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sustentabilidade rural
2008-06-30

OLINDA - “É muito importante que os programas básicos de cidadania cheguem no meio rural com a cara e a necessidade do rural, ou seja, o rural não precisa se urbanizar para poder receber saneamento, habitação e outros equipamentos de infra-estrutura. São as políticas públicas que devem se adequar a essa realidade”. A avaliação é do coordenador geral do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (NEAD), Carlos Mário Guedes de Guedes, ao fazer um balanço inicial da I Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário, que terminou neste sábado, em Olinda (PE). O encontro reuniu mais de duas mil pessoas de todas as regiões do país.

Em entrevista à Carta Maior, Carlos Guedes, destaca a força da participação e do debate democrático como instrumentos para a formulação de novas políticas públicas e de um novo padrão de desenvolvimento para o rural brasileiro.

CM - Qual o balanço dos debates da Conferência?
GUEDES -
A primeira avaliação é muito positiva. Conseguimos, nesta conferência, aproximar um conjunto de pessoas, organizações e movimentos sociais que têm pensamentos próprios sobre o desenvolvimento rural e sobre o Brasil rural que queremos. Todas essas forças estão se propondo a fazer um debate conjunto, identificação seus pontos de aproximação e de divergência. Esse é o primeiro aspecto positivo: um ambiente muito favorável ao debate com um espírito democrático e participativo. Do ponto de vista do conteúdo, nos debates sobre o Brasil rural que temos e o Brasil rural que queremos, obviamente que existem diferenças de compreensão, mas temos também grandes consensos sobre a necessidade de avançar muito mais na questão agrária do país e sobre a idéia de pensar uma matriz tecnológica adequada à produção familiar. Outro aspecto positivo do encontro é a valorização do saber das comunidades familiares e tradicionais e sua interação com os conhecimentos técnicos e científicos produzidos pela academia. É muito importante também que os programas básicos de cidadania cheguem no meio rural com a cara e a necessidade do rural, ou seja, o rural não precisa se urbanizar para poder receber saneamento, habitação e outros equipamentos de infra-estrutura. São as políticas públicas que devem se adequar a essa realidade. Um outro elemento que deve ser destacado diz respeito à qualidade de vida dessas comunidades: a valorização das manifestações, da memória e da cultura popular. Essa é uma riqueza enorme do país que, historicamente, nunca recebeu a devida atenção por parte do Estado brasileiro. Por fim, cabe destacar o tema da participação popular na conferência. Nós temos no rural, ainda, talvez um dos espaços menos democráticos do país. Isso se reflete desde as relações de poder dentro das famílias, passando pela relação do poder local com as populações. Esses aspectos começam a organizar uma visão do Brasil rural que temos, a partir da construção de uma leitura comum dos desafios que devemos enfrentar para que possamos projetar o Brasil rural que queremos.

Qual será o encaminhamento dado às propostas elaboradas na conferência?
Entendemos que o fruto da conferência é a atualização de um plano nacional de desenvolvimento rural sustentável, com a produção de uma pactuação entre esse conjunto de homens e mulheres que vivem no rural brasileiro e que trazem à sociedade questões e desafios para além de um governo, como, por exemplo, a articulação do papel da agricultura de economia familiar com a soberania alimentar, com a preservação dos recursos ambientais, a defesa da biodiversidade. A idéia que defendemos é que essas populações são protagonistas desse projeto de desenvolvimento. Cabe ao Estado brasileiro, às diferentes instâncias de governo e às organizações da sociedade civil tomar o documento da conferência para orientar a construção de uma política e de uma estratégia. Essa talvez seja a grande contribuição da conferência. Todos nós estamos sendo provocados a produzir não só uma grande política, mas uma estratégia viável de implementação para o Brasil rural que queremos.

Em que medida as pessoas e organizações envolvidas na construção da conferência já participam da formulação de políticas que apontem para esse novo modelo?
Uma das principais riquezas desse debate é a convergência das impressões que as pessoas têm sobre o desenho de políticas públicas para o meio rural e iniciativas recentes do governo brasileiro. Os Territórios da Cidadania são hoje um exemplo claro disso. Quando falamos de melhoria da qualidade de vida do meio rural, é importante assinalar que estamos tendo, dentro dos Territórios da Cidadania, condições de debater a ampliação dos programas básicos de cidadania, saúde, educação, habitação e saneamento. Quando discutimos o tema da participação, cabe destacar que tivemos agora em março e abril encontros nos territórios reunindo cerca de 15 mil participantes para discutir as políticas do governo federal que ou já estão sendo implementadas ou serão implementadas nestes espaços. Quando se pensa numa nova economia sócio-ambiental no rural brasileiro, percebe-se claramente que, nos Territórios da Cidadania, já existe essa idéia de pensar o Plano Safra levando em conta as características específicas de cada região. Tivemos agora a aprovação, pelo Conselho Monetário Nacional, que o programa de aquisição de alimentos, que faz parte do Plano Safra e que faz parte dos Territórios da Cidadania, poderá adquirir produtos da biodiversidade brasileira. Vai poder comprar o açaí, a castanha, apenas para citar dois casos. Essa medida representa um elemento garantidor de renda para aquelas comunidades que estão na floresta ou que são comunidades ribeirinhas. O programa dos territórios vem sendo uma experiência prática e concreta daquilo que se visualiza para as regiões onde os efeitos positivos do crescimento econômico e da distribuição de renda ainda não chegaram. Com os Territórios da Cidadania estamos conseguindo levar isso a cabo.

(Por Marco Aurélio Weissheimer, Carta Maior, 28/06/2008)


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