O órgão de pesquisas geológicas norte-americano, o US Geological Survey, divulgou um estudo que mostra que um quarto das reservas de petróleo e gás natural do mundo estão embaixo do Círculo Ártico. A constatação pode esquentar as disputas geopolíticas na frágil região polar e tornar a região a nova fronteira econômica de exploração petrolífera do mundo. E faz também com que o chamado Tratado da Antátida, aqui no sul, ganhe mais importância. Conversei, por email, com o glaciólogo Jefferson Simões, que é professor de Geografia Polar da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e membro do Comitê Nacional de Pesquisas Polares. Além de pesquisar sobre clima e outras questões geológicas na região, Jefferson pensa e discute há anos as questões geopolíticas dos continentes abaixo de zero. Veja como ele vê a questão dos combustíveis fósseis na região.
Já existe exploração de petróleo na região do Ártico?
Jefferson Simões - Sim, há mais de duas décadas a exploração de petróleo é realizada na Sibéria (pela Rússia) e no Alaska (inclusive no mar de Beufort). No caso do Alaska, são algumas das maiores reservas de petróleo dos Estados Unidos, sendo, inclusive, sua reserva estratégica. Com o rápido desaparecimento do mar congelado na costa ao norte Sibéria, associado com uma extensa plataforma continental, a região poderá se converter na nova fronteira de exploração de recursos petrolíferos. Outra área com potencial petrolífero é o arquipélago Ártico Canadense, onde já existem estudos, e o mar ao redor do arquipélago de Svalbard, pertencente à Noruega.
Quais as possíveis conseqüências políticas e ambientais dessa exploração?
Jefferson Simões - Politicamente, até o momento não nenhum impacto, pois a maioria das reservas está dentro do mar territorial ou na zona econômica exclusiva de cada país. Mas existe o potencial de se encontrar algumas reservas em partes do oceano Ártico onde não existe soberania nacional definida ou são chamadas de águas internacionais. Somente se petróleo for encontrado nestas áreas, teremos uma pesada negociação diplomática sobre o direito de exploração. Mas atenção, existem outros aspectos de conflito no Ártico. Um dos principais é a contenda entre o Canadá e os Estados Unidos sobre os canais entre as ilhas do arquipélago Ártico Canadense. Os canadenses consideram estes canais, ás vezes com poucos quilômetros de extensão, como área continental e de soberania canadense. Os norte-americanos consideram águas internacionais e de de navegação aberta. Existe também uma área geográfica na fronteira marítima entre Noruega e Rússia que ainda está sob litígio.
Na Antártida, há suspeitas de reservas de petróleo?
Jefferson Simões - Suspeitas sim, indícios indiretos. Mas ainda nada foi encontrado.
Há algum país pesquisando essas reservas no sul?
Jefferson Simões - É bom deixar claro, que não existe reserva de petróleo identificada na Antártica. O que existe é pesquisa básica geológica e geofísica que possiblitaria no futuro a identificação de reservas pretrolíferas. O conhecimento de reserva mineral implica identificar com precisão a área geográfica, características geológicas e determinar o volume dos recursos, no caso petrolífero, existente. Isto não foi feito na região antártica. Já a pesquisa geológica e geofísica básica, que ajudará na identificação de potenciais áreas para a busca de petróleo, a grande parte dos países antárticos está realizando.
O Tratado da Antártida ou Protocolo de Madrid preserva o continente da não exploração comercial. Na sua opinião, é possível perpetuar esse acordo?
Jefferson Simões - O Protolocolo de Madrid (como é conhecido o Protocolo de Proteção Ambiental para a Antártica) proíbe a exploração de recursos não renováveis até 2048. A preservação futura deste acordo dependerá de vários fatores na agenda internacional (preço do petróleo, pressão dos grupos ambientais, descobertas de novas reservas fora das regiões polares, novas tecnologias para geração de energia). O sistema do Tratado Antártico terá seu grande teste no momento que se encontrar uma reserva mineral economicamente explorável na região.
(Por Luís Indriunas, UOL, 25/07/2008)