Os vírus têm um papel inesperado no ciclo de carbono, de acordo com uma nova pesquisa realizada por um grupo internacional. A descoberta poderá levar a uma reavaliação dos modelos globais dos ciclos de carbono, nitrogênio e fósforo e dos fluxos de nutrientes nas cadeias alimentares.
O estudo, publicado na edição desta quinta-feira (28/08) da revista Nature, foi coordenado por Roberto Danovaro, da Universidade Politécnica de Marche, em Ancona, na Itália, com participação de cientistas de centros de pesquisa dos Estados Unidos e da França.
Sedimentos do fundo do mar contêm grandes reservatórios de carbono na forma de biomassa microbiana, mas a dinâmica desse ecossistema é pouco conhecida. A equipe de Danovaro relatou que a infecção viral e a morte desses micróbios liberam, anualmente, de 370 milhões a 630 milhões de toneladas de carbono na cadeia alimentar.
Nas escuras profundezas do mar, onde os alimentos são escassos, esse processo significa uma contribuição considerável para o fluxo de energia e nutrientes. A pesquisa poderá ter implicações importantes para o entendimento da produção de biomassa e dos ciclos biogeoquímicos em escala global.
Os autores destacam que os vírus são os organismos biológicos mais abundantes dos oceanos. As infecções virais são fontes substanciais de mortalidade para uma ampla gama de organismos, incluindo o plâncton, mas seu impacto no oceano profundo e na biosfera bentônica é completamente desconhecido.
O estudo indica que a produção viral nos ecossistemas do fundo do mar é extremamente alta e que as infecções virais são responsáveis pelo abatimento de 80% dos organismos procariontes (como bactérias) heterotróficos, isto é, que não têm capacidade de produzir seu próprio alimento.
A mortalidade de procariontes induzida por vírus cresce à medida que aumenta a profundidade marítima. Abaixo de mil metros de profundidade, praticamente toda a produção procariótica heterotrófica é transformada em detrito orgânico.
A mortalidade de microrganismos por infecção viral provoca um efeito cascata no ciclo de carbono e na regeneração de nutrientes. Quando a biomassa e o conteúdo das células dos micróbios infectados são transformados em detrito orgânico, ele pode ser utilizado novamente por procariontes não-infectados.
Esse processo apóia a produção de procariontes heterotróficos, mas também diminui a eficiência da transferência de carbono para níveis tróficos mais altos, influenciando o balanço de carbono dos oceanos, modificando assim a quantidade de carbono transferido pelas partículas que vêm da superfície e afundam em direção ao solo oceânico.
Para realizar o estudo, os pesquisadores coletaram 232 amostras de sedimentos do fundo do mar e mediram o impacto dos vírus nos ciclos biogeoquímicos e nos procariontes bentônicos. Os dados cobrem profundidades que vão de 165 metros a 5.571 metros, incluindo locais com diferentes temperaturas de água do fundo e condições tróficas distintas.
A abundância de vírus e procariontes nos sedimentos foi determinada por microscopia de epifluorescência. Para a determinação da produção viral foram usados dois procedimentos: um deles baseado em técnica de diluição de amostras com água marinha sem vírus e, o outro, baseado no uso de substratos marcados com radiação.
O artigo Major viral impact on the functioning of benthic deep-sea ecosystems, de Roberto Danovaro e outros pode ser lidos por assinantes da Nature em www.nature.com.
(Inovação Tecnológica, 27/08/2008)