Estudo científico publicado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) projeta que a mudança climática da Terra poderá afetar o mapa agrícola do Brasil. O aquecimento global poderá forçar a migração de culturas, a diminuição de área de cultivo e maior pressão sobre a chamada área de “fronteira agrícola” entre o Cerrado e a Amazônia.
As regiões mais afetadas são Sul, Sudeste e Nordeste do país, o que pode resultar na transferência de culturas para as áreas agricultáveis da Amazônia Legal e no aumento do fluxo migratório para a região. Segundo o coordenador do estudo, Hilton Silveiro Pinto, áreas agricultáveis da Amazônia “não deverão sofrer qualquer problema”.
A Embrapa Informática Agropecuária e o Cepagri (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas da Unicamp) fizeram projeções para 2020, 2050 e 2070 e construíram dois cenários para as culturas de algodão, arroz, café arábica, cana-de-açúcar, feijão, girassol, mandioca, milho e soja.
No cenário mais pessimista, as temperaturas vão subir em diferentes regiões de 2 a 5,4 graus célsius. No cenário menos negativo, a variação é de 1,4 a 3,8 graus célsius.
À exceção da cana-de-açúcar e da mandioca, as projeções prevêem que todas as demais culturas estudadas sofrerão impactos negativos com o aquecimento da temperatura no planeta. Segundo o estudo “Aquecimento Global e Cenários Futuros da Agricultura Brasileira”, algumas plantas podem até continuar crescendo com a mudança climática, mas sem florescer e gerar frutos.
O estudo contabiliza que, se nada for feito para reverter o aquecimento, a agricultura brasileira poderá perder até R$ 7,4 bilhões ao ano, a partir de 2020, com a diminuição da safra de grãos. Em 2070, o prejuízo poderá contabilizar até o dobro e chegar a R$ 14 bilhões/ano. Nessa hipótese, a soja (que, na safra 2007/2008, colheu 61 milhões de toneladas de grãos) é a cultura mais prejudicada: os pesquisadores estimam uma perda de área agricultável de até 40%.
No caso da cana-de-açúcar e da mandioca, o efeito é o contrário: o aquecimento aumenta o volume de terras com clima adequado para a plantação.
O presidente da Comissão Nacional do Meio Ambiente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Assuero Doca Veronez, criticou projeções feitas com pesquisas climáticas e opinou que o cálculo está distorcido. “Eles analisam só as culturas que têm prejuízo, mas avaliando só as culturas que terão prejuízo não avaliam, por exemplo, o impacto positivo no caso da cana”, pondera.
O coordenador do estudo, Hilton Silveiro Pinto, afirmou que a pesquisa quer evitar qualquer “terrorismo climático” e associou a preservação com a agricultura como forma de combate ao aquecimento global. “Nós temos grandes processos de mitigação e adaptação que hoje se mostram práticas totalmente viáveis de seqüestro de carbono e que evitam danos à agricultura, fazendo arborização e cultivo, integrando pecuária, lavoura e floresta”, defendeu.
Para o pesquisador sênior do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Paulo Barreto,o estudo mostra que é “melhor prevenir do que remediar” o aquecimento global, e uma forma de fazer isso é resolvendo o problema fundiário da Amazônia. “A principal medida é reduzir o desmatamento na Amazônia. O estudo reconhece que já tem tecnologia para melhorar a qualidade da pastagem, ou seja, criar mais gado nas pastagens que já foram abertas”.
Além do combate ao desmatamento e às queimadas; os pesquisadores da Unicamp e da Embrapa assinalam que medidas como o plantio direto na palha (sem aragem) podem mitigar os efeitos do aquecimento. Outra possibilidade, criticada por ambientalistas, é a produção de sementes geneticamente modificadas, que gerem plantas mais resistentes ao aumento das temperaturas.
Não há unanimidade na comunidade científica sobre as causas do aquecimento global. O painel intergovernamental das Nações Unidas atribui o aumento de temperatura à emissão de gases que eliminam a camada de ozônio que protege a Terra de raios solares. O Brasil é considerado um grande emissor desses gases por causa do desmatamento das florestas.
Outros cientistas não vêem na ação do homem razões suficientes para o aumento do aquecimento, e explicam o fenômeno com base no aumento da intensidade dos raios solares e dos ciclos da Terra, entre outros fatores. Para alguns, o aquecimento pode até aumentar a quantidade de chuvas em algumas áreas.
Para fazer as projeções, os pesquisadores da Unicamp e da Embrapa produziram mapas climáticos dividindo o território nacional em áreas de 50 quilômetros quadrados. O estudo levou 10 meses e custou R$ 530 mil financiados pela Embaixada Britânica.
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Agência Brasil, 18/08/2008)