O governo atropelou um parecer da equipe técnica do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) ao autorizar o início das obras da usina hidrelétrica de Santo Antônio -a primeira do complexo do rio Madeira, em Rondônia. A licença de instalação foi concedida na segunda-feira passada, e as obras começam em 1º de setembro, de acordo com o cronograma do consórcio Madeira Energia.
Parecer de 146 páginas ao qual a Folha teve acesso, datado de 8 de agosto, recomenda expressamente a não-concessão da licença de instalação para a usina. Os técnicos ponderam que os senões "podem não configurar impeditivos graves à emissão da licença", mas advertem que as recomendações "são numerosas e expõem uma certa insipiência do projeto básico ambiental frente ao conjunto de impactos levantados".
No mesmo dia em que o relatório foi encaminhado à coordenação de licenciamento de energia hidrelétrica, uma sexta-feira, o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) chegou a convocar entrevista para o anúncio da licença. O anúncio acabou adiado para segunda-feira seguinte porque faltava uma autorização da ANA (Agência Nacional de Águas).
Procurado ontem pela Folha, o presidente do Ibama, Messias Franco, disse desconhecer o parecer técnico: "Eu sabia que havia pedaços de questionamentos, mas há uma quantidade enorme de processos, é muita coisa".
Segundo o presidente, o parecer técnico foi analisado pelas coordenações do Ibama e, na seqüência, pela direção de licenciamento. No caminho, os questionamentos dos técnicos foram transformados em novas condições a serem atendidas pelos empreendedores para levar adiante o projeto da hidrelétrica. Essas 48 condicionantes serão analisadas antes da autorização para o funcionamento da usina, previsto para maio de 2012.
"Quando é algo que pode comprometer, temos o cuidado de não dar a licença", afirmou Franco. Ele disse que se sente "sempre muito pressionado" a liberar os empreendimentos. O consórcio Madeira Energia S.A. não comentou o parecer técnico. Em março do ano passado, parecer semelhante adiou em quatro meses a licença prévia para as usinas de Santo Antônio e de Jirau.
Entre os problemas apontados pelos técnicos, está a não-apresentação de projeto de centro de reprodução de peixes, assim como de um segundo canal às margens do Madeira para garantir a reprodução dos famosos bagres, que popularizaram o debate do licenciamento ambiental das nova geração de grandes hidrelétricas na Amazônia.
(Por Marta Solomon,
Folha de S. Paulo, 22/08/2008)