PARA O BEM ou para o mal, queiramos ou não, temos de enfrentar um problema verdadeiramente "histórico": como explorar o petróleo do pré-sal? Ele só é nosso pela premonição e ousadia de termos estabelecido, no governo Médici, o limite de 200 milhas para o mar territorial brasileiro. E ele só será "recurso" quando estiver disponível para ser utilizado fisicamente ou transformado em outro ativo.
Antes que isso aconteça, será preciso um investimento gigantesco (coisa parecida com 1/3 do nosso PIB anual), que não pode, obviamente, ser realizado nem pelo governo nem apenas pela Petrobras, que não têm recursos ou crédito para tanto. Teremos, necessariamente, de cooptar o capital privado nacional e estrangeiro com experiência no setor, como até agora.
Antes de decidir como isso será feito, é preciso resolver uma preliminar: como vamos alocar eficientemente essa riqueza não-renovável em benefício do bem-estar da presente geração de brasileiros (e não em consumo do governo) e como vamos distribuí-la, no tempo, em benefício da eqüidade intergeracional?
A restrição adicional é que somos uma sociedade comercialmente aberta, e a solução não deve trabalhar contra uma taxa de câmbio competitiva, que é fundamental para o crescimento da economia real e do emprego no longo prazo, inclusive na indústria do petróleo. A exploração de recursos não-renováveis não se esgota nos problemas técnicos e financeiros.
Implica, também, como conservá-los (se não física, na forma de outros ativos) para a fruição das gerações futuras. Este é o problema estritamente político que envolve uma intervenção estatal maior do que a atual.
Sem aferrar-se a idéias pré-concebidas, sem render-se a resquícios ideológicos, sem esconder-se na imitação de modelos mal compreendidos e sem inventar novos instrumentos, já dispomos das condições e instituições (Agência Nacional do Petróleo, Fundo Soberano e Petrobras) que, coordenadas e ajustadas com inteligência, resolverão o triplo problema de 1) maximizar os benefícios oferecidos pelo pré-sal, 2) reparti-los com as gerações futuras e 3) não comprometer um robusto crescimento econômico e do emprego no longo prazo.
Tem razão o presidente Lula ao dizer que o petróleo do pré-sal é dos brasileiros. Sobre seu governo, pesa a imensa responsabilidade da solução do complexo problema.
Porque chegamos tarde não é preciso pressa: podemos nos beneficiar das experiências bem-sucedidas e evitar as desastrosas, submetendo-as a um sério e intenso debate, como sugeriu o presidente.
(Por Antonio Delfim Netto,
Folha de São Paulo, 27/08/2008)