Uma fase de mudanças surge para a Refinaria Ipiranga, em Rio Grande. O presidente do conselho de administração da companhia, o engenheiro químico gaúcho João Adolfo Oderich, adiantou, em entrevista para o Jornal do Comércio, que a meta é transformar a empresa em uma butique de derivados de petróleo, o que incluiria atuação em nichos específicos de produtos, com viabilidade para uma produção em escala menor. O conceito define o nicho que deve ser aposta da companhia para assegurar um lugar no concorrido e nervoso mercado de combustíveis e demais produtos obtidos do petróleo e que enfrenta sobressaltos com a cotação em alta. Oderich, que é gerente-geral da Refinaria Getúlio Vargas (Repar), com sede em Araucária, no Paraná, foi o mensageiro da notícia, dada na segunda-feira passada aos funcionários, de que a engenheira química Margareth Feijó Brunnet assumirá a superintendência da empresa em agosto. O executivo, que foi colega de Margareth na Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), nos anos 1980, descreve a forma do comunicado, ocorrido em reunião em Rio Grande, como uma conversa olho no olho. "Queria reduzir o grau de incerteza e ansiedade, natural quando uma empresa enfrenta prejuízo".
Jornal do Comércio - Quando começa a transição?
João Adolfo Oderich - Começa nesta sexta, no workshop que teremos em Porto Alegre, com as áreas comercial e tributária da Refap, Petrobras, Ipiranga e Transpetro. Queremos buscar melhor eficiência de oportunidades, maior sinergia. A Margareth Feijó Brunnet deve participar. Ela já começa a fazer a transição com a Elizabeth Tellechea neste encontro. Com a volatilidade atual dos preços do petróleo, precisamos otimizar ao máximo todas as relações. Teremos mais informações nos próximos dias, quando será definido um cronograma.
JC - Como o senhor descreve a atuação de Elizabeth Tellechea, que pretendia sair em abril da superintendência e aguardou até a definição do nome?
Oderich - Os grupos Braskem, Ultra e Petrobras a convidaram para ficar um ano. Com a crise de petróleo, ela teve uma atuação desmedida no sentido de buscar saídas e melhores condições para reduzir impacto dos preços. Foi uma pessoa que se esforçou de maneira ímpar. A Elizabeth é uma guerreira.
JC - Como está a operação da refinaria?
Oderich - Trabalhamos até setembro de 2007 com barril em torno de US$ 70, com bom resultado, com desempenho positivo mês a mês. A partir daí, houve a guinada, com disparada de preços. Passamos a buscar alternativas. Montamos um grupo de trabalho no sentido de testar novas matérias-primas, novo perfil de produção, apostando na nafta petroquímica e em produtos com preço internacional. Achamos caminhos interessantes. Quando o barril passou a US$ 120 foi dramático. Fechamos 2007 com lucro. Entramos em 2008 em uma situação bastante desfavorável de preços.
JC - Em que momento vocês definiram que a pessoa para o lugar da Elizabeth era a Margareth?
Oderich - Vínhamos avaliando nomes há alguns meses. Refino tem de ter expertise da Petrobras, então a probabilidade era grande de achar alguém na companhia. Mas a empresa não é detentora sozinha da Ipiranga. São três sócios. Surgiu o nome da Margareth, que conhece refino e petroquímica. Foi sondada e aceitou voltar a morar no Estado. Pesou muito o perfil profissional.
JC - A Elizabeth Tellechea vinha alertando que a situação era complicada.
Oderich - Além de reuniões mensais do conselho, passamos a ter contatos semanais. Ficamos apagando incêndio. Enfrentando a cada semana uma crise. A cada mês buscando a melhor alternativa para adquirir matérias-primas. A Elizabeth nos mantinha em alerta. Mas o mundo inteiro está enfrentando dificuldades na área de refino.
JC - Muda alguma coisa nos preços da Petrobras praticados com a Ipiranga?
Oderich - Não haverá mudança. O tratamento é de empresa para empresa. O preço é internacional.
JC - O senhor prometeu boas notícias na reunião com os funcionários em Rio Grande. O que vai acontecer com a Ipiranga daqui para frente?
Oderich - Estamos desenhando alternativas. Queremos transformar a refinaria em uma butique com nichos específicos de produtos, entre as possibilidades estão asfalto, solventes especiais, combustível para navio (bunker) e diesel, além de nafta. Somos importadores de diesel. Não tem sentido direcionar a produção do derivado em outra estrutura do País. Podemos utilizar a Ipiranga.
JC - Diria que diesel e nafta seriam os dois focos principais da refinaria?
