Beneficiada pela falta de áreas marinhas protegidas, a pressão aos ecossistemas costeiros aparece de todos os lados. E isso começa pela própria maneira como a humanidade se acostumou a encarar o oceano, acreditam estudiosos do setor. "Ainda existe essa idéia de que o mar é um sumidouro, que podemos jogar qualquer coisa nele", afirma o pesquisador do Programa Costa Atlântica, da Fundação SOS Mata Atlântica Fábio Motta. "Por outro lado, achamos que é uma fonte inesgotável de comida", complementa o diretor do Programa Marinho da Conservação Internacional, Guilherme Dutra.
A sobrepesca - ou pesca além da capacidade de as espécies se recomporem - e a contaminação por esgoto, apesar de serem as principais ameaças, não são as únicas. A destruição de hábitats para novos assentamentos populacionais e comerciais, iniciada com a colonização do Brasil, continua avançando por regiões ainda inexploradas. Sedimentos que chegam aos rios por conta do desmatamento da mata ciliar correm até o mar sufocando os recifes de corais. E por fim, mas não menos importante, é a ameaça do aquecimento global que já se faz sentir nos oceanos - o branqueamento de recifes em todo o mundo é o primeiro sintoma.
ModeloPara pesquisadores que atuam na área, faltam no Brasil modelos de conservação marinha que funcionem para proteger o ecossistema e garantam a sustentabilidade econômica. Um dos primeiros projetos nesse sentido é o de redes de áreas protegidas em Abrolhos, que integra o parque nacional à Reserva Extrativista (Resex) de Corumbau e já vem mostrando resultados na exportação de populações recuperadas para áreas adjacentes.
"Acreditamos que esse modelo pode ser replicado em outras regiões da costa brasileira. A idéia por trás disso é: áreas protegidas não são a única forma de conservação. É preciso trabalhar também com sistemas de pesca feitos nas condições corretas", comenta Dutra.
Ele reforça que a integração de áreas marinhas e costeiras é importante porque o ciclo de vida das espécies aquáticas é complexo. O que direciona o foco de preocupação para os manguezais. Berçários de boa parte das espécies e local de desenvolvimento e alimentação de outras tantas, os mangues vêm sofrendo todo tipo de degradação, que vai da poluição à expansão das fazendas de criação de camarões. Apesar de serem considerados pela legislação ambiental Áreas de Preservação Permanente, os manguezais estão sendo profundamente alterados pela atividade de carcinicultura. Entre os impactos estão o desmatamento de grandes áreas e a modificação no fluxo das marés, na temperatura e na salinidade das águas em decorrência da construção de canais, barreiras e tanques.
Uma das alternativas à devastação é a criação de reservas extrativistas, a exemplo da Corumbau. Uma das mais esperadas pelos pesquisadores que trabalham na rede de áreas protegidas do Banco dos Abrolhos é a de Cassurubá. De acordo com Dutra, a área dessa reserva compreende 95% dos manguezais que servem de berçário e local de desenvolvimento para as espécies que vivem em Abrolhos, sendo fundamental para seu bom funcionamento.
No começo do ano, a Resex, que ficará entre Caravelas e Nova Viçosa, na Bahia, chegou a ser anunciada pelo governo federal, mas depois ficou presa na Casa Civil à espera da assinatura do presidente da República. Segundo a secretária de Biodiversidade e Florestas do MMA, Maria Cecilia Wey de Brito, houve um processo de negociação dentro do governo federal, mediado pela Casa Civil, que já está resolvido, mas agora as discussões estão com o governo da Bahia. "Mas acho que todos os pontos estão esclarecidos e não deve demorar muito mais para a reserva sair do papel", diz.
(Por Giovana Girardi,
Estadão, 02/07/2008)