Há dois anos, a Associação Brasileira de Criadores de Suínos (ABCS) lançou a campanha "Um Novo Olhar Sobre a Carne Suína", até hoje em curso. Na prática, o movimento tem por objetivo descobrir por que razões a população brasileira não alimenta as estatísticas que fazem dessa proteína de origem animal a mais consumida no mundo. E, naturalmente, reverter essa tendência.
Enquanto a Áustria consome 73,1 kg por habitante; a Espanha, 66 kg e o Paraguai, 26; no Brasil, no ano passado, a distribuição per capita de carne suína foi de apenas 13 kg. E desses, 9 kg referem-se a embutidos - presuntos, lingüiças, salsichas -, ficando o restante a cargo da carne fresca.
Curiosamente, o Brasil é hoje o quarto maior produtor mundial e exporta carne suína para nada menos que 76 países.
Com a campanha, que já aconteceu em vários estados do país, apresentando novos cortes – semelhantes aos bovinos – e palestras sobre as qualidades nutricionais da carne suína, a ABCS opera em cima dos cinco fatores apontados pelos consumidores brasileiros como motivos para que dêem preferência a outras proteínas de origem animal: preconceito, preço, conveniência, formato e associação com a obesidade. Um dos focos, portanto, é mostrar que a carne suína é cada vez mais "magra".
À parte dessas questões, o fato é que os suinocultores estão hoje bastante atentos à possibilidade de lucrar não só com a venda de sua produção, mas também no mercado de carbono.
O Brasil contabiliza hoje pouco mais de 260 projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), dos quais 178 já foram aprovados pela Autoridade Nacional Designada (AND), cuja função é aprovar/registrar, avaliar e promover tais projetos – no país, a Comissão Interministerial de Mudança do Clima.
Esses dados são alguns entre os muitos apresentados pelo Manual de Capacitação "Mudança Climática e Projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo", editado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), organização social supervisionada pelo Ministério de Ciência e Tecnologia. O trabalho foi lançado durante a 60ª reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em julho passado.
O número de projetos coloca o país na terceira colocação mundial em desenvolvimento de MDL, atrás da China e da Índia. E, desse total, cerca de 16% abrigam-se na atividade de suinocultura.
Assim, os dejetos suínos, que sempre foram considerados grandes fontes de poluição, agora podem ser fontes de riqueza no ascendente mercado aberto pela preocupação com o aquecimento global.
Há mais de 2 mil biodigestores já implantados no Brasil, equipamento usado na produção de biogás. A população suína hoje no país é de aproximadamente 38 milhões de animais, cada um produzindo entre 5 e 8 kg/dia de dejetos (esterco e urina), o equivalente a 90,2 bilhões de kg/ano.
Esse antes poluente, se processado nos biodigestores, pode produzir aproximadamente 900 milhões de m3 de gás metano/ano, equivalente a 64 milhões de botijões de gás de cozinha.
“Agora está se desencadeando um processo bem rápido”, disse a AmbienteBrasil Irineu Wessler, presidente da Associação Paranaense de Suinocultores (APS). “Algumas empresas, que trabalham em parceria, já estão proporcionando isso para os produtores”.
Um exemplo dessa prática está na Sadia que, em seu site, informa: “A carga orgânica poluidora dos dejetos suínos é 25 vezes maior do que a do esgoto humano; nas regiões com alta concentração de suínos, grande parte dos dejetos é lançada no solo e em cursos de água sem tratamento, o que, além de degradar o meio ambiente, emite gases nocivos”.
Numa estratégia de rompimento com esse cenário, a empresa lançou o Programa 3S (Suinocultura Sustentável Sadia), ao qual os suinocultores podem aderir voluntariamente. Em caso positivo, preenchem uma Folha de Dados, a partir do que é realizado o cálculo das emissões de CO2 reduzidas com a instalação do biodigestor e obtém-se uma estimativa de quantos Créditos de Carbono o suinocultor poderá receber (Potencial de Redução de Emissões).
O Instituto Sadia de Sustentabilidade capta, junto ao mercado, recursos para a instalação dos biodigestores e os instala nas granjas participantes. O suinocultor, por sua vez, opera o biodigestor em regime de comodato e pode abater o investimento da instalação dos equipamentos por intermédio dos Créditos de Carbono.
“Estamos conscientes da necessidade de se trabalhar de acordo com as normas ambientais”, diz Irineu Wessler, para quem tal respeito é, inclusive, uma exigência cada vez maior dos mercados consumidores, no Brasil e além-fronteiras.
(Por Mônica Pinto /
AmbienteBrasil, 20/08/2008)