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eucalipto no pampa
2008-08-25

É com disciplina quase militar que, diariamente, centenas de frentes de trabalho partem de cidades gaúchas para plantar, adubar e tratar áreas de florestas. Incorporaram-se à rotina da Metade Sul desde que empresas de celulose começaram a investir na expansão do eucalipto. Era madrugada quando ZH se juntou a um dos grupos, e o sol tinha se posto quando os trabalhadores voltaram para casa.

Ainda é noite em Piratini. Um ruído abafado e contínuo interrompe o diálogo estridente dos galos e atravessa as ruas de paralelepípedo da histórica Capital Farroupilha, no Sul do Estado. É o som dos motores de ônibus, que às 5h30min percorrem o município para recolher em casa trabalhadores ligados ao plantio de eucalipto.

Pouco antes das 6h, cerca de 160 funcionários se perfilam em frente ao relógio-ponto instalado na garagem da casa que abriga a Wachholz, empresa que realiza serviços de plantio e manutenção de florestas para a Votorantim Celulose e Papel (VCP) e outras companhias da cadeia. Apenas essa prestadora despacha, por dia, dois ônibus, dois microônibus e três vans com mão-de-obra para os campos de eucalipto.

Somente os novos investimentos da Aracruz, VCP e Stora Enso ocupam hoje 2,5 mil pessoas, especialmente nos campos da Metade Sul. Incluindo empregos indiretos, estudo da Fundação de Economia e Estatística aponta que esses empreendimentos florestais podem empregar, em média, 80 mil pessoas por ano até 2011. Os camponeses envolvidos na atividade são responsáveis por plantar mudas, aplicar adubo e combater formigas, e ganham salário médio mensal de R$ 600.

Os ônibus deixam Piratini em direção ao campo poucos minutos depois das 6h. Um deles, com 40 trabalhadores, se dirige à Fazenda Ideal, propriedade de 218 hectares comprada pela VCP em Capão do Leão. Dentro do veículo, o silêncio só é cortado pelo rádio do motorista, em baixo volume, tocando música sertaneja. Quase todos aproveitam o embalo da estrada esburacada para emendar o sono, interrompido no intervalo entre a cama e o relógio-ponto. Poucos são testemunhas do raiar do dia.

***
Uma hora, aproximadamente, é o tempo que a turma leva para chegar à propriedade. Vagarosamente, alguns com olhos semicerrados, deixam o ônibus. Acomodam-se em pequenos bancos embaixo de uma lona verde, instalada como QG. É hora do café da manhã. Cada um come seu pedaço de pão, fatia de bolo ou pastel preparado pela esposa. Para acompanhar, geralmente café, quente, em térmicas trazidas de casa, ou nem tanto, acondicionado em garrafas plásticas. É o estimulante para as primeiras conversas do dia, enquanto o sol levanta, dissipando a névoa branca que encobre o solo feito nata.

O desjejum é rápido. Menos de 10 minutos. Sem ordem ou combinação, levantam-se. Pegam suas caixas, com capacidade para 55 mudas e as prendem ao corpo por uma faixa parecida com um talabarte militar. A própria organização das tarefas evoca táticas de guerra. Cerca de 30 plantadores iniciam o trabalho lado a lado, cada um em uma linha de plantio, e avançam juntos, enquanto o restante do grupo faz o suporte. Quando um encerra a sua reta, assume a dianteira não plantada, de forma a não deixar nenhuma linha a descoberto.

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O desafio do dia é plantar cerca de 30 hectares de um total de 70 mil que as três papeleiras pretendem fazer em 2008. Apenas para dar conta das novas indústrias de celulose, serão necessários cerca de 360 mil hectares até 2015. Todo o plantio é feito manualmente, o que faz com que a atividade florestal, mesmo que o trabalho de campo se concentre nos dois primeiros dos sete anos de crescimento do eucalipto, empregue uma mão-de-obra em média duas vezes maior do que a agricultura e 10 vezes maior do que a pecuária, estima o assessor florestal da Caixa RS Doádi Brena.

