Em entrevista ao site Eco-finanças, Norbert Suchanek, da ONG alemã Salve a Selva, conta sobre a ação de protesto que a organização desenvolve contra o Deutsche Bank, maior banco da Alemanha, por financiar empresas que causam alto impacto ambiental no Brasil.
Qualquer instituição que financia empresas que causam impactos ambientais deve ser responsabilizada pelos impactos. Essa é a opinião Norbert Suchanek, correspondente no da ONG alemã Rettet den Regenwald (Salve a Selva) no Brasil e que desenvolve uma ação de protesto contra o Deutsche Bank, o maior banco da Alemanha, por financiar empresas que causam alto impacto socioambiental no Brasil.
"Nós, alemães, temos uma responsabilidade para os crimes ambientais que este banco está financiando", diz Suchanek. "Com os seus serviços, como créditos, o Deutsche Bank ajuda as grandes empresas internacionais no Brasil. Mas estas empresas destruíram o cerrado e ameaçam as vidas de milhares de indígenas, ribeirinhos e pequenos agricultores não só no Brasil, mas também nos países vizinhos, como Paraguai e Bolívia", explica.
O protesto contra o banco alemão é uma forma de pressionar a instituição financeira a não investir em empresas que destroem o meio ambiente. Para tanto, a organização conta com o apoio dos cidadãos. "Cidadãos têm um grande poder: a sua opinião e a sua decisão de escolha. Também o poderoso Deutsche Bank precisa de clientes", explica. Para participar da ação da ONG, o interessado deve acessar o site da organização.
Suchanek falou com o Eco-finanças sobre a produção de biocombustíveis e sobre o consumo dos países europeus de produtos provenientes de desmatamento na Amazônia. Veja a entrevista.
O que é a organização "Salve a Selva" e como ela funciona? Qual a atuação dela no Brasil?A Ong Rettet den Regenwald (em português Salve a Selva) foi criada exatamente 20 anos atrás pelo ambientalista Reinhard Behrend. Foi uma época na Alemanha com muita consciênca e luta contra a destruição das florestas tropicais e várias ONG foram criadas. Esta época nós lutamos também junto com os povos indígenas no Brasil contra as Hidroelétricas do Rio Xingu. Até hoje Reinhard é o presidente da ONG, que desde 1988 apoia os defensores das florestas tropicais. Por exemplo, apoiamos os indígenas de Sarayacu, ao sul do Amazonas equatoriano, que se defendem a duras penas contra a exploração petrolífera em seu território ancestral. Ou os pigmeus na África Central, cujo lar está sendo destruído pelas empresas madeireiras, entre elas empresas alemãs.
Desde maio de 2008 nós temos também um website em português para melhorar a luta contra a destruição dos ecossistemas no Brasil e em outros países tropicais de língua portuguesa. O cerrado, a caatinga, o pampa, a mata amazônica e os indígenas e os povos tradicionais destas regiões vivem hoje uma situação muito perigosa, por causa do PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] do Governo Lula e por causa do boom dos biocombustíveis financiado pelos investidores internacionais. Etanol à base de cana de açúcar e com investimentos da companhia Odebrecht ameaça infelizmente também o ambiente e os povos indígenas de Angola, por exemplo.
Por que a organização desenvolve uma ação de protesto contra o Deutsche Bank? O Deutsche Bank financia o desmatamento no Brasil?Simplesmente porque o Deutsche Bank é o maior banco alemão e nós, alemães, temos uma responsabilidade para os crimes ambientais que este banco está financiando. Com os seus serviços, como créditos, o Deutsche Bank ajuda as grandes empresas internacionais no Brasil, como ADM, Bunge, Cargill, Agrenco, Brasil Ecodiesel ou Cosan. Mas estas empresas, especialmente ADM, Bunge e Cargill, destruiram, junto com os produtores de soja, o cerrado, e ameaçam as vidas de milhares de indígenas, ribeirinhos e pequenos agricultores não só no Brasil, mas também nos países vizinhos, como Paraguai e Bolívia. Mas nós não podemos falar que o Deutsche Bank financia o desmatamento direitamente, porque o sistema de destruição é mais complexo.
