O setor imobiliário vai ter que pensar melhor antes de derrubar uma árvore e levantar um prédio em São Paulo. Uma nova portaria da prefeitura torna obrigatória uma série de exigências sobre manejo de vegetação e compensação ambiental, na tentativa de preservar as áreas verdes remanescentes na cidade. A partir de agora, quem desrespeitar as regras e derrubar o que não deve também será enquadrado na lei de crimes ambientais.
A portaria 26/2008, da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, é a revisão rigorosa de portarias anteriores e avança em um ponto considerado crucial pelos técnicos: a obrigatoriedade de o empreendedor manter a mesma quantidade de árvores existentes no terreno que será edificado.
"Podemos dizer que São Paulo tem a legislação mais rigorosa do país", diz Eduardo Jorge, o secretário do Verde e do Meio Ambiente.
A idéia é fazer com que a cidade passe a não perder mais árvores às custas do boom imobiliário. O cenário perfeito, diz a secretaria, é não precisar arrancar nenhuma árvore. Quando isso não é possível, o órgão avalia as possibilidades de transplante, que agora têm de ser feitos no mesmo terreno. A prefeitura leva em consideração todas as árvores existentes - até as mortas.
Para elevar a taxa de sobrevivência das plantas, a portaria determina também um tamanho mínimo para as árvores plantadas como forma de compensar as que precisarem ser retiradas. Terão o que na linguagem técnica chama-se de DAP 5 - cinco centímetros de "diâmetro à altura do peito", o que representa algo como 2,5 metros de altura, dependendo da espécie.
"Precisávamos de regras claras para forçar o empreendedor a incluir a vegetação no planejamento", afirma Marcelo Cocco, diretor da Divisão Técnica de Proteção e Avaliação Ambiental. "É uma medida simples mas de impacto para a cidade". Quem desmatar além do permitido pela SVMA pagará multa de R$ 10 mil e será enquadrado na lei de crimes ambientais. "Estamos acabando com o conceito de só pagar pelo crime", diz Cocco.
Em vigor desde abril, a portaria já surte efeitos. O metrô Vila Prudente, parte da Linha 2, em construção em São Paulo, manterá 34 das 107 árvores existentes no local e transplantará as demais 73 para outros pontos do terreno. Além disso, a empresa acertou um termo de compensação ambiental que prevê a entrega de 434 mil mudas para viveiros municipais. Não fosse a portaria, o Metrô teria removido 100% das árvores, segundo o manejo solicitado à secretaria.
Outro caso em análise está em cima do número 2.100 da avenida Paulista, a maior área não edificada na região. Antiga propriedade da família Matarazzo, a área de 11.896 m2 foi adquirida pelo consórcio formado por Cyrela e Camargo Corrêa, que planeja construir um shopping center e 12 andares exclusivos para escritórios.
Quem passa, mal nota. Mas no terreno (hoje um estacionamento) há 154 árvores nativas, a maioria remanescentes da Mata Atlântica. "Elas terão de continuar lá, de um modo ou outro", diz o secretário.
Em uma recente apresentação pública do projeto à comunidade, o consórcio afirmou que irá além do que a portaria exige. O grupo ofereceu criar um mini-parque em 20% da área do terreno. "O parque será doado ao município", confirmou o paisagista Benedito Abude durante apresentação do modelo.
O Sindicato da Habitação (Secovi-SP) elogia as regras, mas reclama da burocracia que persiste. "Como paulistano, quero uma cidade boa para morar. Mas a prefeitura não está equipada para fazer valer a portaria", diz João Crestana, presidente do Secovi-SP. Sem citar nomes, ele diz que há "casos emblemáticos" que poderiam ter sido resolvidos em dias, mas levaram meses. "Já escutamos coisas como 'o técnico está em férias'. É essa pessoa que tem que dizer pra onde levar a árvore retirada. Aí tudo pára."
(Por Bettina Barros, Valor Online, 30/07/2008)