Luis Salomé de França, Eurival Carvalho Martins e Raimundo Benigno Moreira, dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Pará, foram condenados pela Justiça Federal de Marabá, no sul do estado, acusados de bloquear uma ferrovia pertencente à mineradora Vale.
O trio deve pagar, num prazo de quinze dias, R$ 5,2 milhões à Vale, responsável pela Estrada de Ferro Carajás. Na sentença, o juiz Carlos Henrique Borlido Haddad, de Marabá, aponta descumprimento de ordens judiciais que proibiam a interdição da ferrovia, bloqueada pelos integrantes do movimento em abril deste ano.
Para o advogado Fabio Konder Comparato, professor aposentado da Universidade de São Paulo, há a possibilidade de a decisão ser contra Constituição brasileira, por considerar o transporte de minério mais importante que uma manifestação para garantir um direito fundamental do ser humano.
“Eu não tenho conhecimento total do processo, mas se tiver acontecido o que parece, um confronto entre um movimento que luta pelo trabalho, que está garantido pela Constituição, contra um grupo que defende um direito ordinário, o de transportar minério”, diz Comparato. “Caso seja isso mesmo, a decisão é irremediavelmente inconstitucional, e reafirma que nosso sistema judiciário sobreleva a proteção de direitos financeiros e ordinários aos que são fundamentais.”
Na ocasião, cerca de 500 pessoas ocuparam parte da estrada de ferro, na altura do município de Parauapebas.
Segundo o advogado, outra falha do processo é personalizar três pessoas pela ação de centenas delas. “O MST não tem personalidade jurídica, não pode ser processado, e tentam culpabilizar três pela ação de todos. Trata-se de uma posição desigual entre as partes do processo.”
Na sentença, o juiz Haddad explica que França, Martins e Moreira “lideraram diversas pessoas na invasão da estrada de ferro (de Carajás) e, por essa razão, devem responder pela totalidade dos danos causados, como também arcar com a multa imposta caso a turbação (perturbação na posse, mas sem suprimi-la por completo) ocorresse”.
Konder Comparato afirma que, para condenar os sem-terra, é necessário provar que a Vale não cerceou o direito do movimento reinvidicar trabalho, e que os integrantes do MST provocaram danos ao direito da companhia mineradora, no caso de terem “simplesmente manifestado contrariedade à privatização fraudulenta de patrimônio nacional, do povo brasileiro.”
Em 2007, o MST fechou a ferrovia duas vezes e a interdição impediu o transporte de minério de ferro do Pará até o porto de Itaqui, no Maranhão. Em fevereiro de 2008, a Vale ingressou com ação de interdito proibitório e obteve a liminar. O mérito foi julgado agora com a condenação dos três dirigentes do movimento.
O juiz determina inclusive que os réus fiquem proibidos de participar de novas interdições da ferrovia e, em caso de desobediência, deverão pagar uma multa diária de 3 mil reais cada. O MST prepara recurso para evitar o pagamento.
(CartaCapital, 24/07/2008)