Com US$ 100 você pode plantar um cedro, com uma placa no seu nome e um certificado de propriedade, no monte Makmil, perto da antiga floresta de cedros de Becharre. Em um viveiro crescem lentamente essas árvores que nos tempos bíblicos cobriram as montanhas do Líbano.
Sua germinação é trabalhosa. Devem transcorrer dois ou três anos até seu transplante nos bosques vizinhos, e é preciso que a neve os cubra por pelo menos 20 dias para que cresçam com força na localidade de Tannurin, que com Becharre e Baruk, além de mais uma dúzia de lugares dispersos pelo Líbano, possui o bosque mais povoado. Um inseto causa estragos nos cedros, devorando suas folhas novas, e se esconde por dois ou três anos embaixo da terra. Chamado Cephalia tannurensis, é a nova maldição florestal.
Alfredo Harp, milionário mexicano de origem libanesa e primo de Carlos Slim (o homem mais rico do mundo), financiou a plantação de 40 mil cedros em Becharre. Nesse belo e íngreme povoado na montanha, edificado sobre o vale de Kadicha, com mosteiros, igrejas, capelas e cavernas de antigos anacoretas maronitas, e pátria do poeta Gibran Khalil Gibran, penduraram cartazes para recebê-lo triunfalmente. Com seu impulso avançará o replantio de até 60 mil cedros nas terras de propriedade da prefeitura e do patriarcado maronita. As pequenas mudas, em saquinhos de plástico preto, esperam nos viveiros junto às placas de seus donos o dia em que serão plantadas nas encostas do Makmil.
Nos últimos anos, graças ao Comitê Internacional do Cedro, animado por Desirée Aziz, que apresentou ao papa em Roma seu livro sobre as prestigiosas coníferas com o objetivo de apregoar as peripécias de sua sorte, a opinião pública foi se sensibilizando. Há séculos que os cedros cantados pela Bíblia, os cedros que os homens de Sidon cortaram para que o rei Salomão erguesse seu templo, essas árvores de Deus com as quais se construíram palácios, edifícios, naus de gregos e egípcios, quase não são mais vistos nesta paisagem levantina.
Durante o domínio otomano, os turcos fizeram de seus troncos dormentes para o trem de Hedjaz. Restam apenas três ou quatro centenas dessas árvores que foram o símbolo glorioso do Líbano e cuja silhueta adorna e identifica, entre todas as bandeiras, a deste pequeno país. Dois têm gravados em seus troncos os nomes de Lamartine e de sua filha Júlia, quando o romântico escritor francês visitou o Oriente. Os agricultores, os rebanhos de cabras, os incêndios, as guerras, as avalanches da neve que cobre seus cumes até o verão, fizeram estragos nas antigas florestas. Há somente 2 mil hectares de cedros no Líbano. Seriam necessários 3 milhões dessas elegantes coníferas para que sua paisagem voltasse a ser como a descrita pela Bíblia.
A quase 2 mil metros acima do nível do mar, à beira da estrada, o bosque de Becharre é rodeado por um muro de pedra que a rainha Vitória da Inglaterra mandou construir. O patriarca maronita, sob cuja proteção vivem os cedros, mandou publicar há dois séculos um decreto condenando à excomunhão os que cortassem as árvores sagradas. Em agosto é tradicional celebrar no meio do bosque em uma capela do padre de Becharre, que hoje é o padre Rahme, que morou na América Latina e fala bem o castelhano, uma missa solene neste barroco e sério rito oriental diante da congregação local. Depois da independência libanesa, a República quer protegê-los como seu maior tesouro e símbolo nacional.
Já não há caçadores nem rebanhos, nem combatentes desalmados que se irritem com essas grandes árvores. Os soldados de um quartel vizinho vigiam as novas plantações ao redor do imortal e vulnerável bosque. Há mais de meio século o poeta catalão Josep Carner, então cônsul em Beirute, defendeu em um de seus preciosos artigos em "La Publicitat" uma "nova ordem de cavalaria" que estivesse sempre a serviço dos cedros.
(Por Tomás Alcoverro, La Vanguardia, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves, UOL, 29/06/2008)