O relatório de auditoria ocupacional feito pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que avalia a gestão governamental da Amazônia por meio das ações desenvolvidas pelos órgãos federais, tocou num ponto que até pouco tempo não era considerado quando se falava em desenvolvimento do bioma amazônico: o fomento ao desenvolvimento da pesquisa científica e tecnológica na região.
A primeira falha nesse quesito apontada pelo TCU é a falta de recursos – humanos e financeiros – para o país cuidar de maneira devida da biodiversidade local. Essa falta facilita e impulsiona a biopirataria, fazendo com que o conhecimento e a pesquisa na região sejam traduzidos em ativos para outras nações. Segundo o relatório, “O grande desafio da atualidade, aliás, é conhecer os ecossistemas característicos da Amazônia e apresentar sugestões de como esse conhecimento pode ser utilizado para o desenvolvimento sustentável. A maior parte da Amazônia ainda é um território inexplorado pela ciência”. A estimativa do tribunal, publicada em seu relatório, é que até 70% das coletas feitas sobre biodiversidade na região estão restritas aos entornos de Manaus e Belém - onde estão o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o Museu Goeldi e as principais universidades. Neste sentido, diz o documento, a maior biodiversidade do planeta é também a mais desconhecida.
Para a professora Bertha Becker, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é preciso definir algum tipo de projeto para região. “Não adianta fazer só área protegida ou pensar em modos de punição, isso não é projeto. Tem que se usar o potencial natural da região sem destruir a floresta. Isso é feito com ciência e tecnologia. Mas não só isso”, diz a professora.
Uma das alternativas apontadas por Bertha é a de identificar produtos prioritários, organizando suas cadeias produtivas, numa estratégia que dinamiza a área em busca de mercados globais. “Aí a pesquisa poderia se canalizar, chegando até a indústria. Isso nunca foi feito”, lembra.
O documento do TCU diz ainda que a estrutura dos institutos de pesquisa da região amazônica é insuficiente para promover pesquisas que contribuam efetivamente para o conhecimento da biodiversidade local. Para os auditores do tribunal, essa incapacidade impede a promoção do desenvolvimento regional e a criação de tecnologia para o manejo e o uso sustentável dos recursos da biodiversidade. Como solução para isso, eles afirmam ser fundamental dispor de profissionais que conheçam a realidade sobre o local em que vão atuar, bem como criar o compromisso com o desenvolvimento sustentável local.
O número de pesquisadores com doutorado atuando nos estados analisados representa apenas 4% do total nacional. O relatório traz dados do censo 2006 do CNPq, que mostram que enquanto a USP tem 7.132 doutores, em toda a Amazônia Legal há, apenas, 3.299. Para Bertha, entretanto, a solução desse problema não pode ser encarada como algo meramente quantitativo, aumentando o número de titulados. “É importante que se aumente o número de pesquisadores, mas temos de sair daquela pesquisa ‘iluminada’, que é ótima e necessária. É preciso também contribuir com uma visão aplicável das questões amazônicas”. A professora lembra que no passado era função apenas dos sindicatos e movimentos sociais a luta para regular o mercado e que agora “a ciência e tecnologia têm papel fundamental, é agente crucial nesse jogo para fortalecer a autonomia do estado”.
(
Amazonia.org.br, 22/06/2008)