“Samba, futebol e... genômica”. Assim o jornal britânico The Economist abriu reportagem sobre o mapeamento brasileiro do genoma da Xyllella fastidiosa em 2000, anunciando que o país seria reconhecido também pela sua ciência de ponta.
De lá para cá, o Brasil caiu de terceiro para o oitavo lugar em número de pesquisas de mapeamento genômico. Mas isso não quer dizer que o trabalho foi reduzido, pelo contrário, aumentou, e muito. “A oitava colocação ainda é um lugar de honra e estamos na frente de muitas nações industrializadas”, disse a bióloga Ana Tereza Vasconcelos, coordenadora do Laboratório de Bioinformática do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), em Petrópolis (RJ).
Na 60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), na semana passada em Campinas, a pesquisadora apresentou um panorama das pesquisas de mapeamento genético e os desafios a serem enfrentados nessa área.
“O maior gargalo na pesquisa não está mais em equipamentos, custos ou tempo, mas na falta de recursos humanos especializados”, destacou. Segundo ela, esse não é um problema exclusivo do Brasil. O mundo inteiro está sofrendo a falta de pessoal que saiba, por exemplo, criar algoritmos para trabalhar com dados genômicos.
Não é para menos. O volume de informação da área tem crescido exponencialmente desde 1995, quando pela primeira vez o genoma de um organismo vivo, a bactéria Haemophillus influenzae, foi completamente mapeado.
Segundo Ana Teresa, o avanço da genômica se deve muito ao advento da internet, que levou laboratórios espalhados pelo planeta a trocar informações e dividir o trabalho de identificação dos genes. Com o tempo, novos softwares e técnicas de mapeamento permitiram reduzir o tempo das pesquisas e o seu custo.
Para se ter uma idéia, o primeiro genoma humano mapeado levou 15 anos para ficar pronto e custou US$ 3 bilhões. O mais recente precisou de apenas dois meses de trabalho a um custo total de US$ 900 mil. No mundo todo, 827 genomas já foram completamente seqüenciados, e esse número tem crescido rapidamente.
O genoma humano é particularmente importante para a medicina. “Nosso genoma é como se fosse o manual de instruções”, comparou Ana Tereza. O projeto The Cancer Genoma Atlas (TCGA) do LNCC, por exemplo, acompanha 106 pacientes e já conseguiu identificar novas regiões do genoma que podem estar associadas a um tipo de câncer.
Medicina translacional
Ana Teresa acredita que, em breve, redes de computadores poderão processar dados clínicos desde o consultório médico, associá-los a informações de artigos relacionados ao problema e sugerir soluções. O procedimento faria parte de uma nova área do conhecimento batizada de medicina translacional.
O mapeamento genético ainda envolve o genoma das bactérias causadoras de doenças, o que abre alternativas de novos tratamentos, e até de vetores de patologias, como o do mosquito da malária, Aenopheles darlingi, um dos projetos em andamento coordenado pelo LNCC.
Ao todo, 25 laboratórios brasileiros formam uma rede de pesquisas de mapeamento genético, centralizada no LNCC. Essa rede também auxilia no estudo da biodiversidade e em soluções para a agropecuária brasileira.
O Brasil também tem se destacado no desenvolvimento de ferramentas para a bioinformática, como o software Sabiá, utilizado por instituições nacionais e estrangeiras para mapear genes. Mas, segundo Ana Tereza, serão precisos muitos mais craques da bioinformática para manter a fama internacional para além do samba e do futebol.
(Por Fábio Reynol, Agência Fapesp, 21/07/2008)