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soja política do agronegócio desmatamento da amazônia
2008-06-18

Os maiores compradores de soja do País, governo federal e organizações não-governamentais assinaram nesta terça um acordo que estende por mais um ano a moratória da soja. Ela começou em julho de 2006, sem o governo, quando as associações Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove) e Nacional dos Exportadores de Cereais (ANEC) se comprometeram a não comercializar a oleaginosa vinda de áreas desmatadas na Amazônia por um período de dois anos. A soja é o peso-pesado das exportações e exerce forte pressão para a abertura de novas áreas de produção, tanto na Amazônia quanto no Cerrado.

Segundo dados de um monitoramento feito entre dezembro e fevereiro deste ano, com imagens de satélite do Prodes/Inpe e vistorias em campo, 40 mil hectares de floresta tombaram nos quarenta municípios que mais plantam soja, no Mato Grosso, Pará e Rondônia. Isso para desmates com mais de cem hectares. Conforme o presidente da Abiove, Carlo Lovatelli, não foi verificado plantio de soja nessas áreas. Derrubadas menores foram avaliadas nos municípios mato-grossenses de Feliz Natal, União do Sul e Vera. Também não se viu soja. “Não tinha um só pé de soja nessas áreas, mas estavam desmatadas”, diz.

A área desflorestada nos centros produtores de soja, conforme Paulo Adário, coordenador da Campanha Amazônia do Greenpeace, chega a quase 50 mil hectares. Basta adicionar à conta desmates menores que uma centena de hectares. Ainda não se sabe quanto das derrubas são ilegais ou autorizadas pelos governos. “Há muito desmatamento em áreas menores, para pecuária e grãos”, revela.

Para o ambientalista, o maior desafio é evitar plantios nas áreas abertas com a disparada dos preços das commodities no mercado internacional. Vários desmates aconteceram ao lado de lavouras de soja, projetando novos cultivos. “É pouco provável que plantem rosas ou tulipas nesses locais. O desmatamento na Amazônia vinha caindo por três anos. Agora, voltou a crescer, junto com os preços da oleaginosa”, lembrou Adário.

Em 2006, quando começou a moratória, a saca de soja era vendida por US$ 10; hoje vale US$ 23, em média. Esta semana a soja bateu recorde de cotação na BM&F, registrando quase 150% de alta nos últimos 24 meses, como divulgou o jornal Valor Econômico. O preço da arroba do boi subiu mais de 85% no mesmo período. Preços favoráveis estimulam desmatamentos. Complicando a situação da floresta tropical, a safra de grãos estadunidense deve sofrer quebra por excesso de chuvas, elevando a procura pelo produto verde-amarelo.

“Foi fundamental renovar a moratória nesse momento de alta dos preços das commodities e debates sobre crise dos alimentos. É uma mensagem clara para os produtores de que não será comprado produto de áreas desmatadas”, afirmou Afonso Champi, gerente de assuntos corporativos da Cargill.

Sinuca de bico maior é justamente evitar a compra de soja produzida em locais que perderam o verde desde o início da moratória. Conforme a Abiove, isso não será problema. “Ficaremos atentos para que nenhum de nossos associados adquira produtos dessas áreas. Soja plantada em área irregular será isolada”, disse Lovatelli, presidente da entidade. Abiove  e ANEC representam as maiores compradoras de soja do País, como Bunge, Amaggi, Cargill.

Apesar das aparências, não foram só flores para a assinatura do acordo que estendeu a moratória da soja por mais um ano na Amazônia. A medida, na verdade, quase não sai. Tudo porque as compradoras de soja enviaram o texto ao Ministério do Meio Ambiente “em cima do laço” e sem consultar entidades civis. Além disso, as ongs queriam citar "fazendas desmatadas" e não "áreas desmatadas" como alvos da moratória. Isso ampliaria sua margem de atuação. Abiove e ANEC bateram pé e os ambientalistas não levaram.

Rastreabilidade
Adário, do Greenpeace, lembra que não há um sistema de rastreabilidade e nem certificação para a produção de soja. “O esforço é colocar sistemas para isso em prática, mas o prazo de um ano é curto. Talvez não dê para resolver todos os problemas, como a falta de cadastramento e de licenciamento para propriedades rurais”, ressalta. Segundo ele, Mato Grosso tem por volta de 120 mil fazendas, mas menos de dez mil registradas pelo governo.

A inexistência de métodos para rastrear a procedência da soja na Amazônia é um dos motivos que levam Glauber Silveira, presidente da Associação de Produtores de Soja de Mato Grosso (Aprosoja) a não acreditar na efetividade da moratória. Para ele, em nenhum momento esta medida limitou a produção de soja na Amazônia, que, no caso de Mato Grosso, equivale a 1% da área de lavoura de grãos no estado. “Isso é um oba-oba de trading. Mesmo que o produtor tenha desmatado dentro do bioma, não tem como identificar. Tem produtor que nem sabe que existe isso”, revela Silveira.

A Aprosoja garante que ultimamente tem sido inviável abrir novas áreas para plantar soja. De acordo com o presidente, na última safra a área plantada foi de 5,7 milhões de hectares, contra 6,2 milhões da safra anterior. “Não é a moratória que impede a abertura de novas áreas, mas o custo desse trabalho. Mas no dia em que valer a pena, o produtor vai abrir mesmo. Se a lei brasileira permite que ele use 20% de sua área na Amazônia, é um direito dele desmatar”, afirma Silveira.

Carne e madeira
Completando três semanas à frente do Ministério do Meio Ambiente, o ministro Carlos Minc informou que começou nesta terça a notificação de frigoríficos e de madeireiras para que informem ao governo sobre seus fornecedores de carnes e toras. Eles têm 60 dias para repassar os dados. Em julho, esses setores adotarão moratória semelhante a da soja, evitando insumos de novos locais desmatados. “Quem não se certificar será embargado, pois não pode haver concorrência desleal entre produtores legais e ilegais”, disse Minc.

Pelas características desses setores, como menos tecnologia e maior dispersão, o coordenador da Campanha Amazônia do Greenpeace avalia que concretizar uma moratória para carnes e madeiras será bem mais complicado. “A produção é mais difusa e menos ligada ao mercado internacional. O processo será mais complicado, mesmo começando pelos grandes frigoríficos”, disse.

O ministro também prometeu que a Amazônia finalmente terá um zoneamento-ecológico econômico (ZEE) em 2009. Isso distribuiria as terras entre voltadas à produção e para conservação, com potencial para reduzir os eternos conflitos de terra regionais. Acre e Rondônia têm ZEEs estaduais, enquanto Maranhão, Pará e Mato Grosso devem fechar a lição de casa este ano. "Sem regularização funciária não há política pública na Amazônia", disse.

(Por Aldem Bourscheit*, OEco, 17/06/2008)
*Colaborou Andreia Fanzeres

 


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