Apoiadores dos direitos humanos no Espírito Santo foram convocados pela Polícia Federal (PF) a depor em inquérito que investiga denúncia da transnacional Aracruz Celulose de que são responsáveis por “roubo” de patrimônio da empresa. A Aracruz Celulose usa métodos empregados pela ditadura militar, que deu recursos e apoio à empresa na sua fundação.
Foram intimados a professora Marilda Teles Maracci, o indigenista Fábio Villas, o pastor Emil Schubert, a radialista “Lígia Sancio” (nome artístico de Lígia Moysés Nascimento), além de “Jeanne” e “Jorge”, este do MST - Vila do Riacho.
Boa parte dos acusados já respondeu a processo movido pela mesma Aracruz Celulose. A empresa conseguiu da Justiça, por um bom período, que os denunciados fossem impedidos até de transitar pelas terras indígenas ocupadas e exploradas por ela há 40 anos. A empresa acabou por fazer acordo com os denunciados, o que resultou no arquivamento do processo.
Marilda Maracci informou que o grupo de intimados se reúne nesta quinta-feira (7) para discutir as medidas que vão adotar. A própria professora recebeu a intimação da PF por telefone, na última sexta-feira (1). Foi convocada a comparecer na Polícia Federal em 24 de setembro, às 10 horas. Responde a inquérito cujo delegado responsável é Fernando Amorim.
O advogado Jassenildo Henrique de Oliveira Reis, que atua na área dos direitos humanos no Espírito Santo, atuará na defesa dos apoiadores dos movimentos sociais.
Sobre a campanha da Aracruz Celulose e de outros segmentos para criminalizar os movimentos sociais no Espírito Santo, Marilda Maracci lembra que primeiro a empresa fez o “Interdito Proibitório” e a “Ação de Reintegração de Posse”. Agora, faz a denúncia que levou ao Inquérito Criminal. A professora diz que é momento para que os denunciados se articulem e se defendam coletivamente contra os abusos da empresa.
A professora, que é doutora em Geografia, afirma ainda que os apoiadores dos movimentos sociais não decidem por grupos, como os índios e quilombolas, que lutam por seus direitos, inclusive os previstos na Constituição Federal. Assegura que os apoiadores “respeitam as decisões coletivas”, e que os índios e quilombolas, entre outros, “são protagonistas de suas próprias histórias”.
História de violências - No total, a Aracruz Celulose tomou dos índios aproximadamente 40 mil hectares, dos quais o governo federal, através da Fundação Nacional do Índio (Funai), reconheceu 18.027 hectares como terras indígenas.
Os índios estão recebendo estes 18.027 hectares de suas terras de volta, após longo enfrentamento com a empresa. A terra está arrasada, exaurida e contaminada por agrotóxicos. Os tocos dos eucaliptos cortados impedem o uso de tratores, por exemplo. Os rios secaram, e não há nem vegetação nativa, nem animais.
Apesar de oficialmente demarcada, os índios ainda esperam a homologação de suas terras no Espírito Santo pelo governo federal.
A Aracruz Celulose tomou as terras dos índios há 40 anos, à força. Usou os serviços de um dos maiores pistoleiros da história do Espírito Santo, o major PM Orlando Cavalcante.
Apesar de explorar as terras indígenas por quatro décadas, a indenização aos índios definida no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que a Aracruz Celulose foi obrigada a assinar, será de apenas R$ 3 milhões. E o pagamento só será feito após a empresa retirar todo o eucalipto que está plantado na área.
A empresa também tomou terras dos quilombolas, no norte capixaba. E, da mesma forma que fez com os índios, usou mão-de-obra bandida para tomar estas terras. Seu principal testa-de-ferro foi o tenente Merçon, do Exército. No máximo, o militar consentia em pagar valores irrisórios aos que resistiam. Os negros então foram forçados a abandonar cerca de 50 mil hectares em todo o Estado em favor da empresa.
A empresa ainda ocupou e explora terras devolutas, como da fazenda Agril. Por lei, as terras devolutas devem ser destinadas à reforma agrária. Para plantar seus eucaliptais, a Aracruz Celulose destruiu cerca de 50 mil hectares da mata atlântica e toda a sua biodiversidade.
A Aracruz Celulose foi criada pelos militares atendendo ao empresário norueguês Erling Sven Lorentzen. Erling é casado com a princesa Ragnhild, irmã do rei Harald V. Para criar a empresa, o autoritário governo federal e os governos estaduais atenderam a tudo o que foi idealizado e pedido pelos noruegueses. Na prática, a empresa foi construída com dinheiro brasileiro. Depois, foi entregue a área privada, principalmente a Erling Sven Lorentzen.
(Por Ubervalter Coimbra,
Século Diário, 06/08/2008)