– Aqui no Rio Grande do Sul as áreas são menores, o terreno é muito dividido e acidentado, e vale mais a pena o plantio manual. No Mato Grosso do Sul, onde os terrenos são mais planos, usamos a máquina, que permite que duas pessoas façam o trabalho de cinco ou seis – afirma o diretor florestal da VCP, José Maria de Arruda Mendes Filho.

Aqui, cada muda sai da mão de um trabalhador. A rotina é estafante e repetitiva: chutar torrões de terra acumulados nas linhas de plantio, abrir um buraco no solo com o saraquá (a ferramenta de plantio), atirar a muda de eucalipto pelo tubo de PVC que compõe o instrumento, dar mais uns chutinhos no chão para fechar o sulco e enterrar a planta. E repetir tudo dois metros à frente. E ainda outras 1,4 mil vezes no mesmo dia, por pessoa.

É com alívio que a turma do plantio vê chegar a hora que divide o dia. É tempo de deixar de lado a fadiga e se alimentar. Suados, com uma produtividade que nem de longe lembra o vigor do início da manhã, os trabalhadores andam pela coxilha e atravessam uma sanga até chegar à lona verde.

O bufê, servido em caixas térmicas que vieram no ônibus, está montado. Em fila, bandeja metálica na mão, os plantadores aguardam a hora de se servir: arroz, feijão, batata-doce caramelada, alface, beterraba, pão e cozido farroupilha, uma mistura de vários tipos de carne. Para beber, suco. De sobremesa, geléia de mocotó.

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O fim do almoço é o começo da diversão. A sombra projetada pelo ônibus delimita o espaço da sala de jogos a céu aberto. A turma esquece o eucalipto e se concentra no truco. Mas não por muito tempo. Às 13h20min já é hora de reiniciar a batalha do plantio. Enquanto a maior parte está às voltas com os torrões e o saraquá, três ficam na retaguarda, umedecendo e preparando as mudas, levadas de trator até os plantadores. Com mais tempo para conversar, o trio comenta a mudança desde a chegada dos empreendimentos florestais. Para eles, o emprego regular, com carteira assinada, vale o sacrifício diário.

– Não podemos nos queixar. Serviço tem e sobra em Piratini. Não é muito dinheiro, mas dá para sobreviver bem – diz Jorge Bueno, há quatro anos na Wachholz.

Nas linhas de plantio, o exército continua com a rotina da manhã. Dois supervisores acompanham de perto os movimentos. Com pedaços de taquara de dois metros, eles verificam se as mudas foram colocadas no solo respeitando essa medida. Apesar do calor de verão em pleno inverno, calça, bota e uma proteção contra animais peçonhentos sobre a perna são itens de segurança. O chapéu de palha ou boné protegem do sol, e também são obrigatórios.

Em meio a uma maioria que tem em média 40 anos, o ex-agricultor Vilson Dutra, 49, diz não poder se queixar da vida. Voz rouca, fala tranqüila, ele diz que a grande vantagem de trabalhar com eucalipto é o salário depositado regularmente no final do mês.

– Até 1988, eu trabalhava com lavoura, na chácara do meu pai. Plantava milho, arroz, feijão. A gente colhia e ficava o produto meses no galpão, apodrecendo. Cansei – conta Dutra, enrolando mais um punhando de fumo.

O cansaço dos plantadores começa a aliviar às 17h30min, com o sol já baixo no horizonte. É hora de um último café morno com pão e, então, de pegar o ônibus de volta. A maioria dorme no trote do motor, em meio ao cheiro do suor produzido por um dia de trabalho. Muitos só acordam às 19h, quando o veículo desliga no escritório da Wachholz. Batem o cartão e, enfim, a pé ou de ônibus, vão ao encontro de suas famílias, de casa. Já é noite em Piratini.

(Por Sebastião Ribeiro, ZH, 24/08/2008)


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