Arranha-céus, auto-estradas e lojas famosas - as novidades do mundo moderno chegam à China e se proliferam em tempo recorde, assim como os níveis de poluição. No país em que os direitos individuais muitas vezes são deixados de lado em nome do crescimento econômico, os operários migrantes das áreas rurais trabalham 24 horas por dia, sete dias por semana, nos canteiros de obras para deixar prontas as construções desenfreadas de prédios, pontes e estradas. As largas avenidas (ampliadas em 300 vezes nos últimos 20 anos) alimentam a vontade de se comprar carros e fazem da China o segundo maior mercado para indústria automotiva.
Como resultado dessa corrida para liderar o mundo, o país - que abriga 16 das 20 cidades mais poluídas do mundo - já alcançou os Estados Unidos em volume de emissão de dióxido de carbono e, em 2010, será oficialmente o maior emissor de CO2 do planeta. Toda essa realidade será, de certa forma, maquiada durante os Jogos Olímpicos de Pequim 2008. Com a ameaça de algumas provas de resistência ao ar livre serem suspensas em função da péssima qualidade do ar, o governo determinou ações para reduzir os índices de poluição na cidade olímpica.
No último domingo iniciou-se um rodízio nas ruas que deixará mais de um milhão e meio de automóveis sem circular até 20 de setembro. Com retirada de metade dos veículos das ruas de Pequim, as autoridades municipais esperam reduzir em 63% a emissão de poluentes.
A proibição de tráfego soma-se à outra, aplicada no início de julho, que retirou de circulação 300 mil veículos considerados altamente poluidores. Para compensar os trabalhadores que dependem de carro para ir ao trabalho, foram inauguradas três novas linhas de metrô e colocados em operação mais 1.500 ônibus que circularão por 34 linhas adicionais.
A medida não afetará a mobilidade de atletas, organizadores ou imprensa, já que os veículos olímpicos dispõem de uma via especial de 265 quilômetros ligando os estádios, a cidade olímpica e os hotéis.
O pó também será varrido da cidade. O governo determinou a paralisação de todas as obras da construção civil – o que também aliviará a poluição sonora. Além disso, mais de 150 empresas altamente poluentes (entre petroquímicas, fundições e de cimentos) precisarão reduzir ou interromper as atividades. A medida obrigará uma enorme massa de trabalhadores imigrantes a voltar para as províncias na área rural do país, o que servirá para disfarçar as diferenças sociais gritantes principalmente em Pequim.
O problema é que as iniciativas são temporárias. Ao final dos jogos, os operários do interior voltam a trabalhar nos canteiros de obras, os carros voltam a circular nas ruas e os níveis de poluição voltam a ser inaceitáveis.
O doutor em Geografia e Organização do Espaço, Hoyêdo Nunes Lins, acredita que transformar essas medidas em procedimentos de longo prazo implicaria em investimentos maciços, ou então na revisão do modelo de crescimento econômico chinês, calcado em produção industrial de trajetória vertiginosa.
“Não acredito que o governo esteja disposto a rever o modelo, que tem outorgado à China a proeminência que se conhece. Assim, restam os investimentos...”, entende Lins, e acrescenta: “Os primeiros movimentos após as Olimpíadas serão indicadores do que o governo chinês realmente pensa sobre a problemática ambiental”. Resta ao mundo esperar e torcer para que consciência olímpica incentive uma mudança de atitude mais consistente.
(Por Sabrina Domingos, Carbono Brasil, Envolverde, 22/07/2008)