Grupos ambientalistas costumam definir o rápido crescimento econômico da China como uma bomba-relógio ambiental. Alguns de seus efeitos são bastante conhecidos --como a alta emissão de gases de efeito estufa-- e outros problemas são menos expostos --como a propagação de espécies invasoras de animais e plantas pelo país e a perda de biodiversidade.
Ainda não há consenso de que o país seja o maior emissor de gases-estufa do mundo, à frente dos Estados Unidos, mas todos sabem que a China está entre os primeiros da lista, alavancada pelo uso de carvão como fonte de energia. E o problema cresce. Estimativas do IPCC (painel do clima da ONU), indicam que até 2010 as emissões chinesas crescerão até 5%, em relação a 2004.
Cientistas da Universidade da Califórnia, porém, publicaram em maio no periódico "Journal of Environmental Economics and Management" uma revisão pouco animadora. A pesquisa mostra que as emissões na China devem crescer ainda mais. Ao levar em conta todas as províncias e fazer uma análise detalhada, os americanos projetam um aumento de ao menos 11% na produção chinesa de gases-estufa.
"Todos têm tratado a China como um só país, mas cada uma das províncias é maior do que muitos países da Europa, tanto em tamanho quanto em população", diz um dos pesquisadores, Richard Carson. E o problema do crescimento chinês não se resume ao aquecimento global. Outra pesquisa, revelada neste ano na revista "BioScience" por cientistas chineses e americanos, afirma que o avanço da indústria e do comércio também tem ajudado a estabelecer espécies invasoras por todo o país.
Ela mostra que 400 plantas e animais exóticos são considerados invasores. Um tipo de lagarta vinda da América do Norte, por exemplo, rapidamente devasta a paisagem urbana de Pequim ao desfolhar mais de 200 espécies de planta. Da mesma forma, sementes de grama não-nativa e outros vegetais importados para deixar a capital mais bonita para as Olimpíadas podem ter dado carona a insetos nocivos.
Espírito olímpico
A catástrofe ambiental chinesa porém, só ganhou destaque na imprensa com o problema da poluição atmosférica de Pequim, que pode afetar atletas e turistas durante a Olimpíada. Um relatório do Greenpeace, porém, aponta algumas melhorias, apesar do problema. "No topo da lista dos problemas ambientais chineses está o aquecimento global, seguido de perto pela falta de água para sua população e preocupações sobre segurança alimentar e erosão de terras", diz a ONG.
A ONG considerou positivos a adoção de cortes de emissões para veículos, a construção de linhas de metrô e o incentivo para que 32 mil pessoas mudassem o aquecimento à base de carvão de suas casas. Também citou as novas estações de tratamento de água e esgoto. Entre os pontos negativos, a ONG destacou que não foram aplicadas tecnologias de economia de água em toda Pequim nem priorizada uma política de gerar menos lixo --em vez de construir mais incineradores.
"Cerca de 300 cidades na China têm grave carência de água; 70% dos rios chineses são poluídos", informa o relatório. A disponibilidade de água por pessoa é somente 1/ 32 do nível médio internacional.
E alguns animais refletem os problemas ambientais do país. O boto baiji, natural do rio Yangtzé, por exemplo, está praticamente extinto (criticamente ameaçado). Segundo a Sociedade Zoológica de Londres, caso seja confirmada a sua extinção, ele será o primeiro cetáceo a desaparecer como resultado direto da influência do homem: pesca abusiva, navegação excessiva, poluição fluvial e construção de usinas hidrelétricas.
Sobrou até para o panda-gigante, símbolo nacional, que perdeu muito de seu habitat e quase sumiu nos anos 1980. Ainda é tido como "em perigo".
Apesar dos problemas ambientais, o Greendex, o "ranking verde" da National Geographic, que analisa 14 mil consumidores em 14 países, coloca os chineses em 3º lugar em consumo sustentável. A boa posição ocorreu em razão do transporte. Muitos usam bicicleta e só 22% têm carro.
Mas a frota cresce, e o Greendex reconhece que sua metodologia mascara os efeitos negativos da alta utilização de carvão para aquecimento doméstico na China. Consumidores brasileiros e indianos ficaram em primeiro lugar no índice e americanos, em último.
Dias de cão
Compreensivelmente, o governo chinês não tem interesse em mostrar coisas que assustam os turistas. Além de limitar carros para controlar a poluição durante a Olimpíada, proibiu a venda de carne de cachorro, iguaria tradicional. A fumaça de automóveis, porém, deve sair de cena só durante os jogos.
Já os cães, por ironia, podem passar de vítimas a vilões. Estudo no "American Journal of Tropical Medicine and Hygiene" mostra que, na última década, os maiores estorvos para turistas foram doenças respiratórias e... mordidas de cachorro.
"Não ficamos surpresos com o fato de muitos viajantes precisarem de cuidados respiratórios durante a viagem", disse Phyllis Kozarsky, professor da Universidade Emory (EUA). "Mas estamos admirados com a quantidade de pacientes que foram a clínicas após a viagem com mordidas de animais --400 de cachorro, algumas de gato e macaco-- e precisavam de vacina para raiva."
(Por AFRA BALAZINA, Folha de S.Paulo, 04/08/2008)