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oceanos
2008-08-28

É necessário realizar mudanças profundas na gestão dos oceanos para garantir que as atividades humanas sejam sustentáveis tanto para as gerações atuais quanto para as futuras, sem causar danos ao meio ambiente. Esta é a mensagem central dos 24 ativistas a bordo de um dos três navios da organização Greenpeace que esteve atracado na semana passada no porto de Lisboa, no contexto de uma ação que começou em 2005 na Grã-Bretanha e incluiu Alemanha, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, Holanda, Noruega, Nova Zelândia, Polônia e Suécia. Portugal foi o último capítulo da campanha, nesta etapa final destinada a “defender o Mediterrâneo” em uma viagem de três meses iniciada na Itália e que contemplou Espanha, França, Grécia, Líbano, Líbia e Turquia.

A ação se desenvolve a partir do “Artic Sunrice”, um navio batizado em 1975 como “Polar Bjorn”, um quebra-gelo norueguês construído especialmente para a caça de focas e combatido na época pelo Greenpeace que, “por ironia do destino”, segundo os ativistas, acabou por comprá-lo em 1995. Esta ONG ecologista, que explica sua existência porque “este frágil planeta merece uma voz, precisa de soluções, requer mudanças e ações”, dessa forma encerrou em Lisboa um longo trabalho. As coordenadas de navegação do Artic Sunrice se centraram na detecção de barcos de pesca ilegais, na elaboração de um detalhado estudo científico das profundezas marinhas e a proposta conclusiva de criar vastas áreas protegidas.

Os ativistas afirmaram à imprensa, a bordo do navio, que os governos “devem reservar 40% de nossos oceanos”, ao mesmo tempo em que lançaram um apelo aos consumidores com a campanha “Escolha seu pescado, não morda o anzol”. Estas reservas marinhas “podem ser definidas como regiões do oceano onde deve ser proibida a captura de qualquer recurso vivo e a exploração de recursos não vivos, como areia, cascalho e minerais”, afirmou Evandro de Oliveira, responsável de informação do Greenpeace-Portugal.

O mar Mediterrâneo “está ameaçado pelo excesso de pesca, por pesca destrutiva, pela poluição e pelo crescente desenvolvimento das zonas costeiras”, acrescentou o ativista, para, em seguida, propor soluções para a preservação dos recursos marinhos. Considerando o alto consumo de pescado pelos europeus comprado nos grandes espaços comerciais, o Greenpeace centrou sua campanha em denunciar a falta de uma política de compra sustentável de produtos pesqueiros nos supermercados, explicou Oliveira. “Pedimos aos supermercados que adotem uma política que leve a deixar de vender as espécies da lista vermelha do Greenpeace e que comecem a oferecer produtos pesqueiros de forma sustentável”, acrescentou.

Essa lista é formada por espécies em vias de extinção, tais como merluza negra, lagostim, salmão atlântico, merlins, atuns, bacalhau do atlântico, tubarões, peixe-espada negro e do Atlântico, peixe-carta, linguado, peixe-espada e arraias. Os supermercados em vários países são cúmplices da destruição dos oceanos por não se comprometerem com a sustentabilidade dos produtos pesqueiros, afirma a engenheira agrícola espanhola Paloma Colmenarejo, responsável pela campanha referente aos oceanos. Colmanarejo afirma que “os grandes distribuidores e a indústria pesqueira podem e devem seguir políticas de compra sustentáveis e deixar de fornecer espécies desta lista vermelha”.

As espécies sustentáveis são as provenientes de uma indústria pesqueira cujas práticas podem ser mantidas indefinidamente sem reduzir a capacidade das espécies de se reproduzir. Aos comerciantes “pedimos que adotem uma política para retirarem o pior (da lista vermelha), que apóiem o melhor oferecendo produtos sustentáveis e, ainda, que melhorem a informação sobre as espécies que vendem”, acrescentou Colmanarejo. “Os consumidores têm o direito da garantia pelos supermercados de que todos os produtos  sejam sustentáveis, já que eles não têm acesso a toda a informação necessária”, acrescentou a ativista, que criticou o “apetite insaciável” dos grandes espaços comerciais.

A campanha ganha um destaque especial em Portugal, terceiro consumidor mundial de pescado por habitante com 59,3 quilos cada um, em média, atrás da Islândia com 91 quilos e do Japão com 67,4, cifras que superam em muito a média mundial de 16 quilos. Femke Nagel, responsável pela campanha na Holanda, garante o sucesso da ação. “Quando começamos em meu país tínhamos três supermercados designados como ‘laranja’, uma categoria entre ótimo, que é o verde, e pior, que é o vermelho, e hoje já temos nove”. A ativista, que faz parte da tripulação do Artic Sunrice, disse que os consumidores devem ter um papel importante para evitar consumir pescado da lista vermelha, “mas os supermercados têm uma grande responsabilidade”.

Apesar de muitas vezes “dizerem que é impossível saber de onde vem o produto, isso não é verdade, eles tem toda a informação, que simplesmente decidem não repassá-la aos consumidores”, concluiu Nagel. “A listagem é uma ferramenta fácil e eficiente tanto para consumidores quanto para a indústria e todos os setores interessados em garantir o futuro da pesca”, explicou Colmenarejo em conversa com a IPS. A situação é gravíssima, “porque em uma revisão planetária comprovamos que três quartos dos oceanos estão esgotados”, acrescentou.

Mas, pode-se acabar com as tradições de um povo, no caso o português, com o consumo de bacalhau, que faz parte da própria identidade nacional?, perguntou à IPS. “Não se trata disso, mas de entender que o bacalhau do Atlântico simplesmente poderá desaparecer e que os portugueses e outros povos amantes deste pescado podem comprar o bacalhau do Chile, porque essas espécies do sul do oceano Pacífico não estão em perigo”. O que o Greenpeace recomenda “é comer espécies que se recuperam facilmente e não integrem a lista vermelha”.

A tendência generalizada da medicina atual é recomendar um alto consumo de pescado, sem discriminar quais. A ativista considera “bom que os médicos se preocupem com a saúde das pessoas, mas nós nos preocupamos com a saúde dos oceanos”. Colmenarejo também chamou a atenção para os direitos humanos, “que são sempre uma preocupação do Greenpeace”, em especial quando na América Latina estes “são sistematicamente violados nas zonas de megaprojetos camaroeiros, turísticos e industriais na região do ecossistema de mangues e outros ecossistemas marinho-costeiros”. A denúncia inclui as zonas de mangue de Brasil, Colômbia, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Peru e Venezuela.

A ativista espanhola concluiu recomendando uma leitura atenta da pagina na internet da Rede Mangue Internacional (http://www.redmanglar.org), onde são denunciados “assassinatos, torturas, desaparecimentos, restrições ao acesso aos recursos, deslocamentos, despojo e ameaças” contra as comunidades locais.

(Por Mario de Queiroz, Envolverde, IPS, 26/08/2008)


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