A obra de transposição das águas do Rio São Francisco é tratada como tabu pelos governadores do Nordeste em suas reuniões para definir o modelo de desenvolvimento comum para a região. Apesar de ser a obra de infra-estrutura que mais atinge de forma direta a população nordestina, principalmente as pessoas que vivem no semi-árido, os governadores dos estados do Nordeste, reunidos na sexta-feira (25/07), em Teresina, no Piauí, evitaram o assunto.
Nem a presença Geddel Vieira Lima, ministro da Integração Nacional, pasta responsável por tocar a obra, tida como prioridade do governo federal, foi suficiente para vencer o bloqueio de se falar sobre o assunto. O próprio ministro, nascido na Bahia, que seria um doador de águas, já se colocou como um grande crítico da obra. No entanto, ao assumir a pasta disse que iria executar o projeto.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), usou de bom humor para responder aos questionamentos na presença de seus colegas: “Quanto à transposição, eu vou poupar Déda [Marcelo Déda, do PT, governador do Sergipe] de falar. Se ele falar, vai falar mal e eu não gostaria de fosse assim”, brincou Campos.
O tom de brincadeira logo se desfez quando Déda começou a falar, e ficou clara que a divergência é evidente entre os estados doadores de água – como Bahia e Sergipe -, e os receptores, como Pernambuco e demais estados da região do semi-árido.
“Nós temos tido durante todo esse período bastante juízo para não colocar na agenda desse fórum, temas que nos dividem, temas que possam prejudicar o melhor capital que nós formamos nesse um ano e seis meses de nossos mandatos: a nossa unidade em torno de uma agenda comum a favor do desenvolvimento econômico e social do Nordeste”, disse o governador de Sergipe, em entrevista coletiva, após o 8º Fórum de Governadores do Nordeste.
Déda classificou o tema de “desagregador” e, por isso, digno de ser evitado na reunião. “Todos têm as suas convicções, todos têm as suas críticas. Mas é preciso que nós nunca tenhamos envolvimento do fórum, nem a favor nem contra. Até porque, os que são a favor seria maioria. Em respeito à população de estados doadores, como a Bahia e Sergipe, nós resolvemos que esse tema aqui desagrega e não deveria ser prioridade”, disse Déda. “As posições de cada estado sobre a obra são muito conhecidas. Essa posição se mantém, mesmo com o governo executando a obra”, completou.
Campos e Déda, no entanto, garantem que as divergências influenciam no andamento do projeto. As obras compreendem a construção de canais, barragens, adutoras e estações de bombeamento, orçadas em R$ 3,3 bilhões.
O objetivo do governo é assegurar a oferta de água, em 2025, a cerca de 12 milhões de habitantes de pequenas, médias e grandes cidades da região semi-árida dos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Para isso, o governo defende a retirada contínua de 26,4 metros cúbicos de água por segundo, o equivalente a 1,4% da vazão garantida pela barragem de Sobradinho (1.850 metros cúbicos por segundo) no trecho do rio onde se dará a captação, de acordo com informações do projeto.
Este montante hídrico será destinado ao consumo da população urbana de 390 municípios do Agreste e do Sertão dos quatro estados do Nordeste Setentrional. As bacias que receberão a água do rio São Francisco são: Brígida, Terra Nova, Pajeú, Moxotó e Bacias do Agreste em Pernambuco; Jaguaribe e Metropolitanas no Ceará; Apodi e Piranhas-Açu no Rio Grande do Norte; Paraíba e Piranhas na Paraíba. Os estados de Sergipe e Bahia temem que com a transposição passem a ter problemas de abastecimento.
(Por Luciana Lima, Agência Brasil, 25/07/2008)