Como funciona essa ação?Cidadãos têm um grande poder: a sua opinião e a sua decisão de escolha. Também o poderoso Deutsche Bank precisa de clientes. Por isso, uma imprensa vital e cartas de protestos dos nossos colaboradores criam uma pressão contra estas empresas. E já várias vezes as empresas ou governos acabaram os seus projetos desastrosos por causa destes protestos nacionais e internacionais.
Segundo o site da organização, o banco financia empresas de etanol e biodiesel. Existe, no entanto, muita controvérsia entre os especialistas, uns defendendo os biocombustíveis, outros não. Qual é a posição da organização e por quê?Na realidade, não existe uma controvérsia entre os cientistas ou especialistas. Só existe uma controvérsia entre os lobistas financiados pelas grandes empresas de automóveis, de energia e do agronegócio e entre os defensores dos povos tradicionais, dos povos indígenas e de um outro modelo de vida sustentável. Não existe nenhuma dúvida de que a produção de agrocombustíveis ameaça os ecossistemas e os pequenos produtores e vai aumentar os preços dos alimentos e o desmatamento nos países tropicais. Já o ex-secretário do meio ambiente do Brasil, José Lutzenberger, criticou com muita clareza a produção de etanol há mais de 20 anos. Biocombustíveis só ajudam o grande agronegócio e as empresas de automóveis e não tem nenhuma capacidade para combater o aquecimento global. A fala da "energia limpa" é simplesmente a grande mentira do nosso século 21.
A Europa é muito questionada por financiar e adquirir produtos do agronegócio. O continente é mesmo consumidor de produtos provenientes de desmatamento no Brasil?A Europa é a maior importadora destes produtos ou matérias-primas que são direita ou indiretamente responsáveis pela destruição dos biomas como Cerrado, Caatinga, Restinga, Mata Atlântica e Mata Amazônica. Estes produtos são especialmente: soja, etanol, carne da Amazônia, aço, alumínio e celulose. Todo mundo que fala sobre biocombustíveis precisa também pensar que estes biocombustíveis são produzidos para continuar com a produção e venda de carros. E a produção de carros é responsável pelos os grandes desastres ecológicos no Brasil. O Brasil tem barragens e mineração de bauxita na Amazônia para produção de alumínio para exportar para a indústria de automóveis. O Brasil tem mineração de ferro e produção de aço na Amazônia, em Minas Gerais, Bahia e no Ceará para exportação para a indústria de automóveis, que é responsável pelos grandes desmatamentos na Caatinga, no Cerrado e na Amazônia por causa do uso do carvão vegetal. E a plantação de eucalipto para carvão é outro crime ambiental e social, por isso eles têm aqui no Brasil o nome de "deserto verde".
Na opinião de vocês, os bancos devem ser responsabilizados por impactos ambientais causados pelas empresas que financiam?Sinceramente, qualquer pessoa, qualquer instituição que investir ou financiar projetos ou empresas, está responsável para os atos destes projetos ou empresas. Nossa nova ação é contra a empresa alemã ThyssenKrupp que está junto com Vale [Companhia Vale do Rio Doce] construindo uma mega-siderúrgica e um porto de exportação de aço. Esse complexo siderúrgico, com o nome de Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), está destruindo a vida na Baía de Sepetiba. Como nós somos alemães, nós não podemos deixar nossas empresas destruirem ecossistemas, vidas e o futuro dos povos dos outros países. Vamos lutar juntos para viver bem, sem sofrimento e sem destruição ambiental neste planeta.
Norbert Suchanek é correspondente no Rio de Janeiro e faz para a ONG Rettet den Regenwald (Salve a Selva) a comunicação com os países de língua portuguesa.
(Eco-Finanças,
Amazonia.org.br, 16/07/2008)