Comissão diz que escolha de local para rejeitos não pode ser feita enquanto governo não decidir com quantas usinas pretende trabalhar
Ibama condicionou a aprovação de licença prévia de Angra 3 à execução de projeto de armazenamento de lixo atômico de usina
A indefinição sobre o tamanho do programa nuclear brasileiro trava a escolha de um local para o depósito definitivo de rejeitos de alta radioatividade, segundo o presidente da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear), Odair Gonçalves.
Uma das condições impostas pelo Ibama na licença prévia de Angra 3 foi "apresentar proposta e iniciar a execução do projeto aprovado pelo órgão ambiental para disposição final dos rejeitos radioativos de alta atividade antes do início da operação da unidade 3".
Gonçalves afirma que a CNEN tem conversado com o Ibama porque o órgão não deveria fazer a exigência à Eletronuclear, e sim à comissão. Uma usina nuclear produz três tipos de rejeito: de baixa, média e alta intensidade. Os de alta intensidade são os elementos combustíveis, que hoje são acondicionados em piscinas de resfriamento nas próprias usinas. O assistente da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, afirma que, a rigor, nesse caso não caberia nem mesmo a classificação de rejeito porque o combustível pode ser reprocessado para gerar mais energia. A capacidade atual das piscinas vai até 2020.
Os rejeitos de baixa e média intensidade são roupas usadas, filtros de ar e objetos que retenham alguma partícula radioativa. Atualmente são guardados em depósitos iniciais no terreno da usina.
Depósito intermediário
Segundo Guimarães, a Eletronuclear pretende construir outras piscinas, que poderiam guardar o material durante toda a vida útil das usinas, enquanto não fica pronto o depósito final, que o executivo chama de "depósito intermediário de 500 anos". A idéia é criar um depósito que permita, caso o país necessite no futuro, o reaproveitamento do combustível. "Hoje, no Brasil, não faz nenhum sentido pensar em reprocessamento. É totalmente antieconômico, nosso parque nuclear é pequeno e temos a sexta maior reserva de urânio no mundo, mas no futuro isso pode ser diferente", disse.
Para Gonçalves, a escolha do local não pode ser feita enquanto o governo não decidir com quantas usinas pretende trabalhar. "Trata-se de um projeto caro, não posso construir um a cada cinco anos", disse. Ele afirma, no entanto, que a região Nordeste seria uma "forte candidata" a receber uma das próximas centrais nucleares e o depósito de rejeitos. Inicialmente, quando o projeto nuclear se concentrava em Angra, pensava-se em construir o depósito em local próximo, mas, com a perspectiva de construir nos próximos anos de quatro a oito novas usinas em diferentes pontos do país, encontrar o local adequado para o depósito de rejeitos se tornou uma tarefa mais complexa. Não há, por enquanto, estimativas de qual seria o investimento necessário. A previsão é de entrada em operação do depósito em 2050.
Em Angra 1, existem hoje 614 elementos combustíveis. Em Angra 2, são 272. A execução do projeto do depósito ainda poderia ficar a cargo de uma nova estatal, que seria criada para isso. O conceito com que a Eletronuclear trabalha atualmente inclui um ambiente rochoso, como uma caverna.
Os elementos combustíveis seriam encapsulados e transportados até lá. "Embaixo do concreto tem chapa metálica para garantir a impermeabilização", disse o executivo da Eletronuclear. Antes de ser levado para esse depósito, o combustível precisa ficar cerca de dez anos nas piscinas para o resfriamento.
Outros países também estão tentando equacionar a questão dos rejeitos definitivos. Finlândia e Suécia têm projetos de depósito final subterrâneo, onde o combustível ficará armazenado a grandes profundidades. Os Estados Unidos têm o projeto de Yuka Mountain, em terreno de montanhas em Nevada.
(Por Janaina Lage, Folha de S. Paulo, 18/08/2008)