Depois de um ano em tramitação, está na pauta de votação do Senado Federal projeto de Decreto Legislativo (nº 90/07), de autoria da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), suspendendo a legislação que obriga as empresas de alimentos que atuam no Brasil a informarem no rótulo de seus produtos se estes foram fabricados com mais de 1% de ingredientes oriundos de transgênicos, os organismos geneticamente modificados (OGM).
Em meio à discussão no Congresso sobre a necessidade da rotulagem, um dado tem sido consenso: a população desconhece tal legislação e, portanto, não tem podido opinar se a identificação dos transgênicos é ou não um direito dos consumidores.
O Decreto 4.680/03 e a Portaria 2.658/03 do Ministério da Justiça, que regem o assunto estão em vigor desde 2004, entretanto, somente no final do ano passado as prateleiras dos supermercados brasileiros começaram a apresentar produtos rotulados com o símbolo dos transgênicos – um triângulo amarelo, com bordas pretas e uma letra T, também na cor preta, ao centro.
Para os grupos ambientalistas e agricultores contrários aos OGM, trata-se de descumprimento à lei. Já o Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), que reúne pesquisadores e fabricantes de alimentos, garante que a falta de rótulos com o símbolo no mercado se deve ao fato de que no Brasil nenhum alimento foi produzido ultrapassando o limite de 1% de transgênicos previsto na legislação.
Entre as poucas empresas que disponibilizaram produtos com tal rotulagem, está a Bunge Alimentos, que fabrica os óleos de soja Soya e Primor. A assessoria da empresa afirma que os índices de OGM em seus óleos vegetais não chegam a 1%, mas que a Bunge, mesmo assim, resolveu rotular seus produtos por iniciativa própria por respeitar os consumidores que considerem relevante saber sobre a possibilidade de presença de elementos transgênicos.
A explicação não é aceita pelo grupo ambientalista Greenpeace, que em seu site na internet (www.greenpeace.org.br) alega que o teor de OGM dos óleos da Bunge está acima do limite e que a empresa apenas recuou diante de uma ação civil do Ministério Público.
Pesquisa - Cumprida ou não, a legislação é praticamente desconhecida pelos consumidores. Em São Paulo, uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Educação para o Consumo de Alimentos e Congêneres (IBCA) revelou que 80,8% dos paulistanos entrevistados ignoram o significado do T dentro de um triângulo. Na Bahia não existe uma pesquisa semelhante, mas uma rápida abordagem a clientes em supermercados de Salvador indicou que a realidade baiana não deve ser muito diferente.
“Como não há divulgação, não sabemos o que são essas coisas, se fazem mal e muito menos que existem produtos industrializados que contém esse tipo de elemento em sua composição”, diz a empresária Patrícia Santana, que, ao ser informada pela reportagem de A TARDE sobre o significado do símbolo estampado no rótulo do óleo que havia acabado de pegar na prateleira, imediatamente trocou o produto por um de marca diferente.
Para a servidora da Justiça, Cida Nogueira, que também desconhecia o símbolo, o grande problema é a incerteza sobre o cumprimento ou não da lei por parte das indústrias. “Nem sei exatamente o que são organismos geneticamente modificados, mas na dúvida prefiro não comprar produtos de marcas suspeitas”, afirmou, propondo que a identificação dos OGM seja mais ostensiva, “como acontece com os produtos light e diet”.
Postura semelhante também é assumida pelo estudante Márcio Santos. “Já ouvi muito falar de transgênicos, mas não conheço muito do assunto. Acho apenas que os produtos de soja devem ser evitados hoje em dia, porque seriam os mais perigosos”, disse, salientando que também não conhecia a lei sobre rotulagem.
Orientação – O problema é que na composição de alguns alimentos não associados à soja, como massas, margarinas, biscoitos e salgadinhos, pode existir ingredientes transgênicos, entre eles, milho, batata e a própria soja. Para orientar os consumidores, o Greenpeace elaborou um guia, disponível na internet, em que são listados produtos comprovadamente livres de OGM e outros com indícios de transgênicos, segundo a organização.
“Na verdade, trata-se de um alarde sem propósito”, afirmou a doutora em genética e melhoramento de plantas, Alda Lerayer, diretora-executiva do CIB. “No óleo de soja e na margarina, por exemplo, após todo o processo de refinamento, a proteína e o DNA dos transgênicos se degradam, e os índices de OGM na composição final beiram a 0%. Já no caso dos biscoitos, o calor do cozimento destrói tudo”, disse.
(
A Tarde, 15/06/2008)