Bioprospecção significa vasculhar a biodiversidade e descobrir organismos que possibilitem o desenvolvimento de novos produtos. Mas, de acordo com alguns dos principais pesquisadores da área de fitoquímica e produtos naturais em São Paulo, é preciso que essa busca seja orientada sempre pelo uso racional dos recursos naturais.
Segundo Alberto Cavalheiro, pesquisador do Núcleo de Bioensaios, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais (NuBBE) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a prioridade do cientista que faz bioprospecção deve ser o avanço do conhecimento e a sustentabilidade da biodiversidade.
“Não se pode ter uma visão mercantilista e imediatista em relação ao desenvolvimento de novos produtos. O desenvolvimento de novas drogas está associado ao entendimento da natureza e esse conhecimento se presta ao uso sustentável da biodiversidade”, disse à Agência Fapesp.
Professor do Departamento de Química Orgânica da Unesp, em Araraquara, Cavalheiro abriu, nesta segunda-feira (07/07), as apresentações do 3º Workshop Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade de Plantas de Cerrado e Mata Atlântica: Diversidade Química e Prospecção de Bioprodutos. O evento comemora os dez anos de atividades do NuBBE, que corresponde a um dos Projetos Temáticos do Programa Biota–Fapesp.
De acordo com Cavalheiro, para melhorar a qualidade de vida humana, o desenvolvimento de novos produtos precisa levar em conta uma concepção sistêmica da natureza, implícita no Biota. “Não acho que curar indivíduos vá nos trazer uma saúde perfeita, temos que pensar em curar a sociedade. O Biota traz em si essa idéia: ele pretende documentar para depois aprender a usar a natureza, mas sempre com uma proposta de uso sustentável da biodiversidade”, afirmou.
“As atividades do grupo do NuBBE, estabelecido na mesma época em que o Biota, são exemplo de alta produtividade na bioprospecção com uma proposta de busca racional”, disse Vanderlan da Silva Bolzani, fundadora do núcleo, professora titular do Instituto de Química da Unesp e presidente da Sociedade Brasileira de Química (SBQ).
“Uma das principais contribuições do grupo é dar um exemplo de trabalho colaborativo capaz de articular diversas disciplinas e instituições com resultados que convirjam para a sustentabilidade e para o avanço do conhecimento”, explicou.
Novos tratamentos
Os projetos do NuBBE são dirigidos ao estudo químico de espécies vegetais e microrganismos, com foco especial em novas substâncias antimicrobianas, antitumorais, antiinflamatórias e antioxidantes, e estudos metobolômicos que incluem dinâmica metabólica, variabilidade intra-específica e biossíntese de metabólitos secundários.
Cavalheiro coordena um dos diversos projetos do NuBBE, intitulado “Busca de substâncias naturais com atividade antitumoral potencial, antioxidante, antifúngica, antidiabética e inibidores de acetilcolinesterase e mieloperoxidase da flora do Cerrado e Mata Atlântica”.
“Meu interesse atual é começar a usar esses modelos de plantas que estamos descrevendo para estudar a função de metabólitos secundários. E a idéia é começar a associar esses modelos de forma mais efetiva e objetiva, com trabalhos de genômica e proteômica”, explicou.
“Nos laboratórios do Instituto de Química da Unesp, fazemos fundamentalmente a parte química – análise cromatográfica, análise espectrométrica, planejamento com análises estatísticas e quimiometria. Temos condição de fazer alguns ensaios biológicos com antioxidantes, antimaláricos, antifúngico e inibidores da acetilcolinesterase”, disse.
Nos dez anos de atividades, o NuBBE realizou estudos sobre milhares de extratos e espécies. “Não temos um banco de substâncias, porque muitas delas não têm estabilidade para ser guardadas, mas temos uma extratoteca. Podemos facilmente obter novamente as substâncias estudadas se elas se mostrarem interessantes”, afirmou Cavalheiro.
Alguns resultados obtidos pelos pesquisadores no NuBBE estão atualmente em estado intermediário de desenvolvimento de produtos com a indústria farmacêutica. “Temos dois produtos em desenvolvimento com a Apsen, dois com a Natura, um com a Eurofarma e um em discussão para desenvolvimento pela Aché. Todos diferentes: antiúlcera, antitumoral, anticolinesterásico (para Alzheimer), cosmético, antioxidante, antifúngico”, disse.
(Por Fábio de Castro, Agência Fapesp, 07/07/2008)