Pesquisas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, realizadas com amostras de emissões veiculares colhidas em túneis da cidade de São Paulo, confirmaram que as substâncias destas emissões são as maiores responsáveis pelo excesso de ozônio registrado na Região Metropolitana de São Paulo. Os estudos mostraram também que a gasolina utilizada no Brasil é ainda mais nociva neste aspecto do que as gasolinas mais limpas (como a utilizada no estado da Califórnia nos Estados Unidos) e o etanol.
Estudos mostram que uma alta taxa de ozônio nas camadas baixas da atmosfera (troposfera) causa ou agrava doenças respiratórias e alérgicas como rinite, otite, amidalite, sinusite bronquite, e pneumonia. O nível considerado seguro pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) é de 160 microgramas do gás por metro cúbico (m3) de ar, por uma hora de amostragem. Na cidade de São Paulo, medições feitas em 2004 chegaram a indicar mais de 200 microgramas/m3 de ar, que é o nível de atenção sugerido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para avaliar qual o grau de responsabilidade dos gases emitidos pelos veículos na formação do ozônio, a química Leila Droprinchinski Martins realizou, em parceria com pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Instituto de Química (IQ) da USP, coletas de ar nos túneis Jânio Quadros e Maria Maluf, em diferentes períodos do ano de 2004. “Os túneis foram escolhidos por serem locais fechados, onde era maior a probabilidade de que os gases encontrados viessem das emissões veiculares. E diferentes estações no ano foram pesquisadas porque a reação de formação do ozônio é intensificada pela maior presença da radiação solar”, explica a pesquisadora.
Modelo matemático
As amostras eram levadas ao laboratório, onde passavam pela cromatografia (técnica de separação de misturas), para que os gases presentes fossem identificados. Foram encontrados quase 40 compostos diferentes. Em um modelo matemático sistematizado num programa de computador, a pesquisadora inseriu as informações coletadas, dados de análise de combustíveis feitos em estudos anteriores, informações da literatura sobre emissão evaporativa (gases emitidos pela evaporação natural dos combustíveis, sem necessidade de combustão), informações da Cetesb e dados meteorológicos do período em que foram colhidas as amostras.
Os resultados encontrados para a formação de ozônio na troposfera ficaram bem próximos aos mostrados pela medição de ozônio feita pela Cetesb naqueles dias, mostrando que o modelo matemático escolhido era válido para realizar este tipo de estimativa.
Validado o modelo, a pesquisadora então passou a utilizá-lo para testar como quantidades diferentes de cada uma das substâncias encontradas nos túneis influenciava na formação do gás tóxico. Foram identificadas, dentre as estudadas, as classes e as espécies principais de compostos orgânicos voláteis (COV) — que em temperatura ambiente se apresentam na forma gasosa — com maior potencial para formar ozônio, que foram os aromáticos, as olefinas, o eteno e o formaldeído, todos eles emitidos pela queima de combustível, confirmando que as emissões veiculares são responsáveis por cerca de 90% da formação do ozônio troposférico.
Além de diagnosticar os gases mais propícios à formação de ozônio, em uma etapa posterior Leila usou o modelo matemático para testar diferentes cenários, considerando, por exemplo, que em vez da gasolina utilizada no Brasil, toda a frota de veículos leves (não movidos a diesel) de São Paulo adotasse a gasolina refinada na Califórnia, Estados Unidos – denominada de “gasolina limpa” por conter menor quantidade de compostos aromáticos e olefinas. Comparado ao uso da gasolina comum, o uso da gasolina limpa resultaria numa redução de cerca de 43% da formação de ozônio, quase a mesma redução obtida caso toda frota de veículos leves fosse abastecida somente com etanol.
Entretanto, a cientista ressalva que “mesmo a gasolina limpa emite uma série de outros poluentes, como o monóxido de carbono, sendo no geral mais poluente do que o etanol. Nosso estudo considerou apenas a influência de combustíveis de diferentes composições na formação do ozônio”.
Mais informações: Leila Droprinchinski Martins, e-mail leiladro@model.iag.usp.br. Pesquisa orientada pela professora Maria de Fátima Andrade.
(Por Luiza Caires, Agência USP, 22/07/2008)