Uma reunião técnica do Grupo de Trabalho do Bioma Pampa, realizada na sexta-feira (27/06), na Superintendência do Ibama/RS, com a presença de convidados especiais, teve uma pauta ampliada. Conforme definição dos organizadores, o principal objetivo do encontro era identificar oportunidades e prioridades para novas políticas públicas de uso sustentável no Bioma Pampa, com ênfase na conservação dos campos nativos.
Para dar uma pequena idéia das dimensões deste Bioma pode-se citar algumas de suas características, bastante desconhecidas até pelos gaúchos: no Brasil, o Bioma Pampa está restrito ao Rio Grande do Sul, onde ocupa uma superfície de 178.243 km², correspondendo a 63% do território estadual e a 2,07% do território brasileiro. No entanto, corresponde à porção norte de uma das mais importantes regiões de campos temperados do mundo, os Campos do Rio da Prata, que se estende por todo o Uruguai e parte da Argentina.
A introdução e expansão das monoculturas (soja, arroz e silvicultura mais recentemente) além das pastagens com espécies exóticas estão levando a uma rápida degradação e descaracterização das paisagens naturais. Ou como bem ironizou o professor Carlos Nabinger, do Departamento de Agronomia da UFRGS e um dos convidados: é da nossa cultura achar que se não há árvore em um local ele não é reconhecido como bioma.
Ele acrescenta que de 1996 até 2006, o Bioma Pampa vem sofrendo perdas alarmantes de 440 mil há ano, descaracterizando a paisagem própria e diversa e comprometendo a fauna (mais de 385 espécies de aves) e a flora (cerca de 450 espécies de gramíneas). Os campos que são a fisionomia predominante da paisagem são importantíssimos no seqüestro de carbono e também para a qualidade dos recursos hídricos, pois boa parte das bacias hidrográficas do RS originam-se em áreas onde predomina o campo nativo.
Apesar de tudo isso, este patrimônio nunca foi devidamente compreendido e valorizado. Os campos nativos têm sido equivocadamente considerados como de baixa qualidade e de baixa produtividade, idéia incorporada e disseminada até hoje entre parte de seus próprios habitantes.
Nabinger diz que é necessário quebrar esses paradigmas com novas formas de manejo, que podem ser adotadas praticamente sem nenhum custo. Há anos ele vem desenvolvendo pesquisas e sugerindo novas práticas de manejo na produção animal com critérios bem objetivos no manejo do campo nativo: em síntese o controle correto de carga animal a fim de otimizar a produção média da pecuária no Bioma Pampa, passando de 60 k por há/ano para 250 k por há/ano. ?Como resultado, um gado mais saudável e com mais peso e um solo melhor conservado com pastagens naturais, são resultados visíveis e que agregam valor ao campo?, pondera.
O produtor rural Fernando Adauto Loureiro de Souza, que é produtor rural na região de Bagé e membro da Associação dos Produtores de Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional (APROPAMPA) defendeu na sua palestra a união entre os conhecimentos técnicos de agrônomo com o respeito a práticas de conservação das terras herdadas de seu bisavô. Ele defende a criação de gado em campos nativos com respeito ao ecossistema local e a manutenção da agropecuária como forma de manter o homem do campo e geração de renda, pois avalia ?que quem não tiver renda, vai plantar eucalipto?.
O agrônomo e doutorando em Desenvolvimento Rural pela Ufrgs, Cláudio Marques Ribeiro, defendeu como forma de preservação do Bioma Pampa a definição urgente de políticas públicas com entendimento da realidade local . ?No Bioma Pampa tudo é extremamente heterogêneo: as questões econômicas, sociais e ambientais?. Para ele é fundamental entender a biodiversidade daquela região e superar a falsa dicotomia imposta entre o antigo versus moderno. ?É preciso estudar aquela realidade e estabelecer propostas específicas para cada contexto?, acrescenta.
A representante do Ministério do Turismo, Tânia Brizolla acredita que para ?vender turisticamente? os municípios que fazem parte do Bioma Pampa é necessário incorporar condições e atrativos que a atividade de turismo isoladamente não consegue. Ela cita como exemplo a necessidade infra-estrutura adequada como hotéis, restaurantes e outras atrações que possam competir com regiões do Nordeste brasileiro, ou com o turismo ecológico do Pantanal, por exemplo. E para conseguir isso, afirma, o turismo não pode ser um agente isolado.
O Superintendente do Ibama/RS Fernando da Costa Marques destacou três importantes iniciativas do Ministério do Meio Ambiente para conhecer melhor a região do Bioma Pampa: o Mapeamento da Cobertura Vegetal do Bioma Pampa e a definição de Áreas Prioritárias para Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Biodiversidade do Bioma Pampa e a definição do dia 17 de dezembro como dia nacional do Bioma Pampa.
Para o biólogo Eduardo Vélez, fica no entanto, evidente a atual lacuna de políticas públicas integradas (econômicas e ambientais) voltadas para o incentivo de atividades produtivas compatíveis com a conservação dos campos nativos. Na oportunidade apresentou dados sobre o déficit atual de unidades de conservação no Bioma, além de várias propostas de priorização de áreas para ampliação da atual rede de áreas protegidas.
O encontro contou com a presença de cerca de 40 pessoas entre professores e pesquisadores, a maioria com profundo conhecimento daquela região e inúmeros trabalhos e livros publicados além de representantes de ONGs, e diversas entidades que discutiram o assunto durante todo o dia.
Entre os temas considerados prioritários para detalhamento e elaboração de propostas concretas estão: a definição de parâmetros para o aproveitamento econômico do campo nativo em área de reserva legal: a elaboração de uma política que integre crédito e assistência técnica para a pecuária sustentável sobre o campo nativo; a ampliação da rede de unidades de conservação levando em contra o potencial de desenvolvimento turístico das diferentes paisagens do Pampa.
O chefe da Divisão Técnica Marcelo Machado Madeira destacou à disposição do IBAMA/RS, através do GT do Bioma Pampa, da qual é coordenador, em dar seguimento à várias destas demandas e cooperar em todo o processo junto com as demais instituições participantes. Ele ressalta que, dentro de quatro meses, será realizada uma nova rodada de discussões para avaliar os pontes de debate e seus encaminhamentos.
(Maria Helena Firmbach Annes, Ibama/RS, Texto recebido por e-mail, 01/07/2008)