A pesca das nações insulares seria 17 vezes maior do que o informado oficialmente, segundo um novo estudo. “A magnitude das capturas não informadas é impressionante”, disse Daniel Pauly, especialista em pesca da canadense Universidade de Columbia Britânica (UBC). Em todos os 20 pequenos Estados insulares do Pacífico considerados no informe se registra este fenômeno, principalmente porque não levam em consideração as capturas dos pequenos pescadores locais.
É algo comum. Inclusive os Estados Unidos não incluem nas estatísticas os dados referentes à pesca esportiva e às capturas em nível local, disse Pauly à IPS durante o 11º Simpósio Internacional sobre Arrecifes de Coral, que começou dia 7 e vai até amanha em Fort Lauderdale, no Estado da Florida (EUA). Outro estudo calcula que a pesca esportiva nas ilhas do Hawai duplica a magnitude das capturas comerciais. O documento diz que 75% das espécies que têm seu habitat nos corais hawaianos estão dizimados ou em estado crítico devido à pesca em excesso. Pauly e outros especialistas suspeitam há tempos que muitos países não registram a pesca esportiva e as capturas em pequena escala.
O projeto O Mar que nos Rodeia, da UBC, é a primeira tentativa de reconstruir o panorama do número real de capturas entre 1950 e 2004. “Embora a pesca em pequena escala alimente muitas pessoas nos países pobres, sua contribuição não fica registrada”, disse Pauly. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), com sede em Roma, copila informação global sobre as pescas. Mas, as nações oferecem informação de forma voluntária e os dados não são verificados. Em muitos casos representam as cifras de exportação, não as capturas totais, acrescentou ou especialista.
Esta informação incompleta é a única com que contam os cientistas, políticos, funcionários governamentais e conservacionistas, entre outros, para tomarem decisões sobre cotas e licenças de pesca, frequentemente com sérias conseqüências. Devido ao desaparecimento de peixes, muitas comunidades pobres devem importar comida e isto é especialmente certo nas pequenas ilhas do Pacífico, disse Dirk Zeller, do projeto O Mar que nos Rodeia. “A pesca local é vital para a segurança alimentar, mas o manejo da indústria se baseia em dados da FAO, que não refletem a realidade”, acrescentou.
Como as capturas na pesca em pequena escala são muito maiores do que o estimado, é vital “vigiar a pesca excessiva comercial, para que as comunidades costeiras em todo o mundo tenham a renda e as fontes de alimento que necessitam”, afirmou Zeller. Segundo a FAO, o consumo de pescado por habitante em Moçambique, que tem uma linha costeira de 2.500 quilômetros, é de apenas três quilos por ano, quando a média mundial chega a 16 quilos, disse Jennifer Jacquet, pesquisadora do projeto O Mar que nos Rodeia. “A pesca local de subsistência não é levada em conta”, acrescentou.
Quando essa atividade foi estudada em algumas áreas, a magnitude das capturas foi seis vezes superior. Mas, Moçambique já concedeu licenças para a pesca de lagosta a barcos de arrasto da União Européia, levando em conta os dados que ignoram as capturas da pesca em pequena escala e sua importância para a segurança alimentar. Os barcos pesqueiros de arrasto da UE descartam uma enorme quantidade do que pescam, com grande impacto nos pescadores locais. “É o reverso do cenário Robin Hood: aqui se rouba os pobres para dar aos ricos”, disse Jacquet.
A ajuda para o desenvolvimento destinada à indústria da pesca em numerosos países pobres acaba, em muitos casos, financiando unidades de processamento que beneficiam a pesca comercial de espécies como o atum, que raramente é consumido localmente, sendo destinado à exportação para países ricos, disse Pauly. “O lucro acaba, frequentemente, em uma conta de um banco suíço”, acrescentou. É muito mais importante proteger os arrecifes, porque oferecem a possibilidade de desenvolvimento econômico onde é necessário. As capturas estão diminuindo tão rapidamente que muitos pescadores mudam para as cidades ou para países ricos como imigrantes ilegais, alertou Pauly.
A Espanha oferece um exemplo claro. A União Européia subsidia a pesca comercial desse país no oceano Atlântico, mas, poucos tripulantes dos navios pesqueiros são espanhóis e o pescado é exportado para o Japão e as nações do norte da Europa, acrescentou o especialista. Por outro lado, os pescadores em pequena escala do Mar Mediterrâneo recebem pouca ajuda e seu número está em queda. Apóiá-los seria muito mais benéfico para a Espanha, disse Pauly. Embora os grandes barcos de arrasto estejam ficando fora do negócio devido ao alto custo do combustível, o dano à pesca já aconteceu em grande parte. “A pesca em pequena escala é mais eficiente em termos de combustível e pode ser sustentável se os arrecifes forem protegidos”, concluiu Pauly.
(Por Stephen Leahy, Envolverde, IPS, 10/07/2008)