O futuro diretor-geral paraguaio da hidrelétrica de Itaipu, Carlos Mateo Balmelli, disse em entrevista à BBC Brasil que o tratado que deu origem à usina foi firmado em um contexto em que os dois países eram governados por ditaduras e precisa ser "atualizado".
"Nós acreditamos que o Tratado de Itaipu tem de ser atualizado. O tratado foi firmado em outro contexto internacional, em um mundo de guerra fria, em um mundo bipolar, com dois países que tinham governos de caráter ditatorial", afirmou Balmelli, que recebeu a reportagem da BBC Brasil em sua casa na capital do Paraguai, Assunção.
Quando o novo governo paraguaio tomar posse, nesta sexta-feira, Balmelli terá a tarefa de colocar em prática uma das principais promessas de campanha do presidente eleito Fernando Lugo: a revisão do Tratado de Itaipu, assinado entre Brasil e Paraguai em 1973.
Durante a campanha, Lugo disse que iria buscar renegociar o tratado e cobrar um "preço justo" pela energia excedente que o Paraguai vende ao Brasil. O governo paraguaio, porém, não especifica que valor seria considerado justo.
Questionado sobre o assunto, Balmellin também não apresentou números. Ele disse que "o conceito da necessidade e da utilidade da água é muito diferente em 2008 do que era em 1973" e que em uma situação de expansão de demanda "o custo da energia" é maior.
Negociação
O governo brasileiro já afirmou diversas vezes que considera o preço pago ao Paraguai justo e que não pretende revê-lo. "[O valor pago] é o preço que custa a energia elétrica em média no Brasil", disse à BBC Brasil o diretor-geral brasileiro de Itaipu, Jorge Samek.
Apesar disso, Balmellin afirmou que pretende negociar e é evasivo quando questionado sobre o que o país faria caso o Brasil não aceite aumentar o preço.
"O Brasil é um país líder em nível regional, é o que se chama hoje em dia de um global player. Então esperamos, ansiosos, que o Brasil atue de acordo com as circunstâncias, o momento histórico. Acredito que hoje não se pode atuar como se atuou em 1973", afirmou o novo diretor paraguaio.
Representantes brasileiros já têm conversados com membros do futuro governo para discutir o assunto, mas o Brasil rejeita qualquer renegociação dos principais pontos do tratado.
"O Brasil tem total disposição e total abertura para o diálogo com o Paraguai, mas eu gostaria de frisar que uma coisa é a abertura para o diálogo e outra, bem diferente, é a aceitação de eventuais demandas", disse na quarta-feira, em entrevista coletiva em Brasília, o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, ao anunciar a viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Paraguai.
Além do reajuste do preço, o Paraguai tem outras reivindicações. O país quer poder vender seu excedente de energia a terceiros mercados (o que o tratado não permite) e ter mais espaço na co-gestão da empresa.
Importância
Itaipu é a principal empresa do Paraguai e a renegociação do tratado é um tema sensível no país, com atenção diária da imprensa, especialmente nestes dias que antecedem a posse do novo governo.
Os termos do tratado estabelecem que a energia gerada pela maior usina do mundo em produção deve ser dividida igualmente entre os dois sócios.
O Paraguai, porém, utiliza apenas cerca de 5% dessa energia, quantia que é suficiente para suprir 95% de sua demanda. O excedente é vendido ao Brasil, onde 20% da energia elétrica consumida vem de Itaipu.
O Brasil paga ao Paraguai cerca de US$ 45 por megawatt hora. Na composição do preço estão incluídos itens como juros da dívida, royalties e custos de operação. Do total, aproximadamente US$ 2,80 correspondem à compensação pela cessão de energia não utilizada pelo Paraguai. É esse valor que os paraguaios querem aumentar.
(Por Alessandra Corrêa, BBC Brasil, Folha Online, 14/08/2008)