O Brasil não conseguirá enfrentar a devastação da Amazônia sem a consolidação de uma política agropecuária que limite a expansão da produção sobre a floresta, de acordo com o climatologista e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Carlos Nobre.
Nobre defendeu ontem (15) durante a 60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) que, com a atual área alterada para agricultura e pecuária no Brasil, “é perfeitamente possível” que o país alcance lugar entre os três maiores produtores agrícolas do mundo.
“A questão está em como desenhar esse futuro agrícola. Os ministros da agricultura têm uma frase padrão: ‘não é preciso cortar uma única arvore da Amazônia’, mas essas frases têm sido muito vazias, porque elas não têm sido acompanhadas de uma política agrícola, que realmente coloque limites a essa expansão em cima dos ecossistemas ainda naturais, principalmente o Cerrado e a Amazônia”, criticou Nobre.
Na avaliação de Nobre, sem uma política que freie essa expansão e sem modernização do agronegócio brasileiro, “os números de desmatamento não vão cair; dificilmente cairão muito abaixo desses números que nós temos visto, entre 10 e 15 mil quilômetros quadrados”.
O climatologista, que é membro do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês) lembrou que grande parte da contribuição brasileira para o aquecimento global vem do desmatamento – cerca de 75% das emissões de dióxido de carbono (CO2) do país estão relacionadas com a destruição de florestas.
“Na China, a maior parte das emissões de carbono está relacionada à energia, que tem a ver com Produto Interno Bruto. No Brasil não é assim, a Amazônia só é responsável por 0,5% do PIB brasileiro e concentra as maiores emissões. Essa é a grande tragédia brasileira: nem as emissões alimentam o crescimento econômico das populações”, avaliou, em apresentação sobre impactos das mudanças climáticas para o Brasil.
Segundo o pesquisador, o país não pode copiar padrões europeu e norte-americano de consumo e terá “que inventar” um novo modelo de crescimento, que utilize a biodiversidade e os recursos naturais renováveis de forma racional para alavancar o desenvolvimento econômico.
“Ainda não conseguimos atingir um equilíbrio nas políticas públicas, em especial em âmbito federal. Ainda há muitos resquícios do desenvolvimentismo da era militar; há pouca percepção de que outra trajetória [sustentável] é possível", concluiu Carlos Nobre..
(
Agência Brasil, 15/07/2008)