Na zona norte, os olhos vêem uma coisa, mas os pulmões sentem outra totalmente diferente. Quase um quinto dos moradores acha que a qualidade do ar na região merece nota dez, como apontou a pesquisa Datafolha nos distritos de Jaçanã, Tucuruvi, Vila Maria, Vila Medeiros, Santana, Vila Guilherme, Tremembé e Mandaqui.
Segundo a Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental), no entanto, a vegetação do Horto Florestal e da Cantareira não garante que o ar por ali seja mais puro do que no restante da cidade.
"Morar aqui é um privilégio", diz o funcionário público José Luiz Cardoso, 62, vizinho do Horto Florestal. "Não tenho dúvida de que o ar aqui é mais puro. Se saio daqui, sinto diferença. Meus olhos, por exemplo, ardem", conta.
"Se estou fora da região, sinto que minha respiração fica mais curta", afirma Sheilla Aparecida Saker, 43, advogada. "O ar aqui é úmido, fresco e infinitamente mais puro."
A avaliação atmosférica é o quesito que apresenta significativa diferença entre a nota dada na zona norte e a média paulistana --6,2 contra 5. Além disso, na média da cidade, apenas um em cada dez habitantes acha que o ar merece nota máxima --praticamente metade do índice obtido na região.
"A qualidade do ar na zona norte não é muito diferente do que ocorre em toda a região metropolitana", diz Maria Helena Martins, gerente da divisão de Tecnologia de Avaliação da Qualidade do Ar da Cetesb.
Em 2006, última medição disponível no Horto Florestal, houve ultrapassagem do Padrão Nacional de Qualidade do Ar em 18 ocasiões no local, onde a Cetesb tem uma estação. Foi o segundo pior resultado da cidade, empatado com o parque Ibirapuera, onde o ar ficou inadequado 18 vezes. O pior local foi Santo Amaro, com 19 ultrapassagens. "Jura? Ave Maria, não pode ser", diz, arregalando os olhos, o aposentado Edmilson Assunção, 63, que caminha no Horto Florestal duas vezes por semana --a poucos metros da estação da Cetesb.
Quem acha que a presença de grandes áreas de vegetação é a solução para a poluição atmosférica está enganado. Em seu best-seller sobre urbanismo, de 1961, "Morte e Vida de Grandes Cidades" (Ed. Martins Fontes), a urbanista norte-americana Jane Jacobs já afirmava que chamar os parques de pulmões da cidade é uma bobagem de ficção científica.
Segundo ela, são necessários cerca de 12 mil metros quadrados de árvores para absorver a quantidade de dióxido de carbono que quatro pessoas geram ao respirar, cozinhar e aquecer a casa. Jacobs afirma que são as correntes de ar, e não os parques, que impedem que as cidades sufoquem.
Assim, a serra da Cantareira é, ironicamente, uma das causas do problema. Ela forma uma espécie de barreira que impede a dispersão da poluição, formada pelo excesso de ozônio e por partículas que se movem com as massas de ar.
Segundo Maria Helena Martins, da Cetesb, o ozônio é o principal problema. Seu excesso pode provocar tosse seca, cansaço e ardor nos olhos, nariz e garganta e até falta de ar.
No entanto, se o verde não é garantia de ar puro, é uma boa opção para os momentos de folga. No Parque Estadual da Cantareira, no Tremembé, é possível fazer caminhadas, trilhas de mountain bike e entrar em cachoeiras. Vizinho ao parque está o Horto Florestal, outra opção para caminhadas.
(Por Evandro Spinelli e Mariana Barros com colaboração de Talita Bedinelli, Folha de S. Paulo, Folha Online, 04/08/2008)