Hoje relator terá encontros em Brasília; dentro do governo brasileiro iniciativa é considerada de 'alto risco'O relator especial para os direitos indígenas da ONU, o americano James Anaya, visitará a reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, para avaliar a situação em que vivem os indígenas. A viagem está sendo considerada dentro do governo brasileiro como de "alto risco". A entidade há meses avisa o governo que não está satisfeita com a situação e cobra resultados na proteção dos direitos dos povos indígenas.
Anaya inicia sua visita hoje, em Brasília, com encontros na Fundação Nacional do Índio (Funai), no Ministério da Justiça e possivelmente com o chanceler Celso Amorim. O relator, que também atua como professor de direito internacional nos EUA, acaba de ser eleito para o posto e escolheu o Brasil como primeiro destino, diante da gravidade da situação em Roraima.
No governo brasileiro, os mais céticos advertem que a visita da ONU, ainda que seja para defender os direitos dos indígenas, pode acabar tendo efeito contrário. O temor de parte da diplomacia é de que a visita acabe resultando em um sentimento no Supremo Tribunal Federal (STF) contra qualquer intromissão estrangeira no caso. O STF julga neste momento a demarcação das terras na Raposa Serra do Sol.
A preocupação foi passada ao relator, que optou por realizar a viagem sem alarde. Oficialmente, orientou seu escritório em Genebra a avisar que não dará conferências de imprensa nem antes nem durante seus 12 dias pelo Brasil. Ao fim da missão, aceitou conceder um tempo aos jornalistas.
COBRANÇASEsta não é a primeira vez que a ONU demonstra preocupação com a reserva em Roraima. Em 2007, uma série de comunicados foram enviados pelos relatores de direitos humanos das Nações Unidas ao governo brasileiro, alertando sobre as violações que os indígenas estariam sofrendo. As cartas pediam que o governo garantisse a paz na região.
No entanto, o ex-relator da ONU para o direito a moradia Miloon Khotari afirmou ao Estado que o governo não havia respondido aos pedidos de explicação. O então responsável da ONU pelo direito a alimentação, Jean Ziegler, também mandou um comunicado ao governo cobrando esclarecimentos.
O Estado teve acesso a documentos da ONU que ainda relatam reuniões a portas fechadas entre diplomatas brasileiros e a entidade. O assunto é considerado crítico dentro das Nações Unidas.
Nos últimos meses, os índios brasileiros voltaram a ser notícia na Europa. Auxiliados e até financiados por ONGs estrangeiras, líderes dos grupos indígenas de Roraima estiveram com representantes dos governos de Espanha, Bélgica, Itália, França e Reino Unido para pedir apoio a sua causa.
Em junho, o auge do lobby ocorreu quando o papa Bento XVI os recebeu em audiência privada na sede da Santa Sé, em Roma. Ele prometeu ajudar os índios de Roraima.
Agora, Anaya promete levar o caso aos países da ONU. O relator fará uma avaliação da situação e apresentará parecer ao Conselho de Direitos Humanos da entidade.
Além da reserva, Anaya visitará os ianomâmis e grupos indígenas em Manaus. Outra preocupação dele é com a situação dos guaranis na região de Dourados (MS). Ele irá a Mato Grosso do Sul antes de concluir sua missão.
(Por Jamil Chade,
O Estado de S. Paulo, 14/08/2008)