Com 37 votos favoráveis, 23 contrários e três abstenções, o Senado aprovou nesta quarta-feira (09/07) o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 16/08, oriundo da Medida Provisória (MP) 422/08, que aumenta o limite da área que pode ser concedida pela União para uso rural, sem processo de licitação, na Amazônia Legal. O atual limite é de até 500 hectares. Com a nova proposta, passa para até 15 módulos fiscais. A matéria será encaminhada à sanção.
O módulo fiscal é estabelecido para cada município e procura refletir a área mediana dos imóveis rurais daquela região. Em algumas localidades, o módulo chega a 100 hectares. Nesses casos, a área passível de regularização será ampliada de 500 para 1,5 mil hectares.
O Executivo sustenta que a medida tem como um dos objetivos a prevenção, o monitoramento e o controle do desmatamento na Amazônia, pois visa, a um só tempo, coibir e combater a grilagem de terras públicas na região, e ainda regularizar situações que estejam dentro da legalidade e sustentabilidade. Para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, a mudança vai permitir melhor ordenamento e maior controle da ocupação territorial da Amazônia
Discussão
Todos esses argumentos foram questionados pela senadora Marina Silva (PT-AC), para quem a aprovação da matéria poderá promover a privatização de florestas públicas e a regularização de terras que foram griladas no passado. No começo da discussão da matéria, a ex-ministra do Meio Ambiente sugeriu ao líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), uma emenda que excluía do âmbito da MP 422/08 as áreas que fazem parte do Cadastro Nacional de Florestas Públicas.
A emenda foi rejeitada por Jucá, sob o argumento de que a proposta da senadora tratava da destinação das florestas públicas, sem estar relacionada ao tema da MP 422/08, que altera a Lei de Licitações (Lei 8.666/93) como forma de autorizar o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a vender as terras de até 1.500 hectares em processo direto a quem ocupa essas propriedades. Após muito debate, Jucá comprometeu-se a transformar a emenda de Marina Silva em um projeto de lei que trate especificamente das florestas públicas.
- Vamos permitir que o Incra, na Amazônia, Legal tenha a faculdade - [isso] não é obrigatório - de legalizar terras de até 1.500 hectares. A Constituição permite até 2.500 hectares. Baixamos para 1.500 - afirmou Jucá, ressaltando que todas as terras de Roraima encontram-se em nome da União e que a titularidade irá finalmente favorecer os seus ocupantes.
O projeto de lei de conversão também foi criticado pelo senador Geraldo Mesquita Júnior (PMDB-AC), segundo o qual a dimensão de 1.500 hectares não é o padrão das pequenas propriedades da Amazônia.
- Isso vai dizer respeito a uma pequena minoria que, quem sabe, ocupou essas terras irregularmente e agora quer a sua regularização na marra. A agricultura familiar passa longe dessa quantidade de terra que está sendo liberada - afirmou.
Amplitude
Já o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) classificou a matéria de "complexa" e disse que o assunto deveria ter sido discutido por meio de projeto de lei, e não por medida provisória, tendo em vista a amplitude do tema. A mesma posição foi defendida pelos senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Jefferson Praia (PDT-AM), Alvaro Dias (PSDB-PR), Marisa Serrano (PSDB-MS) e Flávio Arns (PT-PR).
- Um projeto de lei teria permitido audiências públicas, um debate intenso. Vou votar contra para marcar posição contra a forma com que se tratou assunto tão relevante. Outra alternativa seria a gente fazer funcionar as comissões que tratam das medidas provisórias, mas isso seria inviável - disse Arthur Virgílio.
Por sua vez, o senador João Pedro (PT-AM) disse que as terras de Roraima são fundamentalmente constituídas por cerrado e que a realidade daquele estado não poderia ser estendida a todas as regiões da Amazônia.
Para o senador Marconi Perillo (PSDB-GO), o projeto aprovado vai beneficiar o governo em ano eleitoral e a ocupação irregular de terras na Amazônia. A proposta pode ser considerada o que chamou de um novo "Plano de Aceleração das Invasões (PAI)", em alusão ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado pelo Executivo no início de 2007.
Falaram a favor do projeto os senadores João Ribeiro (PR-TO), Jayme Campos (DEM-MT), Expedito Júnior (PR-RO), Valter Pereira (PMDB-MS), José Agripino (DEM-RN), Gilberto Goellner (DEM-MT), Valdir Raupp (PMDB-RO) e Augusto Botelho (PT-RR).
Para João Ribeiro, o projeto resolve o problema da grilagem na Amazônia.
- O governo está autorizando o Incra a fazer a regulamentação das terras. Está redondamente equivocado quem disse que isso contribui para a grilagem - disse o senador.
Já na opinião de Jayme Campos, a matéria é oportuna e vai favorecer a regularização pacífica das terras na região amazônica. Para Expedito Júnior, a proposta também vai favorecer a redução do desmatamento. A mesma opinião foi defendida por Gilberto Goellner.
Valter Pereira, por sua vez, disse que a preocupação de Marina Silva não era infundada, destacando o interesse que a Amazônia desperta na população de outros países. Valdir Raupp disse que o projeto corrige uma injustiça, ao promover a regularização fundiária da Amazônia.
Com apoio de Flávio Arns e Marina Silva, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) chegou a pedir verificação de quórum pouco antes da votação do projeto. Ele avaliou que o Senado não poderia debater a matéria ao longo de 120 minutos, tempo aproximado que levou a discussão do projeto, para corrigir um problema de 120 anos, referindo-se à falta de regularização fundiária da Amazônia.
(Por Paulo Sérgio Vasco e Helena Daltro Pontual, Agência Senado, 09/07/2008)