Ainda que a proposta de 2007 do Conselho Superior do Ministério Público de extinguir o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tenha sido rejeitada pelo próprio órgão em abril deste ano, a preocupação com as ações da Brigada Militar e os processos judiciais contra o MST já chegou à Esplanada dos Ministérios, em Brasília,
O gaúcho Guilherme Cassel, ministro do Desenvolvimento Agrário, disse ter tido acesso ao processo investigatório que deu origem às ações do Ministério Público Estadual (MPE):
- É um ambiente de Guerra Fria (confronto entre os Estados Unidos e a União Soviética entre 1945 e 1989, marcada mais por tensão ideológica e política do que por embates de natureza militar). É como se tivéssemos vivendo há 20, 30 anos, em um ambiente de ditadura militar. Tenta-se aprovar uma tática para acabar com o movimento social.
Filiado ao PT, o ministro afirma que tem muitos pontos de discordância com o MST. Mas disse não entender o cerco realizado em Coqueiros do Sul, no dia 17 de junho, quando cerca de 500 policiais militares desmontaram dois acampamentos do movimento erguidos em áreas arrendadas. A ação foi criticada pela rede de apoio aos sem-terra em todo o país. Cassel afirmou:
- Eram homens, mulheres e crianças que arrendavam uma terra. Não tinham invadido nem estavam ocupando. É raríssimo na história jurídica do país. Foram retiradas quando tinham a posse legal daquela área e jogadas na beira da estrada.
Simpatizantes acusam críticos de promoverem cruzada
Para Cassel, o fato de o MPE ter retificado a ata que pedia a dissolução do MST não torna a proposta menos condenável.
- É grave que se tenha avaliado isso (o fim do MST). Que todo mundo fique atento. É preciso acabar com essa escalada de violência contra os movimentos - diz o ministro
Entre as vozes mais próximas ao MST no Estado e no resto do país, ninguém tem dúvidas de que há uma cruzada pelo fim do movimento pela reforma agrária. Sem dar importância às suspeitas de ações ilegais do MST, os defensores do movimento acusam seus detratores de colocar em risco as conquistas democráticas dos últimos 23 anos. Tarimbado porta-voz dos sem-terra, o deputado federal Adão Pretto (PT) vai além. Ele sustenta que a ação frustrada do Conselho Superior do Ministério Público pode ser o pavio para detonar uma caçada nacional aos movimentos. Numa visão mais pessimista, o deputado teme que uma futura maré acabe por atingir os partidos de esquerda, num retrocesso democrático.
- Vejo que algum membro da ditadura ficaria envergonhado com o que está acontecendo hoje no Rio Grande do Sul. O MST é só a ponta- de-lança. Todos os movimentos vão ser reprimidos - sustenta.
Eleito pela primeira vez em 1986 com base na atuação junto a movimentos de pequenos agricultores e sem-terra, Pretto não reconhece exageros na atuação do MST. O petista entende que "ninguém vai para a beira de uma estrada pedir terra porque gosta".
Jurista diz que Constituição ampara direito à associação
No meio jurídico, ecoa a preocupação do MST e dos partidos de esquerda. O professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público, Eduardo Carrion, sustenta que a luta do MST é legítima porque a questão agrária não foi resolvida com eficiência pela sociedade brasileira.
A Constituição, adverte o jurista, assegura a liberdade de reunião e de associação e deve ser prioritariamente respeitada - o que não impede que sejam coibidos pelo Estado, encarregado de assegurar a lei e a ordem, eventuais excessos praticados por sem-terra:
- O direito de reunião e de associação, além do direito de manifestação sem armas, são assegurados pela Constituição - afirma o professor de direito.
(Por Adriano Barcelos, Zero Hora, 27/06/2008)