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projeto orla do guaíba
2008-08-08

Galerias estavam divididas meio a meio, mas vereadores que se manifestaram

foram contra o empreendimento na beira do Guaíba


Galerias lotadas e manifestantes segurando faixas e cartazes com dizeres opostos prenunciavam o debate que iria ocorrer na Câmara Municipal de Porto Alegre, na noite de 6 de agosto de 2008. Inicado pouco depois das 19h, os últimos participantes deixaram o legislativo da Capital quase à meia-noite.

A audiência pública sobre a construção do Pontal do Estaleiro – um conjunto habitacional e empresarial a ser erguido na Ponta do Melo, às margens do Lago Guaíba – foi polêmica, mas terminou com uma sensação de vitória aos manifestantes contrários à proposta.

Mesmo aqueles que defendiam a construção dos seis edifícios – cada um com 13 andares – concordaram que talvez sejam necessárias modificações no projeto, especialmente no que diz respeito à sua volumetria (serão 43m de altura, o que, segundo o arquiteto do empreendimento, Jorge Debiagi, corresponde “ao topo do morro adjacente que circunvizinha a obra”) e ao trânsito de carros que deve gerar.

“Sabemos que acarretará problemas no sistema viário”, admitiu o representante da Região do Planejamento 5, Lauro Rössler, que ao lado de Maria Madalena Rössler, do Clube de Mães, elogiou o empreendimento que deverá abrir novas vias para tráfego na região.

Entre vaias e aplausos que se sobrepunham, vereadores e eleitores se revezaram na tribuna para defender ou atacar a obra.

Os contra: preservação do ambiente e fraude no leilão
Vinte e cinco pessoas subiram à tribuna: foram apenas oito vereadores e 17 representantes da sociedade civil. Cada um tinha direito a um discurso de cinco minutos. Os técnicos da Câmara Municipal fizeram com que os populares que se manifestaram estivessem rigidamente ordenados: um a favor, outro contra.

A maioria dos ambientalistas e líderes comunitários não queria a construção. Entre as justificativas, as de que o projeto privatiza a orla e retira a vista do morro que há próximo ao local.

Mas os argumentos mais importantes lembraram que o local está sob proteção da lei municipal, por se tratar de uma área de interesse cultural e da União, que o declarou Área de Preservação Permanente.

“Se a Câmara decidir votar o projeto, será processada por crime ambiental. Eles esquecem que o código florestal brasileiro também vale para os municípios”, atacou o advogado Cristiano Ribeiro, representante da OAB no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental. Muitos manifestantes lembraram também que o terreno foi leiloado durante mais de 15 anos consecutivos sem que houvesse interessados, pois a legislação determina que o local seja utilizado com fins públicos e
proíbe empreendimentos habitacionais na área.

“Quem comprou esse terreno três anos atrás sabia o regime urbanístico vigente para o local”, avalia a ambientalista Káthia Vasconcellos, que na audiência pública representou o Movimento Integridade.

Um engenheiro morador do Menino Deus lembrou que a indenização paga aos funcionários do Estaleiro Só teve inclusive que ser diminuída em razão das restrições de índices construtivos.

A BM PAR Empreendimentos Ltda adquiriu a área por R$ 7,2 milhões na época. O empreendedor pretende investir RS 165 milhões na construção dos 6 hectares do complexo. Mais da metade da área (3,3 ha) será pública, conforme adiantou o arquiteto Debiagi. Abertura de ruas, marinas públicas, um píer com bares e restaurantes e um grande calçadão estão previstos. Estimativas apontam que o valor dos investimentos em conjunto com a administração municipal chegue a R$ 250 milhões.

“Esse valor equivale a 10 apartamentos de primeira linha que serão vendidos nos prédios”, observou Franco Werlang, que defendeu um projeto sustentável para o local e disse falar em memória de José Lutzenberger.

O arquiteto Debiagi referiu que o empreendimento foi recomendado pelos órgãos do município – Cauge e secretarias do Planejamento, Obras e Viação e Meio Ambiente.

Segurança é o principal argumento de quem defende
Do outro lado, a principal razão para defender o projeto é a segurança. “Vou poder levar minha filha a passear de bicicleta e tomar chimarrão tranqüila, pois haverão câmeras de segurança espalhadas pelo local”, previu a moradora do Jardim Isabel, Patrícia, que fez questão de observar que essa não era uma idéia burguesa.

Já Joelcir Wolkmer, que é corretor de imóveis e mora há 28 anos na Vila Assunção, foi politicamente incorreto. “Eu não quero dizer ‘vileiros’... Mas o pessoal desses locais nos olha com um olhar ameaçador”, relatou.

Para o músico Alexandre Bruneto, Porto Alegre “precisa copiar Copacabana e Camboriú”, construindo prédios altos às margens do Guaíba. “O rio é muito sujo e ninguém vai limpa-lo. Pelo menos vão urbanizar o espaço para todos os moradores que hoje não podem sequer enxergar o pôr-do-sol”, defendeu.

Mas foi bem lembrado pelo vereador Professor Garcia, que o projeto socioambiental da Prefeitura – já em andamento - deverá resgatar a balneabilidade do lago até 2012.
Também estavam do lado dos empreendedores os trabalhadores da construção
civil, representados pelo seu sindicato, cujo presidente defendeu a obra pela geração de empregos.

A figura de um representante da União das Vilas da Grande Cruzeiro foi o suficiente para desmantelar a argumentação. “Não destruiria a minha casa para gerar dois empregos, nem minha rua, por cem. Muito menos vou destruir minha cidade para gerar mil ou dois mil empregos”, pregou, sem esquecer de fazer a ressalva de que mais empregos seriam gerados através de investimento público em educação.

O líder comunitário alertou que a Vila Cruzeiro não participou do debate sobre o Pontal do Estaleiro. “Não circulou nos nossos fóruns. Fui apresentado a esse projeto hoje!”.

Poucos vereadores, mas com opiniões sólidas
Menos da metade dos 36 parlamentares esteve presente na Audiência Pública
e apenas oito opinaram sobre o projeto. Guilherme Barbosa, Sofia Cavedon e
Margarete Moraes – todos do PT – ao lado do líder do governo, Professor Garcia (PMDB), criticaram os colegas que assinaram embaixo do projeto.

“Dizem que o projeto é um sinônimo de modernismo, mas ele traz retrocesso à cidade, pois impede o acesso ao rio. Não vamos permitir sua implantação!”, bradou o líder do governo Professor Garcia.

Adeli Sell (PT) optou pela mediação: “Nem oito nem oitenta”. E o Dr. Goulart (PDT), apesar de achar o projeto “magnânimo”, fez algumas restrições. “Concordo que podemos melhorá-lo”.

Apoiador convicto do projeto, apenas o progressista João Carlos Nedel. “A orla já é privada. Com esse projeto, tornaremos aquele um local de uso público”, acredita, fazendo referência à atual situação de ocupação por vilas ou casarões, em oposição ao passeio público incluído no projeto de Debiagi.

Ao final do debate, o professor da Uergs Antônio Ruas, anunciou a realização de uma manifestação pública no sábado (9 de agostos), em frente ao Big Cristal.

(Por Naira Hofmeister, colaborou Carlos Matsubara, Ambiente JÁ, 08/08/2008) 

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