Carlos Mateo Balmelli diz que tratado 'claramente beneficiou mais o Brasil'. Mas ele garante que Paraguai não tomará atitude hostil contra o país.
O novo diretor-executivo de Itaipu pelo lado paraguaio, o ex-senador Carlos Mateo Balmelli, afirmou neste sábado (16) em entrevista ao G1 que a revisão do tratado da usina hidrelétrica nacional é inevitável. Ele assumirá o posto na segunda-feira (18).
Segundo ele, o contrato firmado entre os dois países em 1973 não reflete a igualdade na administração de Itaipu e “claramente beneficiou mais o Brasil”. Contudo, Balmelli diz que o Paraguai não tomará nenhum medida de força contra o governo brasileiro para ver suas reivindicações atendidas.
“Há uma injustiça no tratado de Itaipu desde o início e isso não é nenhuma ameaça ao Brasil. É apenas a verdade”, argumenta Balmelli, que é membro do Partido Liberal, o mesmo do vice-presidente Federico Franco.
Segundo ele, a negociação entre Brasil e Paraguai sobre o tratado de Itaipu será complexa e vai determinar o futuro dos dois países. “A negociação de Itaipu é complexa e vai determinar a inserção do Paraguai no mundo globalizado e o modelo de liderança que o Brasil pretende exercer na região”, argumentou.
Ele afirma que se o Brasil quer se tornar um líder regional que busca o desenvolvimento dos outros países da América do Sul terá que renegociar o tratado. Porém, se não aceitar a negociação tomará o caminho da “dominação hegemônica, preocupado apenas com o seu próprio desenvolvimento”.
Balmelli disse que está “muito esperançoso” que conseguirá convencer o Brasil a pagar mais pela cessão da energia adicional que consome de Itaipu.
Preço justo
Pelo tratado, 50% da energia produzida em Itaipu deve ser consumida por cada um dos sócios. Quando um não consome sua parte é obrigado a vender para o outro. O Paraguai consome apenas 7% da sua parte e o restante vende para o Brasil. Os paraguaios querem receber mais dinheiro por essa cessão da energia que eles não consomem.
Balmelli deve se reunir com Lugo nos próximos dias para relatar como estão as conversas com o Brasil e definir uma data para que os dois países comecem a negociação de uma possível alteração no tratado. Balmelli evita citar os valores que o Paraguai vai propor ao Brasil. “O que nós queremos é um preço justo pela cessão de energia. Eu confio muito na boa vontade do Brasil e do presidente Lula”.
“Nós não tomaremos nenhuma atitude hostil contra o Brasil e nem estamos querendo tirar o pão da boca do povo pobre do Brasil. Não estamos dizendo que o Paraguai tem que receber mais que o Brasil. O que queremos, sim, é que o preço da cessão de energia suba”, argumenta.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na sexta-feira (15), após participar da cerimônia de posse do novo presidente do Paraguai, Fernando Lugo, que está disposto a negociar a questão de Itaipu com o país vizinho. Mas disse que um aumento de tarifa seria "complicado".
“Vamos ver qual será a demanda deles porque qualquer aumento de tarifa que incidir sobre um aumento de tarifa para o povo brasileiro aí fica complicado. Mas como o presidente Lugo ainda não me apresentou a demanda, eu vou aguardar”, disse o presidente.
Negociação combinada
Segundo Balmelli, a visão sobre o empreendimento de Itaipu precisa mudar. A usina foi construída sem visar lucro, apenas para contribuir com o desenvolvimento das duas economias. “Itaipu tem que passar a ter outra visão. Tem que pensar em dar lucro. Tem que ser vista como um negócio de energia”, alega o novo diretor. Esse é o caminho apontado por ele para aumentar a receita dos dois países com a usina.
Balmelli rechaça a idéia brasileira de que não é preciso aumentar a tarifa de Itaipu para levar desenvolvimento ao Paraguai. O Brasil está sugerindo que a construção de uma linha da transmissão entre a usina e Assunção ajudará a atrair empresas e novos investimentos para o país vizinho.
O novo diretor diz que a negociação de Itaipu não pode ser vista como um “pacote”. “Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”. Segundo ele, o financiamento brasileiro de aproximadamente R$ 300 milhões para construção da linha de transmissão é bem vindo, mas não faz parte das conversas sobre o tratado de Itaipu.
Os paraguaios querem ainda um novo tratado que permite que a sobra de energia possa ser vendida para outros países, o que também resultaria num aumento de receita. Todas as mudanças propostas pelo novo governo do país vizinho teriam que passar pelo Congresso Nacional brasileiro, não basta que Lula e Lugo cheguem a um acordo. “Não creio de nada será fácil, mas nada é impossível”, afirmou.
Corrupção
Segundo ele, os paraguaios acreditam que há corrupção em Itaipu. Ele ressalva que está falando do lado paraguaio, eximindo o lado brasileiro de participação. Balmelli comemora que assinou com o diretor-executivo do lado brasileiro, Jorge Samek, um acordo que permitirá mais transparência à gestão da usina no Paraguai.
“Muitas coisas eram colocadas como secretas sob o pretexto de que faziam parte do tratado internacional e precisavam ficar em segredo. Nós queremos dar transparência a tudo e por isso é muito importante esse acordo que já firmamos com o diretor Samek”, salientou.
Questionado se há motivos para o povo desconfiar que há corrupção em Itaipu, Balmelli sugere que sim. “Por um estilo pessoal eu não quero acusar. Mas, nós presumimos que os gastos sociais e a gestão de Itaipu foram usados para tomar dinheiro do povo paraguaio. Essa é uma certeza que todos os paraguaios têm. Por isso, esse documento de transparência vai mudar as coisas na gestão de Itaipu”.
(G1, 17/08/08)