Na reserva, onde clima era de provocação, policiais e soldados impedem choque entre contrários e favoráveis à presença dos arrozeiros
Favoráveis à demarcação contínua reconhecem voto do relator no Supremo, mas ficam apreensivos com fato de a votação ter sido adiada
O pedido de vista do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Carlos Alberto Menezes Direito levou índios favoráveis à demarcação em ilhas e trabalhadores ligados aos rizicultores a comemorar, com estouro de fogos e gritos de "viva o Brasil", deixando ainda mais tensa a situação na reserva Raposa/ Serra do Sol (RR).
Índios que lutam pela saída dos arrozeiros, apesar de reconhecerem que o voto do relator Carlos Ayres Britto foi favorável a eles, mostraram apreensão com o fato de o STF não ter decidido ontem a questão.
Com gritos e música alta, o pequeno grupo de indígenas ligados à Sodiur (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima), que quer a presença dos brancos na região, correu com a bandeira do Brasil até a ponte sobre o rio Surumu, na entrada da reserva. Policiais federais e soldados da Força Nacional de Segurança que monitoravam o local se posicionaram entre os grupos, para evitar confronto, já que era explícito o clima de provocação.
"Temos que ficar com a cabeça em pé, pois o voto [do relator] foi pela demarcação contínua", disse o macuxi Alesson Sousa, 25, ligado ao CIR (Conselho Indígena de Roraima). "Agora, não podemos é entrar no clima de provocação e partir para a violência", afirmou.
"Por causa da provocação deles, pode acontecer alguma briga. Aí a coisa foge do nosso controle", argumentava o também macuxi Valter Oliveira, um dos coordenadores regionais do CIR, com um policial federal que pedia calma ao grupo.
A índia Erotéia Mota, contrária a saída dos arrozeiros da terra, já vestiu um cinturão de bombas para brigar contra a demarcação contínua. Candidata a vice-prefeito de Paulo César Quartiero (DEM), que tenta a reeleição neste ano em Pacaraima, ela explicou o motivo da festa. "O ministro [Ayres Britto] colocou a questão da Raposa em seu relatório de forma mentirosa e falsa, por isso o pedido de vistas. O [ministro] Menezes não ficou confiante. Ganhamos tempo para continuar a luta pela permanência dos não-índios", disse.
Os índios contrários à demarcação contínua assistiram ao julgamento do STF em um telão, armado em frente à subprefeitura do município na Vila Surumu. O equipamento foi montado por Edir Ribeiro, empresário da cidade que, segundo disse, esperava também fazer propaganda para vender algumas antenas parabólicas.
Os índios ligados ao CIR, sem TV a cabo, recebiam notícias da sessão por telefone ou rádio, ou às vezes espiando o telão que estava montado logo em frente à quadra esportiva onde, durante todo o dia, eles realizaram atividades culturais com dança e música.
(Por Lucas Ferraz, Folha de São Paulo, 28/08/2008)