Em um rompante de transparência de fazer inveja à ex-ministra Marina Silva, o ministro de Meio Ambinte Carlos Minc, revelou nesta terça-feira o tamanho do abacaxi que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMbio terá que descascar para colocar o mínimo de infra-estrutura e gente nas áreas protegidas do País. “Algo não vai bem no reino das unidades de conservação. O quadro é esse, não vamos esconder”, disse Minc em coletiva de imprensa.
Dos 299 parques nacionais, reservas extrativistas, refúgios de vida silvestre e outras áreas protegidas federais, 173 (58%) não têm sequer um fiscal e 82 (28%) não possuem nenhum servidor. Além disso, só 73 (24%) das 299 já têm planos de manejo para garantir um uso mais adequado.
Tamanho descaso com áreas criadas pelo próprio governo deu asas à ilegalidade. Dos 11.224 Km2 de desflorestamento registrados no ano passado, cerca de 2,5 mil Km2 (22%) aconteceram dentro de áreas protegidas e terras indígenas. De forma geral, o desmatamento cresce mais dentro do que fora das unidades de conservação. Até porque do lado de fora pouca coisa sobrou em alguns estados amazônicos, como Rondônia e Mato Grosso.
Medidas
Frente ao descalabro das áreas protegidas federais, o Ministério do Meio Ambiente – MMA promete uma série de medidas. Quase tudo para este mês. Segundo Carlos Minc, a idéia é “proteger a biodiversidade e as populações tradicionais e elevar a oferta de madeira legalizada”.
O pacote inclui destacar um gestor para cada unidade de conservação, concurso público para preencher 185 vagas no ICMBio e 215 no Ibama, contratação de 180 novos fiscais entre agosto e novembro e de mil brigadistas para atuar até o fim do ano, principalmente no período de estiagem. Cada brigadista ganhará cerca de R$ 600,00 mensais. Amenizar a situação dos 63 parques nacionais é a prioridade.
O ICMBio tem hoje 1.635 servidores. Boa parte veio remanejada do Ibama. A terceira portaria de transferência de servidores será publicada nos próximos dias. Com isso, serão quase dois mil trabalhadores carregados para o órgão criado na gestão Marina Silva. “O cobertor não ficará curto para o Ibama”, garantiu Minc.
Sustentação financeira
A grande dúvida frente a tantos anúncios é de onde saíra o dinheiro para fechar algumas feridas da gestão ambiental federal. Vale lembrar que a maioria das reservas não é demarcada e não possui infra-estrutura para manter em seus limites gestores e fiscais. O MMA aposta nos recursos da compensação ambiental. Segundo Minc, mais de R$ 400 milhões poderiam engrossar a gestão das áreas protegidas se essa torneira for mesmo aberta.
Dados obtidos pelo O Eco revelam que apenas R$ 3 milhões estavam previstos de início para as reservas federais de proteção integral na Amazônia em 2008.
Já Silvana Medeiros, presidente-interina do ICMBio, comentou que o governo está investindo na “modernização administrativa” para evitar falta de combustível e outros materiais nas áreas protegidas. Segundo ela, foi contratada uma gestora para abastecer veículos que operam dentro das reservas e foi fornecido um “cartão” corporativo para cada unidade, gerenciado pela sede em Brasília. Também se pensa na cobrança eletrônica de ingressos, reduzindo fraudes. “Não faltará mais combustível em áreas protegidas”, disse.
Turismo
A visitação de parques nacionais e outras áreas também pode alimentar os cofres das unidades de conservação. Mas dados do governo mostram que as áreas protegidas federais recebem apenas 3,5 milhões de visitantes por ano. Complicando tudo, nove entre dez turistas preferem os bem estruturados parques nacionais do Iguaçu (PR) e da Tijuca (RJ). “A melhor defesa é o bom uso. Por isso queremos melhorar a visitação, ampliando a receita e a fiscalização desses locais”, avisou Minc.
MMA e Ministério do Turismo já tiraram do forno um plano para esquentar o turismo em 25 unidades de conservação. O ministro também discutirá com a Eletrobrás e com a Itaipu Binacional um modelo para reverter parte das taxas de energia de novos empreendimentos para a manutenção de áreas protegidas. “O custo deve ser dividido entre consumidores e geradores, mas o modelo precisa ser mais bem discutido”, avisou o ministro.
Sem planos
Toda reserva ecológica deveria funcionar com um plano de manejo. O documento é uma espécie de manual de uso para se evitar a degradação excessiva de cada área. Mas a realidade das reservas federais é bem diferente, ainda mais se tratando das 55 reservas extrativistas. Apenas duas têm plano de manejo. Isso compromete sua preservação e a vida das populações que lá vivem. Sem planos, nem financiamentos públicos são liberados.
Conforme o ministro Minc, a falta de regularização joga extrativistas na miséria, fazendo com que abram as portas das reservas à ilicitudes de toda a natureza. “Muitos extrativistas na miséria vendem madeira ilegal ou deixam gado entrar nessas áreas. A miséria os converte em predadores. Vamos apreender boi pirata dentro das reservas”, disse.
A produção dos 53 planos de manejo que faltam para as reservas extrativistas será acelerada com a ajuda de ONGs e instituições de ensino. Entidades como essas concorrerão ao trabalho por meio de um edital que será lançado a partir de agosto. Há poucos dias, o governo também lançou uma política de preços mínimos para produtos do extrativismo.
Outros 12 planos de manejo são elaborados para florestas nacionais, alvo principal das concessões de matas para manejo. Se os planos governistas se concretizarem, até 4 milhões de hectares serão alvo de manejo até o fim de 2009. A capacidade de produção anual seria de 6 milhões de metros cúbicos de madeira. Cada concessão tem prazo inicial de 30 anos.
(Por Aldem Bourscheit, OEco, 08/07/2008)