O antropólogo Luís Roberto Cardoso de Oliveira, ex-presidente da ABA (Associação Brasileira de Antropologia), disse que uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que reverta a demarcação contínua da reserva Raposa/Serra do Sol (RR) deverá ser interpretada pela comunidade indígena como uma demonstração de que o direito deles vale menos do que o dos demais brasileiros.
"No contexto atual, não teria como [a reversão da demarcação pelo STF] deixar de passar a idéia de que os direitos deles [índios] valem menos do que os dos outros", afirmou.
"É muito difícil dissociar a decisão do processo recente [de disputa entre índios e arrozeiros], que está marcado por atos de desrespeito sistemático a decisões do Estado brasileiro por parte daqueles que são críticos à reserva", disse Oliveira, doutor pela Universidade Harvard e professor da UnB (Universidade de Brasília).
Sobre os argumentos de que a demarcação pode colocar em risco a soberania do país, Oliveira disse que a terra estará mais protegida nas mãos dos índios "do que se estivesse na mão de particulares". Para ele, a demarcação descontinuada, ou seja, com a permanência das populações não-índias em "ilhas" dentro da reserva, resultará em prejuízo para os índios.
De acordo com Oliveira, os índios teriam dificuldade para caçar e pescar, por exemplo, já que o deslocamento deles dentro da área da reserva ficaria limitado. Além disso, o contato com outras populações pode representar risco para a manutenção da cultura das populações indígenas.
"A demarcação em ilhas dificultará muito a reprodução social do grupo [de índios]. Acho que ela tem grandes chances de vir a significar uma integração forçada e arbitrária entre brancos e índios. O resultado seria a assimilação, que não é desejada por eles nem é o que recomenda a nossa Constituição, que reconhece o direito deles de serem brasileiros sem deixar de ser índios", disse Oliveira.
(Por Fábio Amato, Agência Folha,
Folha Online, 30/08/2008)