Cerca de seis milhões de árvores poderão ser poupadas por ano no Pará. Esse é o saldo apontado no estudo entregue pelo Sindicato das Indústrias de Ferro Gusa do Estado do Pará (Sindiferpa) à governadora Ana Júlia Carepa. O estudo foi feito pela Fundação Gorceix e propõe a substituição parcial do carvão vegetal pelo gás natural, uma tecnologia ambientalmente correta e usada no mundo todo, sobretudo na Europa e que tem como benefício principal a preservação ambiental.
Segundo o pesquisador Paulo von Kruger, da Fundação Gorceix e que esteve à frente dos levantamentos, para abastecer o Pólo Siderúrgico de Marabá, seriam necessários cerca de 40 milhões de metros cúbicos de gás natural por ano para a substituição parcial do carvão vegetal. Isso resultaria na redução do uso de 500 mil metros cúbicos de carvão vegetal por ano. Kruger explica que para a produção de cada metro cúbico de carvão vegetal são necessárias 12 árvores, conforme preconiza a Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente IN 01/96-MMA. E a partir daí se chega ao saldo de que o investimento na tecnologia do carvão vegetal pouparia seis milhões de árvores por ano.
O presidente do Sindiferpa, Afonso Albuquerque destaca que quando a entidade encomendou o estudo à Fundação Gorceix já tinha a expectativa de que o uso do carvão vegetal implica em preservação ambiental. 'A busca por sustentabilidade tem sido nossa principal bandeira de luta e estamos fazendo todos os esforços necessários para a alcançarmos', enfatizou Albuquerque, que entregou o resultado do estudo à governadora Ana Júlia durante a realização da reunião do Fórum Paraense de Competitividade, que ocorreu no dia 18 de junho, no Hangar Centro de Convenções.
O estudo revela também que para que essa tecnologia do gás natural seja colocada em prática torna-se fundamental a implantação de um gasoduto no Estado. Essa informação foi repassada à governadora que agradeceu a realização do estudo e sinalizou que ele está indo ao encontro das intenções do governo do Estado. 'Eu queria agradecer esse estudo e dizer que nós já estamos em conversas com o presidente Lula e com o presidente Hugo Chávez (da Venezuela) para estudarmos a implantação de um gasoduto no Estado', disse Ana Júlia, na ocasião.
Albuquerque ressalta que o estudo é resultado de uma preocupação do setor siderúrgico, representado pelo Sindiferpa, em utilizar tecnologias que minimizem impactos ambientais e que contribuam para a sustentabilidade. No entanto, ele também destaca que a implantação de um gasoduto no Pará beneficiará a vários empreendimentos do setor produtivo, além de possibilitar a atração de novos investimentos no Estado. 'Esse estudo foi focado no setor siderúrgico, porém, é bom destacar que se for implantado um gasoduto no estado, ele irá beneficiar vários setores produtivos, como o alimentício, entre outros. Além disso, um gasoduto propicia a redução de custos, o que é atrativo para todos os empreendimentos que usam esse energético (gás natural)', disse Albuquerque.
DESAFIOSO pesquisador Paulo Kruger também destaca que 'a racionalização do uso da energia e a proteção ao meio ambiente são os maiores desafios da atualidade e, naturalmente, a indústria siderúrgica está dentro deste contexto'. Ele explica que pelas suas próprias características, o processo de obtenção do ferro é tanto consumidor intensivo de energia quanto ambientalmente impactante. E neste contexto, se destaca o alto-forno, responsável pela fabricação de mais de 95% do ferro gusa produzidos no mundo. Para entender melhor o processo de produção do ferro gusa é preciso saber que o meio energético universalmente empregado no processo do alto-forno é o carbono, seja na forma de coque ou de carvão vegetal.
O coque implica na extração do carvão mineral, seu beneficiamento e a sua coqueificação. Já o carvão vegetal, envolve reflorestamento e carvoejamento. Em ambos os casos, os custos envolvidos são elevados e os impactos ambientais também. Por esse motivo, não tem sido poucos os esforços do setor siderúrgico, já há algum tempo, no sentido de substituir o redutor calibrado, caro, por energéticos menos nobres, que sejam injetados através das ventaneiras dos altos-fornos e ambientalmente menos impactantes. Destes, os mais comuns são o carvão pulverizado e o gás natural.
Um detalhe importante que o estudo revela é que a injeção de gás natural pelas ventaneiras dos altos fornos substitui o redutor calibrado e fornece grandes quantidades de hidrogênio, que substituem o monóxido de carbono, como gás redutor na cuba do forno. Sendo assim, o uso do gás natural minimiza sobremaneira o impacto ambiental em relação a camada de ozônio, que tem sido bastante atingida pela liberação de monóxido de carbono.
