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desmatamento da amazônia
2008-08-07
Cerca de 96% de toda a madeira apreendida em operações do Ibama e da Polícia Federal na Amazônia ficaram nas mãos dos desmatadores. E raros são os casos em que os bens apreendidos em crimes ambientais - entre eles tratores, caminhões e motosserras - são recuperados pelos fiscais na região.  

O diagnóstico está no primeiro mapeamento sobre a destinação de bens e produtos apreendidos em crimes ambientais em seis Estados amazônicos, realizado pela organização não-governamental Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia), com sede em Belém. Foram contemplados Amazonas, Rondônia, Acre, Roraima, Pará e Amapá.  

O estudo mostra através dos números o que até os leigos provavelmente já intuíam: um problema central no combate ao desmatamento é a falta de punição ao infrator. Gasta-se cada vez mais tempo em operações (agora midiáticas) de fiscalização, mas quase nada na finalização dessas ações.  

"Isso explica porque o desmatamento continua largamente ilegal e cresce à medida em que os preços agrícolas sobem, e não devido às ações de governo", afirma Paulo Barreto, pesquisador do Imazon e um dos três autores do estudo.  

Através da compilação de dados dos escritórios regionais do Ibama entregues ao Tribunal de Contas da União (TCU), os pesquisadores do Imazon descobriram que, entre 2004 e 2006, apenas 4% da madeira apreendida nos seis Estados tiveram alguma destinação, de um total de 178 mil metros cúbicos. Os demais 96%, com valor estimado em ao menos R$ 25 milhões, continuam nas mãos dos infratores.  

Uma das explicações é a falta de prioridade administrativa para destinar esses bens, evidenciada pela longa demora na homologação e julgamento de casos. No Pará, Estado que mais tem desmatado a floresta amazônica, há processos em andamento há 22 anos.  

"Enquanto o caso é analisado, o infrator já vendeu o bem apreendido", diz Barreto. "Ou simplesmente ele apodrece, no caso da madeira."  

Ao constatarem uma infração ambiental, os fiscais do Ibama emitem o auto de infração e lavram o Termo de Apreensão e Depósito (TAD), que descreve a mercadoria, o local de depósito e o responsável pelo armazenamento (o fiel depositário). Esse documento é então encaminhado ao escritório regional do Ibama, onde é analisado pelos procuradores do órgão - na verdade, procuradores da Advocacia Geral da União (AGU), que os "empresta" ao Ibama. Os procuradores devem homologar o TAD, para que os bens apreendidos pelos fiscais possam ter um destino. Enquanto isso não ocorre, máquinas e toras de madeira ficam "retidas" na propriedade autuada.  

De acordo com Barreto, aí entra um novo problema. Quando o caso é finalmente homologado o fiscal deve retornar ao local da autuação para fazer novas inspeções no campo para avaliar a situação no momento. "É fazer duas vezes o mesmo trabalho. E o Ibama não tem dinheiro pra voltar", diz Barreto. "Então não volta, o autuado não paga a multa, o bem não é apreendido, não há punição", resume. Em tempo: apenas de 2% a 3% das multas aplicadas aos desmatadores na Amazônia são efetivamente pagas.  

A lentidão na análise se dá, como sempre, devido à falta de pessoal. Segundo Barreto, um caso que chama a atenção é o Pará, onde há até pouco tempo havia somente sete procuradores trabalhando no Ibama, apesar da alta taxa estadual de crimes ambientais. Dos sete, um foi promovido a superintendente do Ibama em Belém e outro "sumiu". "Isso faz com que na maioria dos casos os próprios acusados continuem de posse dos bens durante a análise dos processos", diz o pesquisador. "Entre 2002 e 2006, o Pará emitiu 10 mil multas. Imagina tudo isso nas mãos de apenas cinco pessoas".  

Outra falha apontada é a escassez de beneficiários elegíveis para doação - devido a inflexibilidades a lei - e o desconhecimento ou dissenso na esfera judicial. O Imazon levantou que na maioria das vezes os acusados acionam a Justiça quando têm bens apreendidos. Isso explica porque tramitam apenas 25 casos no Tribunal Regional Federal (TRF). Quando chegam a esta instância, os bens apreendidos tendem a ser restituídos aos acusados (52% dos casos). Argumentos: o bem é um instrumento de trabalho do autuado, corre o risco de perecimento, não é de interesse para o processo ou teve sua propriedade comprovada. "Muitos juízes não conhecem a lei de crimes ambientais", atesta Barreto.  

Segundo ele, o governo deve atentar a dois princípios clássicos da administração e da literatura de crimes: celeridade na punição e escolha do alvo. "Melhor punir os maiores, para que isso tenha papel preventivo, e agir de forma estratégica", diz o Imazon. Todas as informações do estudo foram levantadas em entrevistas com funcionários e procuradores do Ibama.  

(Por Bettina Barros, Valor Online, 07/08/2008)

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