróleo para uma nova era de energias limpas, por hora insuficientes para bancar a demanda da civilização contemporânea. A energia nuclear seria um mal menor, diante da hecatombe planetária que seria morte das algas marinhas quando a concentração de CO2 atingir 500 ppm (parte por milhão) na atmosfera. Se isso acontecer, a vida só seria possível onde hoje estão os pólos terrestres.
Como quebrar a euforia brasileira, ao menos ajudar nossas autoridades a porem os pés no chão? É possível que corporações e autoridades tenham uma visão mais holística da realidade? Parece impossível. O capital não tem autocrítica e as autoridades postas a seu serviço menos ainda.
(Por Roberto Malvezzi (Gogó), Adital, 01/09/2008)