Numa mudança de postura inesperada, o governador de Rondônia (RO), Ivo Cassol (sem partido) reconheceu que as hidrelétricas a serem construídas no Rio Madeira não trarão benefícios diretos para seu Estado - diferentemente do que afirmava quando defendia ferrenhamente a viabilidade, necessidade e urgência das obras. Para tentar sanar esse prejuízo recém admitido, anunciou a cobrança de 5% do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre a energia que será produzida em Santo Antônio e Jirau e enviada em corrente contínua para as centrais em Araraquara, interior de São Paulo.
Cassol se mostrou empenhado em mobilizar a sociedade civil de Rondônia, as classes política e empresarial e os congressistas rondonienses em Brasília para que pressionem o governo federal, a fim de que ele autorize o desconto de 5% do ICMS que será cobrado pelos governos dos estados que receberão a energia das novas hidrelétricas, direcionando esses recursos para os cofres rondonienses.
O plano do governador implica numa drástica mudança sobre a forma de arrecadação do imposto, que deve envolver na decisão o Conselho Monetário Nacional (CMN). Há possibilidade de balizamento por parte do Congresso para que possa ser aplicado. Em discurso proferido na quarta-feira (13/08) na solenidade de assinatura de contratos para obras de abastecimento para a população de Porto Velho com água tratada, no Tribunal de Contas do Estado, Cassol afirmou ser essa a única maneira da energia gerada pelas hidrelétricas do Madeira de alguma forma beneficiar Rondônia. De acordo com os cálculos, esses 5% representariam um montante de R$ 240 milhões por ano ao estado.
Ainda nos prejuízos à Rondônia, Cassol agora considera baixo o valor dos royalties a serem pagos por Furnas e associadas ao estado e ao município de Porto Velho (R$ 50 milhões por ano para cada), e insuficiente para ajudar a capital rondoniense a suportar os impactos gerados pelo aumento desordenado da população local.
"João sem-braço"
Durante muito tempo Ivo Cassol bateu na tecla de que pretendia que fosse instalado nas hidrelétricas um sistema de linha de transmissão de corrente alternada. Entretanto, reconheceu ser impossível reverter o sistema de transporte da energia gerada (de corrente contínua) que beneficiará apenas o sul e sudeste brasileiros.
Embora já fosse do conhecimento de todos a opção das empreiteiras responsáveis por construir as linhas de transmissão pelo sistema contínuo. Uma mudança para a linha alternada acarretaria num aumento de até 30% no custo das obras de Santo Antônio e Jirau.
Para o deputado federal Eduardo Valverde (PT-RO), o governador está "dando uma de João sem-braço nessa história toda. A questão desses 5% é outra. Já está em construção da interligação elétrica entre Rondônia e o Mato Grosso. Com isso, o estado deixará de utilizar o óleo diesel em suas térmicas e conseqüentemente perderá o ICMS cobrado por esse combustível. Essa proposta do governador é para tentar recuperar esse dinheiro que sabe que perderá". Apesar dessa crítica ao método de Cassol, Valverde concorda que o sistema alternado seria a melhor opção para Porto Velho e Rondônia, por conta da necessidade de importação de material e tecnologia para se instalar o outro modelo, além da perda de energia ser menor nesse sistema. "Aqui no Norte e Nordeste, todo o sistema utilizado é de corrente alternada, e seria necessário reforçá-lo, o que acarretaria num gasto adicional". Estava prevista para hoje, 13, uma audiência pública para debater justamente o sistema das linhas de transmissão da energia gerada por Santo Antônio e Jirau. Cassol colocaria sua nova visão nessa audiência, mudando seu tema, ou mesmo inviabilizando-a. Foram convidados para essa audiência Ministério Público de Rondônia, Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero), Federação do Comércio do Estado de Rondônia (Fecomércio) e representantes de entidades de classes. A princípio está igualmente inviabilizado ou modificado outro evento marcado para ocorrer na Assembléia Legislativa do Estado, no próximo dia 27, sob o mesmo tema.
Agora eles são contra...
A idéia é dos vereadores Ted Wilson (DEM) e Kruger Darwich (PCdoB) que vêm se empenhando em sensibilizar outros vereadores a participar da "luta" para forçar as firmas que venceram os leilões a mudar o sistema de linha de corrente contínua pela alternada. O coordenador do Fórum Linha de Transmissão em Corrente Alternada Já (LTCA), Ronaldo Ferreira da Silva, tem usado a imprensa para falar da importância da escolha desse modelo e busca incentivar a adesão da população ao movimento através de um abaixo assinado físico e virtual
Numa "Carta Aberta à População", o fórum diz que "a Transmissão em Corrente Contínua é nociva ao desenvolvimento, pois trará conseqüências desastrosas para Rondônia e região, uma vez que levará toda a energia das usinas do Madeira diretamente para São Paulo, sem possibilidade de serem aproveitadas pelas cidades por onde passará a linha de transmissão".
(Por Filippo Cecílio, Amazônia.org, 15/08/2008)