PELO MUNDODe acordo com Kruger, a tecnologia de operação de altos fornos com gás natural foi desenvolvida na antiga União Soviética, há cerca de 50 anos, e seu emprego é, atualmente, difundido em todo o mundo. Só para se ter uma idéia, 80% dos altos fornos da CEI, dos EUA e Canadá, adotam a prática.
E não é à toa que essa tecnologia tem sido mundialmente usada. Segundo o engenheiro da Fundação Gorceix, isso é decorrência de uma série de aspectos vantajosos em relação a outras alternativas. Entre elas, está o fato de que o uso do gás natural faz com que parte do monóxido de carbono liberado durante o processo de produção seja substituída pelo hidrogênio. Além disso, segundo Kruger, o hidrogênio é um redutor mais eficiente que o monóxido de carbono, o que proporciona ganhos de energia e em menores consumos de redutor.
Tecnologia de preservação ambiental requer apenas a distribuiçãoKruger ressalta também que, a técnica que usa o carbono gera e emite quantidades maciças de bióxido de carbono, que é um dos principais responsáveis pelo aquecimento global (efeito estufa), enquanto a redução pelo hidrogênio gera apenas vapor de água. E mais: a prática de injeção de gás natural não implica em investimentos em equipamentos e instalações, como ocorre no caso da injeção de carvão pulverizado. O único investimento requerido se refere ao distribuidor e ao regulador da pressão do gás.
No entanto, o pesquisador destaca que para que a adoção desta tecnologia traga resultados positivos, é fundamental que a sua condução seja feita da forma correta. E foi justamente para garantir que o setor siderúrgico paraense tivesse a noção exata sobre a tecnologia e a medida adequada para sua implantação que todo o trabalho, análise e avaliação das possibilidades de injeção de gás natural, foram feitos pela Fundação Gorceix tomando como referência as características/condições dos altos fornos existentes no Pólo Siderúrgico de Marabá.
Os valores dos consumos foram calculados, compatibilizados com os volumes internos, vazões, temperaturas, etc, daqueles fornos, considerando matérias primas e insumos de uso corrente nas usinas da região e com condições operacionais típicas para cada caso. Dentro desta referência, foi determinada uma redução mensal de consumo de carvão vegetal de 37.536 mdc. É um valor significativo, com implicação direta na extensão das áreas reflorestadas e da atividade de carvoejamento.
Os valores calculados referentes à redução das emissões de gases de efeito estufa, representados pelas quantidades de CO2 que deixariam de ser lançadas na atmosfera, pela substituição de carbono por hidrogênio, foram avaliados em 14.411 toneladas mensais de CO2.
No entanto, Kruger explica que esses quantitativos podem ter alteração após a implantação, dependendo de vários fatores existentes em cada uma das usinas. 'Na hipótese da implantação efetiva do sistema, os valores efetivos, referentes a cada usina, deverão ser estabelecidos, não apenas à luz das limitações técnicas, mas, também, das políticas específicas de cada empresa', disse o pesquisador.
Estudo aponta a necessidade de gasodutoO estudo realizado pela Fundação Gorceix aponta algumas alternativas que podem ser utilizadas para transportar o gás natural na forma líquida até Marabá para abastecer o pólo siderúrgico. Entretanto, conclui que a forma mais eficiente seria mesmo a construção de gasoduto, que serviria não apenas para o setor de siderurgia, como o alimentício e outros existentes no Estado. 'O fator logística influi decisivamente na adoção ou não do emprego do gás, independente do resultado da avaliação técnica', ponderou o pesquisador.
Diante disso, o estudo apontou três alternativas. Na primeira, o gás do Juruá seria transportado na forma líquida, em barcaças com capacidade de 1,5 mil metros cúbicos de gás natural líquido (GNL) - equivalente a uma semana de consumo - até Tucuruí, onde o gás seria regasificado e transferido para as usinas por meio de caminhões feixe. Na segunda alternativa, o gás chegaria a São Luís (MA) por navios metaneiros de 6 mil m3 de GNL (um mês de consumo), sendo transferido para Marabá em vagões criogênicos, com capacidades entre 35 e 120 m3 de GNL. E na terceira, o transporte seria feito por carretas criogênicas, transportando gás natural líquido (GNL), resfriado a -160oC, em unidades de liquefação, em Pecém, através da rodovia BR-222.
Segundo Kruger, em princípio, todas elas são factíveis. Entretanto, a identificação da mais adequada, deverá ser objeto de estudo específico. Mas, no futuro, está prevista a implantação de gasoduto no estado. 'é importante ressaltar também que, a implantação de uma central de gás, nos moldes apresentados, pode ter um efeito multiplicador, na região, não se atendo apenas à indústria siderúrgica. Realmente, esta, pelos volumes consumidos, influi decisivamente na viabilização do empreendimento, permitindo a inclusão de outros potenciais usuários', concluiu Kruger.
(O Liberal (Belém-PA),
FGV, 07/07/2008)