O fornecimento de água potável aos dois milhões de habitantes da capital de Uganda corre perigo por causa de uma combinação de mau planejamento urbano e mudanças no padrão das chuvas. O fornecimento a Kampala cabe à Corporação Nacional de Água e Saneamento e a vários mananciais naturais dispersos pela cidade. Essas duas fontes estão cada vez mais contaminadas. Kampala foi tomada de improviso pelas conseqüências da mudança climática, segundo o especialista Oweyegha Afyunaduula, ativista e professor do Departamento de Zoologia da Universidade de Makerere.
A magnitude das chuvas é imprescindível e isso obriga uma cidade mal planejada a lutar contra esses efeitos, explicou. “As colinas abrigam residências luxuosas. A água que eliminam não encontra terreno que a absorva naturalmente, devido ao excesso de chuvas, e segue para os vales”, explicou. A água excessiva causa grandes inundações nos vales, onde se concentra a população pobre, incapaz de pagar uma casa nas colinas. Os excrementos acabam na água de beber porque a maior parte do conteúdo da rede de esgoto flui pelo canal Nakiovubo, um grande curso a céu aberto que atravessa a cidade, rumo ao lago Vitória sem tratamento, explicou Afunaduula.
O pântano de Nakiovubo, que antes funcionava como filtro natural, se reduziu com rapidez devido ao excessivo acúmulo das próprias águas de esgoto. A situação de Kampala é complicada pelo fato de apenas 8% de seus habitantes terem ligação com a rede de esgoto operada pela Corporação Nacional de Água e Saneamento. O restante usa fossas. Inclusive algumas pessoas fazem suas necessidades em sacos plásticos que depois jogam no lixo ou nos canais de água.
Um informe da divisão de Kawempe, da prefeitura de Kampala, revelou que a maior parte da água da cidade também está contaminada. Todas as amostras coletadas das torneiras dos distritos de Bwaise II, Mulango II e Kyebando, em Kawempe, revelaram a presença de coliformes (bactérias procedentes de material fecal), disse David Semwanga, inspetor de saúde da divisão. Isso indica que a água está contaminada por excrementos de animal ou humanos que chegam ao sistema. Altos níveis de coliformes são causadores de cólera, diarréia e disenteria, disse Robert Odongo, inspetor ambiental do Ministério da Saúde de Uganda.
Considera-se que até 50 colônias destas bactérias em cada cem milímetros não é prejudicial. A mostra do distrito de Kyebando tinha 64 colônias, a de Mulango II 58 e a de Bwaise II 37. Já foram registrados casos de cólera em Kampala. Algumas pessoas se queixam de mal-estar estomacal. Esther Arego, residente em Kinawataka, outro subúrbio de Kampala, acredita que a água do manancial de Mukwano que ela usa está contaminada, mas, não tem alternativa. “O que posso fazer? É a única fonte de água na região. Poderia ferver, mas isso é só para beber. E a que uso para lavar os pratos?”, protestou.
Às vezes tem dores de estomago e sua vizinha também se queixou do mesmo problema, disse Arego, mas não está certa de a causa ser a água. A porta-voz da Corporação Nacional de Água e Saneamento, Miriam Kadaga, discordou do informe. “Nossa água é segura. Temos uma unidade de tratamento com tecnologia de vanguarda e estamos melhorando nossa rede de distribuição. Não há necessidade de criar alarme porque a água não está contaminada com bactérias”, insistiu.
Mas as conclusões preocupante das contaminação crescente condizem com o último estudo divulgado pela organização humanitária Oxfam, que detalha o impacto da mudança climática, em especial sobre a população mais pobre do país, tanto urbana quanto rural. “Prendendo a calefação” é o título do estudo da Oxfam, motivado pelas inundações do ano passado que devastaram zonas do leste de Uganda e Kampala. Kampala e outras cidades do país sofrerão freqüentes inundações, que propiciarão a incidência de doenças e acentuarão a pobreza, segundo o informe da Oxfam.
O derretimento das geleiras da cadeia montanhosa Rwenzori afetou, segundo o estudo, a cabeceira de muitos rios que fluem para o lago Vitória e o rio Nilo. O Ministério da Água informou que muitos poços secaram. A secretária do ministério, Miria Mutagamba, explicou que as camadas freáticas ficaram abaixo dos poços. “Estamos escavando poços entre 60 e 80 metros de profundidade. Agora, consideramos recomendar aumentar para 80 a 100 metros”, afirmou. Este fenômeno pode obstaculizar as gestões do governo para garantir a água potável para toda a população até 2015, no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas.
(Por Joshua Kyalimpa, Envolverde, IPS, 22 /08/2008)