Oderich - É nessa direção. Não posso precipitar desenho de algo que está em construção. Mas existe uma certeza que colocamos, olho no olho para as pessoas, para reduzir o grau de incerteza e ansiedade, natural quando a empresa enfrenta prejuízo. Confirmei o compromisso do acordo pela continuidade (firmado em 2007 após a aquisição da empresa) e que nós estamos trabalhando e construindo solução para sair desse momento.
JC - Quando sairá esse plano?
Oderich - Estamos correndo atrás. Passa por uma sinergia que se pretende buscar com a Petrobras e Refap. Os grupos de trabalho sempre trabalharam sintonizados com a Ipiranga e demais empresas. Temos compromisso com o abastecimento e a busca de uma solução robusta. Nosso foco é nafta petroquímica e o mercado em torno de Rio Grande, que representa 7% a 8% do mercado gaúcho. A logística dá uma condição adequada.
Reunião marca o começo da transição
A Refinaria Ipiranga, a mais antiga do Brasil e que foi inaugurada por Getúlio Vargas em 1937, busca a sobrevivência. Nesta sexta-feira, em Porto Alegre, será dada a largada para a difícil operação de tornar a companhia, com sede em Rio Grande e considerada a 11ª empresa em faturamento no Estado, viável. Uma reunião entre as áreas comercial e tributária da Ipiranga, Petrobras, Refinaria Alberto Pasqualini (Refap) e Transpetro objetiva gerar maior sinergia e otimização de processos. A futura superintendente da refinaria, Margareth Feijó Brunnet, que teve seu nome anunciado no começo da semana, participará do encontro, ao lado da atual ocupante do posto, Elizabeth Tellechea.
O presidente do conselho de administração da Ipiranga, João Adolfo Oderich, afirma que o encontro marca o processo de transição para a troca de comando. Margareth, que tem passagem pela Refap, de Canoas, e pelo setor petroquímico, assume o comando da operação em agosto. Desde abril de 2007, quando foi vendido o grupo Ipiranga, a refinaria rio-grandina pertence ao trio Petrobras, Braskem e Ultra, cada uma delas com a mesma participação societária (33%).
Nas próximas semanas, Oderich adianta que será definido o perfil de produtos que será aposta da companhia para assegurar a recuperação do negócio. O desempenho da empresa enfrenta sobressaltos desde o último trimestre de 2007. Uma das regras a ser quebrada para garantir a alavancagem da empresa é a de que refinarias com pequena escala de produção são cada vez mais raras hoje no mundo. A Ipiranga, com capacidade para processar 17 mil barris diários de petróleo (hoje processa 9 mil barris diários), está neste perfil. O que reforça, segundo Oderich, a tendência de especializar a planta em linhas especiais de derivados de petróleo, da nafta petroquímica, bunker (combustível para navios), asfalto e solventes especiais.
Oderich projeta para a próxima semana a divulgação dos planos futuros da empresa. A direção já tem alternativas para ocupar a planta, que tem três unidades. A disparada dos preços do petróleo provocou inversão de desempenho da indústria desde setembro de 2007. A Ipiranga fechou 2007 com resultado positivo de R$ 2,78 milhões. Mas os prejuízos foram inevitáveis no primeiro semestre deste ano, somando R$ 13,7 milhões. A atual superintendente adianta que o semestre deve confirmar resultado negativo. "Trabalhamos desde maio para evitar perda maior. Testes de produtos para identificar alternativas viáveis também contribuíram para esse resultado", Elizabeth garante que as opções futuras já estão mapeadas.
O cenário deve contar com produção de nafta petroquímica, que abastece a Copesul, no Pólo de Triunfo, combustível para navios (bunker) e diesel, este último deficitário na conta-petróleo brasileira. Conforme Oderich, a Refinaria Ipiranga poderia operar para ampliar a produção do produto. O executivo destacou ainda o diferencial da logística de Rio Grande, decisiva na operação em mercados globais. Também apontou a manutenção da redução de ICMS da nafta entregue à Copesul como fundamental para a sobrevivência da operação.
Elizabeth citou que o benefício, que rebaixou a alíquota para 12%, resultou em R$ 39 milhões em arrecadação entre outubro de 2006 e maio deste ano para os cofres do Estado. Com faturamento de R$ 1,1 bilhão ano passado, a companhia utiliza hoje duas das três unidades. A outra, de craqueamento catalítico, está momentaneamente desativada. Uma carga de 13 mil metros cúbicos de recon rio (petróleo recondicionado) para produção de bunker (combustível de navio) chegou na terça-feira passada em Rio Grande. Na semana que vem, desembarcam 20 mil metros cúbicos de outras naftas, que serão direcionadas ao pólo de Triunfo. A Ipiranga responde hoje por 5% da nafta usada pela Copesul. Elizabeth explica que a operação está assegurada até agosto.
(Por Patrícia Comunello, Jornal do Comércio, 18/07/2008)