O Brasil, mais uma vez, perdeu uma grande oportunidade de liderar a discussão mundial sobre desenvolvimento sustentável. Em vez de aproveitar a reunião do G8 no Japão para pressionar os países desenvolvidos a adotarem metas de redução de emissões de CO2, preferiu colocar em pauta o desbloqueio das negociaçõesda Rodada de Doha, de liberalização do comércio global. O chamado G5 (Brasil, China, Índia, África do Sul e México) teve um encontro nesta quarta-feira com os líderes do G8.
"Mais uma vez a agenda econômica atropelou a ambiental. A preocupação com a crise alimentar, que sustenta o argumento de levar a Rodada de Doha para o G8, acabou sendo uma desculpa para o governo brasileiro priorizar suas ações desenvolvimentistas, sem um planejamento estratégico de longo prazo", afirmou Luis Piva, coordenador da campanha de Clima do Greenpeace Brasil.
O G5, grupo formado pelo Brasil, Índia, China, México e África do Sul, reconheceu que o compromisso assumido pelo G8 em reduzir suas emissões em 50% no ano de 2050 é insuficiente e que esses países também têm que fazer sua lição de casa, mas a declaração é vaga e não diz qual sua contribuição real para combater o aquecimento global. No caso do Brasil, a prioridade é zerar o desmatamento. Assim como no ano passado, as discussões do G8 sobre o futuro do planeta terminaram com conclusões evasivas e com um compromisso vazio, criticado inclusive pelo presidente do IPCC, Rajendra Pachauri.
As medidas de combate às mudanças climáticas, assunto principal do encontro do G8, ficaram no nível do discurso. "Foram três dias desperdiçados. Os líderes do G8 não propuseram nada novo em relação à crise alimentar, deram a resposta errada à alta dos preços do petróleo e adiaram as medidas de combate às mudanças climáticas", resumiu Daniel Mittler, consultor político do Greenpeace que acompanhou as reuniões no Japão.
A intransigência dos presidentes dos Estados Unidos, Canadá e Japão impediu a definição de metas de redução da emissão dos gases de efeito estufa para 2020. Um acordo do G8 seria fundamental para o avanço das negociações do segundo período de compromisso do Protocolo de Kyoto que deverá ser concluído em Copenhague (Dinamarca), em 2009. O fato é que a falta de um compromisso do G8 desestimula o G5 a ser mais ambicioso.
Agenda nuclearAlém de orquestrar o imbróglio de postergar as medidas de redução das emissões para 2050, o presidente George Bush, juntamente com os primeiros ministros Silvio Berlusconi (Itália) e Gordon Brown (Reino Unido), aproveitou a reunião do G8 para fazer lobby a favor da energia nuclear.
"A energia nuclear é cara e perigosa porque é obtida a partir de reatores que produzem resíduos letais. Dizer que a energia nuclear vai contribuir no combate às mudanças do clima é uma afirmação absurda e perigosa", avalia Piva. "O Greenpeace defende uma revolução energética baseada em energias renováveis e eficiência energética para combater as mudanças climáticas e garantir a segurança energética."
Crise AlimentarOs líderes do G8 também insistiram na política equivocada baseada na agricultura industrial que levou o mundo a crise global alimentar. "É espantoso ver como, mesmo em face dos astronômicos preços das commodities essenciais, os líderes do G8 repetem o mantra que os países devem levar em consideração o mercado global para a sua segurança alimentar. Essa postura, promovida no Acordo de Doha, desvia a atenção para a necessidade de investimentos em métodos mais ecológicos, que proporcionem rendimentos mais elevados, uma melhor alimentação e mais resistência às mudanças do clima”, avalia Mittler.
AgrocombustíveisApesar de reconhecerem a insustentabilidade dos agrocombustíveis, o G8 também não anunciou nenhum compromisso com o tema, ignorando-o totalmente. O Greenpeace apóia o desenvolvimento de fontes de energia alternativas e amigáveis do ponto de vista climático, desde que incorporem critérios rigorosos para assegurar salvaguardas ambientais e sociais. Há outras maneiras muito mais efetivas de se reduzir as emissões, como o uso de fontes renováveis.
No caso do Brasil, o Greenpeace acredita que a indústria brasileira de agroenergia, como a da cana, deve trabalhar sob regulamentação rigorosa. Até agora, governos e organizações internacionais fracassaram em incorporar os critérios ambientais e sociais necessárias para lidar com os impactos da produção e consumo de agrocombustíveis. O apoio governamental para sua produção – como subsídios, isenção de impostos e metas obrigatórias de porcentagem – deve estar condicionado a uma política pública já estabelecida para garantir, de forma transparente, que as salvaguardas serão cumpridas.
Este escopo de trabalho também deve garantir que a produção de agrocombustíveis não solape outras prioridades, como a segurança alimentar, ou ameace a biodiversidade e ecossistemas vitais para o futuro da vida na Terra. O governo brasileiro também deve garantir o estabelecimento de políticas públicas que assegurem que a expansão da indústria da cana-de-açúcar ocorra apenas em áreas já desmatadas, além de promover uma transição justa dos trabalhadores envolvidos na colheita manual a fim de evitar conflitos sociais.
(Por Redação do Greenpeace,
Envolverde, 10/07/2008)