Eles ficaram sentados em silêncio durante duas palestras, mas não conseguiam mais controlar sua raiva. Os funcionários do Ministério do Meio Ambiente, da Agência Ambiental e da Autoridade de Comércio de Emissões da Alemanha faziam parecer fácil para a indústria a adoção do comércio de carbono. Foi demais para os empresários tolerarem.
"Se esta é a forma que o comércio terá, nós simplesmente transferiremos nossa operação de cimento para a Ucrânia", berrou um executivo de uma fábrica de cimento no salão da palestra. "Então não haverá nenhum comércio aqui, nada mais será produzido aqui - as luzes simplesmente vão ser apagadas aqui."
A raiva dos empresários surpreendeu os especialistas em permissões de emissões. Eles convidaram representantes da indústria para um fórum informal no prédio do Ministério do Meio Ambiente, em Bonn. Eles queriam apresentar os novos desenvolvimentos internacionais no mercado de comércio de carbono. Mas o clima no meio empresarial alemão azedou - os empresários não têm mais estômago para palestras acadêmicas. O motivo é que as permissões de emissões já estão se tornando um fardo para algumas empresas que necessitam de muita energia para fins produtivos.
Apenas nos últimos 12 meses, o preço pelo direito de emitir uma tonelada de carbono na atmosfera saltou de 23 euros para quase 30 euros, segundo a Bolsa Européia de Energia, em Leipzig. Este aumento de cerca de 30% tem um efeito direto sobre a produção de eletricidade das companhias de força.
Segundo cálculos da Point Carbon - uma empresa norueguesa especializada em análise de eletricidade, gás e mercados de carbono - esta alta do preço elevaria o custo marginal da energia de uma velha usina de força a carvão no custo integral do carbono. Para as usinas modernas a gás natural, ela aumentaria os preços em um terço. A empresa de energia RWE, com sede na cidade alemã de Essen, reconhece que terá que pagar sozinha 9 bilhões de euros por sua própria produção de eletricidade, que, é claro, serão repassados na forma de contas mais altas de eletricidade. Assim, o comércio de carbono terá um impacto direto em que países as empresas optarão em se estabelecer.
"Se a indústria do cimento for gradualmente arrastada ao comércio de permissões de emissões de carbono, as empresas transferirão sua produção para países que não participam do esquema", alertou Andreas Kern, presidente da Federação da Indústria do Cimento Alemã.
Milhares de empregos em risco
Ainda assim, as medidas realmente duras do sistema europeu de comércio de emissões ainda não entraram em vigor. Apenas em 2013 - o início do terceiro período de comércio - é que os preços realmente subirão.
Segundo os planos da Comissão Européia, cada empresa européia então terá de adquirir permissões de poluição de uma espécie de bolsa de valores. Até o momento as permissões foram entregues gratuitamente, ou em grande parte gratuitamente. Nos próximos meses, o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu supostamente darão sua bênção aos planos da Comissão. E então a pressão da mudança para o exterior provavelmente aumentará para as empresas alemãs afetadas.
"A indústria do cimento também está enfrentando aumentos de cerca de 900 milhões de euros a partir de 2013", disse Kern. "Isto representa cerca de metade de nossa atual receita anual." Sem causar surpresa, o Ministério das Finanças alemão agora está estudando se alguns setores devem continuar recebendo as permissões de emissões gratuitamente, como tomou conhecimento a "Manager Magazin Online".
Segundo cálculos do Escritório Federal de Estatística e do Instituto para Ecologia Aplicada, várias outras empresas alemãs de setores industriais além da indústria do cimento transferirão para outros países pelo menos parte de suas operações devido ao novo sistema de comércio de carbono - ou por causa do custo crescente das permissões ou devido aos preços mais altos da eletricidade.
"Na Alemanha, a indústria de insumos químicos, empresas do setor de ferro e aço, produtores de cal, alumínio e refinarias poderiam ser afetadas", disse Franzjosef Schafhausen, o subsecretário do meio ambiente, na conferência em Bonn. Felix Matthes, coordenador de energia e proteção do clima no Instituto para Ecologia Aplicada, acrescentou: "O preço do CO2 sinaliza mudanças na produção e investimento. Mas ainda não leva a uma redução geral das emissões, à medida que a produção e investimento nos novos endereços das empresas não estarão sujeitos aos preços do CO2, seja agora ou no futuro próximo".
Milhares de empregos alemães não correrão risco, é claro, se um número suficiente de países ingressarem no sistema europeu de comércio de carbono. Mas no momento há apenas um vencedor: o estado alemão. O ministro das Finanças da Alemanha, Peer Steinbrück, espera uma receita de impostos com o programa de proteção do clima que ultrapassará em muito as estimativas do início do ano.
Até o final de junho, segundo o ministério das Finanças, o programa adicionou 525 milhões de euros aos cofres do Estado; na segunda metade do ano, poderá arrecadar 900 milhões de euros - mais do que o previsto. Mas esta soma não cobriria uma fração da perda em impostos com os milhares de empregos perdidos que podem resultar do sistema de comércio de carbono. Este artigo apareceu originalmente na "Manager Magazin Online".
(Por Karsten Stumm, Der Spiegel, tradução de George El Khouri Andolfato, UOL, 18/07/2008)