Há um ponto crítico na implementação das medidas para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e adaptação das sociedades em face da nova realidade global, após termos cruzado os limites do uso sensato dos recursos naturais. É nesse ponto que as negociações empacam: a redução de poluentes afeta o modelo de produção dos países, sobretudo os desenvolvidos.
Levando em conta as metas que convenções e protocolos internacionais requerem e o que está em jogo nessa história -a própria sobrevivência do planeta-, o custo das transformações chega a ser irrisório, comparado ao volume de riquezas que circula no mundo e ao gasto atual e futuro para reparar o prejuízo ambiental. A sociedade pode, de várias formas, incentivar a mudança de padrão de produção. O consumidor, hoje, quer ir além da satisfação de necessidades imediatas. Valoriza cada vez mais produtos que agreguem valores éticos e compromissos com a sociedade como um todo.
A economia que responde a essa demanda precisa, mais do que nunca, ser oxigenada para sobreviver e se estabelecer como padrão, constrangendo positivamente a renitente economia insustentável. No Brasil, a legislação ambiental evoluiu muito no que diz respeito aos instrumentos de proteção ambiental. Agora chegou a hora de concentrar esforços em criar e aperfeiçoar normas e instrumentos de apoio às atividades econômicas sustentáveis.
Isso significa acolher e reconhecer os esforços de lideranças empresariais e comunidades que já vêm adequando de forma pioneira seus métodos de produção, para poupar recursos naturais. E aqueles que ainda não incorporaram conceitos de sustentabilidade aos seus negócios, devem ser estimulados a fazê-lo.
Nessa linha, há projetos importantes no Congresso. Pelo menos três devem ser citados. O Imposto de Renda ecológico, que dá benefícios fiscais a quem contribui com projetos ambientais, a exemplo do que existe nas áreas de assistência social, cultura e esportes. O projeto que altera a lei de licitações, para que as compras públicas, "sempre que possível", adotem especificação "que considere critérios ambientais". E o chamado FPE Verde, que redistribui 2% do Fundo de Participação dos Estados proporcionalmente à área, em cada Estado, protegida por unidades de conservação e terras indígenas.
Mas ainda são iniciativas isoladas. Temos que fazer a revolução dos incentivos, assim como aconteceu, em outros tempos, para impulsionar a industrialização. Estamos na pré-história dessa revolução. É preciso determinação da sociedade e do Estado para inverter o sinal e mudar de era.
(Por Marina Silva, Folha de S. Paulo, 18/08/2008)