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crédito agrícola desmatamento da amazônia incra
2008-07-03

Motivo de intensa disputa política entre ruralistas e ambientalistas, dentro e fora do governo, entrou em vigor na terça-feira (1) a resolução do Banco Central que impede os proprietários de terra na Amazônia que estejam em situação irregular de receber créditos e financiamentos oriundos de bancos públicos ou privados. Ao fim do recadastramento realizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), se encontram em situação de ilegalidade todos aqueles proprietários que não apresentaram os documentos pedidos pelo governo e, em conseqüência, tiveram seu Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) suspenso ou cancelado.

Foram convocados ao recadastramento 15.400 proprietários _ com terras acima de 350 hectares _ nos 36 municípios que, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), são os campeões do desmatamento na Amazônia. Desse total, apenas 3.080 propriedades foram consideradas em situação regular pelo Incra, enquanto outras duas mil ainda se encontram em processo de análise. As demais, que somam mais de dez mil propriedades, passam a ser consideradas irregulares pelo governo. A maioria dos proprietários dessas terras sequer se apresentou ao Incra para realizar o recadastramento.

Uma vez que o trabalho do Incra foi concentrado somente em 36 municípios e, como se sabe, a Amazônia engloba 535 deles, é fácil deduzir que a posse das terras da região continua sendo um dos maiores mistérios brasileiros. Na área da Amazônia Legal, estão registradas 540 mil propriedades rurais e, se todas fossem submetidas a um recadastramento, provavelmente se chegaria a um número espantoso de propriedades ilegais, como reconhece o próprio instituto: “É impossível precisar, se levarmos em conta toda a Amazônia, quantas propriedades estão em situação irregular”, diz o diretor de Estrutura Fundiária do Incra, Richard Troisiano.

Um estudo divulgado esta semana pelo Incra revela que o governo não identifica os proprietários de 14% das terras na Amazônia Legal, o que representa uma área de 710 mil quilômetros quadrados, equivalente aos territórios de São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul somados. O estado campeão das “terras sem dono” é o Pará, com quase 289 mil quilômetros quadrados sem proprietários reconhecidos pelo Incra: “Existe uma parte da Amazônia onde não sabemos quem está lá”, diz o presidente do instituto, Rolf Hackbart, ressaltando que o Incra precisa de “mais investimentos, pessoal e equipamentos”.

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, apresentará os resultados do levantamento realizado pelo Incra ao ministro da Secretaria de Assuntos de Longo Prazo, Roberto Mangabeira Unger, durante reunião ainda sem data confirmada, mas que deve acontecer até a semana que vem. Mangabeira Unger pretende utilizar esses e outros dados para o embasamento das ações do Plano Amazônia Sustentável (PAS) que, por determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é coordenado pelo ex-professor de Harvard.

Ruralistas reagem
A resolução do Banco Central foi recebida com amargura pelos representantes do agronegócio e pelos parlamentares da bancada ruralista no Congresso Nacional. A Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato) já anunciou que, nos próximos dias, tentará obter um mandado de segurança coletivo, com pedido de liminar contra o presidente do BC, Henrique Meirelles, que assinou a resolução do conselho: “O agronegócio é o setor da sociedade que mais precisa de crédito para produzir. Se essa medida for levada adiante, vai ter inflação”, ameaça.

A Confederação Nacional de Agricultura (CNA), por intermédio do presidente de sua Comissão de Meio Ambiente, Assuero Veronez, também já se manifestou contra a resolução do Banco Central: “A medida é desastrosa e vai provocar aumento de preços. A culpa é exclusiva do poder público, que não regulamentou antes essas terras e, agora, confundiu proteção ao meio ambiente com questão fundiária”, afirmou Veronez, em entrevista ao jornal O Globo.

Apesar das reclamações, os ruralistas já conseguiram uma importante vitória, que foi a retirada das propriedades que também se estendem ao bioma Cerrado da lista de recadastramento do Incra. Bancada pela pressão política comandada pelo governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, e pela líder da bancada ruralista no Congresso, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), essa decisão do governo agradou aos baluartes do agronegócio, mas deixou ainda mais vulnerável um bioma que tem para o Brasil uma importância tão grande quanto a própria Amazônia.

(Por Maurício Thuswohl, CartaMaior, 02/07/2008)


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